Pesquisadores alertam: Zika no Brasil vive ‘paz não verdadeira’

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Zika no Brasil apresenta um cenário de “paz não verdadeira”, conforme alertam pesquisadores envolvidos na descoberta inicial do vírus no país. Apesar dos números de casos estarem longe dos picos anteriores, a ameaça persiste, principalmente para gestantes, em meio à ausência de uma vacina eficaz e a um evidente despreparo para futuros surtos. Os primeiros registros da doença no território brasileiro foram confirmados em abril de 2015, e passados dez anos, o governo federal iniciou o pagamento de indenizações e pensões vitalícias às famílias cujos filhos foram afetados pela síndrome congênita associada à infecção pelo zika.

O vírus, transmitido pelo mosquito Aedes aegypti, continua a circular e a representar um risco significativo para a saúde pública. Profissionais de saúde enfatizam a importância de uma atenção contínua, uma vez que a subnotificação de casos contribui para a falsa impressão de que a doença perdeu sua relevância epidemiológica.

Pesquisadores alertam: Zika no Brasil vive ‘paz não verdadeira’

Essa “falsa calmaria” é um ponto de grande preocupação. O infectologista Antonio Bandeira, um dos pioneiros na identificação do vírus no país em um trabalho conjunto com os pesquisadores Gubio Soares Santos e Silvia Inês Sardi, destaca que, embora o vírus não esteja em fase epidêmica, os casos subnotificados indicam uma prevalência maior do que a oficialmente reconhecida. “Eu diria que a gente está numa situação de uma paz que não é muito verdadeira”, afirmou Bandeira, durante uma pausa do 24º Congresso Brasileiro de Infectologia.

Até meados de setembro deste ano, o Brasil contabilizou 3.874 casos prováveis de zika, um número inferior aos 5.115 notificados em 2022, de acordo com o painel de arboviroses. No entanto, esses dados não refletem a totalidade da situação. A doença frequentemente se manifesta com sintomas leves, levando muitos infectados a tratar-se em casa ou, ao buscar atendimento, ter o quadro minimizado por profissionais de saúde, que nem sempre realizam os testes diagnósticos. Esse comportamento resulta em casos não diagnosticados, que, por sua vez, não entram para as estatísticas oficiais do país, obscurecendo a real dimensão do problema.

“Este número de casos, apesar de baixo, com certeza é maior. Ele não é epidêmico, mas é maior. Só que isso não é muito detectado e como não está chamando a atenção, é deixado de lado”, pontuou o infectologista. A análise é corroborada pelo professor Kleber Luz, da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), que durante uma sessão sobre arboviroses, observou que a zika “perdeu importância epidemiológica” na percepção geral, sendo uma situação que “está por baixo do pano”, ainda que presente e perigosa.

Risco latente para gestantes e microcefalia

Apesar da aparente diminuição da atenção, o zika continua a representar um perigo iminente e muito grave, especialmente para gestantes. A infecção pelo vírus durante a gravidez está associada a consequências devastadoras, sendo a microcefalia a mais conhecida. Em um terço das gestantes infectadas, os bebês podem nascer com esta má formação cerebral, que não só acarreta severos comprometimentos neurológicos, mas também eleva a mortalidade em 11,3 vezes.

Bandeira reforça que toda mulher em período gestacional no Brasil deveria estar ciente dos riscos e adotar medidas preventivas rigorosas. “Uma mulher que se torne gestante no Brasil nesse momento tinha que ter muito claro que, do primeiro ao último dia da gestação, ela tem que usar repelente e roupas mais compridas para evitar picada de inseto”, alertou. A inexistência de um tratamento preventivo ou medicamentoso, aliada à falha em eliminar o vetor (o mosquito Aedes aegypti) e o próprio vírus, agrava a vulnerabilidade dessas mulheres e seus futuros bebês.

Para informações adicionais sobre os riscos do vírus Zika e recomendações de saúde pública global, consulte as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS), que continuamente monitora a doença e suas implicações. Você pode encontrar detalhes oficiais sobre as ações e relatórios da OMS sobre Zika, que reforçam a necessidade de vigilância e prevenção.

O Desafio persistente da Vacina contra o Zika

O desenvolvimento de uma vacina contra o zika é um dos maiores desafios da pesquisa em saúde pública no momento. Apesar de estudos iniciais demonstrarem alguma resposta positiva em fases precoces de testes (Fase 1), com um número restrito de voluntários, o avanço é lento. A complexidade aumenta consideravelmente porque o público-alvo principal, e mais vulnerável, são as gestantes devido ao grave risco de microcefalia nos fetos.

Realizar testes em mulheres grávidas é extremamente complexo e de alto risco, exigindo protocolos de segurança rigorosos e considerações éticas delicadas. “É o grupo mais complicado de fazer pesquisa, de alto risco”, ressalta Bandeira. Além disso, para avaliar a eficácia de uma vacina, é fundamental a divisão dos voluntários em grupos (com imunizante e placebo), mas o risco inerente da microcefalia exige que se garantam meios de prevenção (como o uso de repelentes) às gestantes que não recebam a vacina experimental.

Outro complicador reside justamente no baixo número de casos. Em uma epidemia, a avaliação da funcionalidade da vacina se torna mais tangível. Com pouquíssimos casos, torna-se financeiramente inviável conduzir um estudo que exija a identificação e o acompanhamento de um número significativo de infectados para medir a efetividade do imunizante. O professor Kleber Luz é enfático: “Realmente, não tem perspectiva de a gente vir a ter uma vacina para zika, o que é muito ruim, por que caso surja um novo surto, nós estaremos mais uma vez desarmados”. Segundo Luz, as pesquisas para uma vacina contra o zika foram, em grande parte, “definitivamente abandonadas”. Apesar disso, ele destaca a importância contínua de atenção aos sintomas, notificação e acompanhamento.

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Imagem: noticias.uol.com.br

Investimento Nacional em Ciência e Tecnologia

Diante do cenário desfavorável no desenvolvimento internacional de vacinas para o zika — já que o vírus não é uma preocupação nos países de origem das grandes farmacêuticas — o infectologista Antonio Bandeira advoga por um fortalecimento da pesquisa e tecnologia nacionais. Segundo ele, empresas estrangeiras com capacidade para investir na tecnologia não o fazem por motivos de interesse global desalinhado com a realidade brasileira. “A gente precisa deixar de ser colônia, especialmente na área de pesquisa e tecnologia”, disse Bandeira. “A gente tem que começar a ter pesquisa voltada para as doenças da gente.”

Além dos recursos financeiros, o processo demanda a formação e retenção de profissionais altamente qualificados. Para o médico, é um momento propício para o Brasil formular uma política robusta de atração e investimento em cientistas, fortalecendo sua capacidade de resposta a desafios sanitários endêmicos.

A Descoberta do Zika no Brasil e seus primeiros impactos

A chegada do vírus zika ao Brasil em 2014, período em que o país também enfrentava a recém-identificada chikungunya, gerou um novo desafio para a saúde pública. Em 2014, a chikungunya foi confirmada no Amapá e na Bahia. Antonio Bandeira e seus residentes já lidavam com a doença em Salvador quando, no final daquele ano, uma síndrome com características semelhantes à dengue e chikungunya, mas sem confirmação para essas enfermidades, começou a despertar sua atenção. Em janeiro de 2015, um surto desse novo quadro foi identificado em Camaçari, Bahia, onde Bandeira atuava como consultor. A partir desse momento, as investigações para identificar o agente etiológico se intensificaram.

A população de Camaçari inicialmente suspeitava de contaminação da água, mas Bandeira estava convencido de que se tratava de uma nova doença. Com autorização para analisar amostras biológicas de pacientes infectados em um hospital local, ele e a equipe iniciaram a parceria científica crucial. Os pesquisadores Gubio Soares Santos e Silvia Inês Sardi, da UFBA, foram fundamentais na etapa laboratorial, testando diversas possibilidades de vírus.

A confirmação do zika veio em 28 de abril de 2015. Bandeira, que estava em um aeroporto na Dinamarca após um congresso, recebeu a notícia de Santos de que as amostras haviam testado positivo para o vírus. Animado, ele compartilhou a descoberta com colegas brasileiros, que inicialmente reagiram com ceticismo, tamanha era a surpresa. O vírus, originário da África, já havia se espalhado pela Ásia e Oceania antes de sua chegada ao continente americano, com o Brasil sendo o primeiro país a identificá-lo oficialmente em suas Américas.

Embora a maioria das infecções por zika seja assintomática ou cause sintomas leves, logo após sua descoberta, o quadro clínico começou a ser associado a complicações neurológicas. Casos da síndrome de Guillain-Barré, por exemplo, aumentaram drasticamente onde Bandeira trabalhava, passando de um para cinquenta por mês, e a correlação com a microcefalia em recém-nascidos logo se tornou evidente, alarmando as autoridades de saúde globais.

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Em suma, a situação do vírus Zika no Brasil, embora com menos destaque, continua a exigir vigilância e pesquisa intensificadas. A memória do impacto da microcefalia para famílias é um lembrete sombrio dos perigos que persistem. É crucial que o país invista em suas próprias capacidades científicas e adote políticas de saúde pública que priorizem a prevenção e o diagnóstico precoce. Continue acompanhando as atualizações sobre saúde e políticas sociais em nosso portal HoradeComeçar para se manter informado sobre as últimas novidades em saúde pública e políticas que afetam as cidades brasileiras.

Crédito da imagem: Nacho Doce/Reuters – 17.out.16, Marcelo Olly

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