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Vício em Apostas: Brasileiros Detalham Estratégias de Combate
O vício em apostas online tem se manifestado como um grave problema social no Brasil, atingindo milhões de cidadãos e impactando profundamente suas vidas financeiras e emocionais. Para muitos, a libertação desse ciclo compulsivo exige a adoção de estratégias variadas, que frequentemente englobam o suporte familiar, tratamento médico e rigoroso controle das finanças.
Um exemplo notável dessa luta é a história de Antônio*, um jovem de 22 anos, que estima ter acumulado um prejuízo de cerca de R$ 53 mil em plataformas digitais de apostas. Seu caso ilustra as diversas etapas e táticas que têm sido implementadas na busca pela recuperação do jogo compulsivo.
Vício em Apostas: Brasileiros Detalham Estratégias de Combate
Apesar de ciente das perdas, a dificuldade de parar era evidente. A decisão de buscar ajuda profissional e familiar foi um ponto de virada para Antônio, que transferiu a administração de suas finanças para o pai. Contudo, o problema persistiu através do uso de cartões de crédito. A solução drástica veio com o bloqueio de todos os cartões e contas bancárias que possibilitavam empréstimos. Assim, a dependência familiar tornou-se um mecanismo de controle para suas despesas diárias.
Além do controle financeiro, Antônio adotou uma abordagem holística. Passou a consumir relatos de pessoas com experiências similares em plataformas como o YouTube, buscando identificação e motivação. Adicionalmente, buscou assistência com psicólogos e psiquiatras, que prescreveram medicações para gerenciar impulsividade e estabilizar o humor. O jovem reconhece que sua condição de classe média alta foi determinante para o acesso a esse tipo de tratamento, um contraste marcante com a realidade econômica de muitos outros brasileiros. A participação em terapias semanais e a escuta de histórias semelhantes foram cruciais para reforçar seu compromisso de abandonar o vício.
Avanço das Apostas Online e Seus Riscos para a Saúde Pública
Desde que as plataformas de apostas online, conhecidas como “bets”, foram regulamentadas no Brasil em 2018, sob o governo de Michel Temer (MDB), o país tem observado um aumento alarmante no número de usuários e, consequentemente, nos casos de dependência. Uma pesquisa realizada em 2023 pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em parceria com o Ministério da Justiça e Segurança Pública, revelou que cerca de 28 milhões de brasileiros com 14 anos ou mais, representando 17,6% da população nessa faixa etária, participaram de alguma aposta no ano anterior.
Desse total de apostadores, impressionantes 10,9 milhões de indivíduos — correspondendo a 38,6% dos jogadores e 7,3% da população geral — apresentaram traços de jogo de risco ou problemático. Especialistas na área explicam que, há mais de 30 anos, a ciência compreendeu que o cérebro humano pode desenvolver dependência não somente de substâncias químicas, mas também de comportamentos que hiperestimulam os centros de prazer. Esse guarda-chuva de dependências comportamentais abrange jogos de azar, compras compulsivas e outros impulsos excessivos.
Rodrigo Machado, psiquiatra do Programa de Transtornos do Impulso do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), destaca a transformação no perfil dos jogos de azar como fator-chave para a explosão de casos de dependência a partir de 2018. A democratização do acesso a “cassinos no bolso” 24 horas por dia, por meio da tecnologia móvel, eliminou a barreira física de locomoção, antes necessária para acessar tais jogos.
Adicionalmente, a própria mecânica do jogo se sofisticou nas plataformas digitais. Novos mecanismos foram incorporados para tornar as apostas mais sedutoras e, intrinsecamente, mais viciantes. Anteriormente, as apostas em eventos esportivos limitavam-se ao resultado final; hoje, as “apostas in-play” permitem que os jogadores apostem em tempo real em dezenas de eventos que ocorrem durante uma partida, como qual time fará o próximo escanteio ou receberá um cartão. Essa rapidez e variedade criam um ciclo ultrarrápido entre a ação de apostar e a gratificação (ou não), encurtando o prazer e alimentando a compulsividade.
Os desenvolvedores das plataformas também empregam mecanismos que alteram a percepção de ganhos e perdas. Oferecer “prêmios de consolação” que dão a impressão de “quase ter ganhado” mesmo em situações de perda é uma tática para incentivar o jogador a continuar apostando, gerando uma falsa sensação de que não houve prejuízo real. Essa engenharia tecnológica invasiva, combinada com os atrativos psicológicos, faz com que o vício em apostas online atinja e prejudique um número significativamente maior de pessoas em um ritmo acelerado.
As Perdas Humanas e o Desespero pela Saída do Vício
Rafael Santos, um youtuber de 42 anos residente em Joinville, Santa Catarina, personifica a descrição do médico especialista. Ele percebeu a dimensão do problema quando sua vida financeira desmoronou, mas, segundo seu relato, já estava “completamente perdido no vício”. Suas perdas ultrapassam os R$ 150 mil, resultantes de empréstimos, dívidas de cartão de crédito e apostas, sendo R$ 80 mil de dívidas diretas. A profundidade de sua situação financeira levou-o a pensamentos sombrios, envolto por um “sentimento ruim” de ausência de solução.
Diante da falta de uma rede de apoio familiar e de amigos próximos, Rafael decidiu compartilhar seu dilema em vídeos no YouTube, com a esperança de que sua experiência pudesse auxiliar outras pessoas. Sua primeira ação concreta foi tentar bloquear suas contas em todas as casas de apostas. No entanto, uma plataforma não regulamentada no Brasil não oferecia a opção de autoexclusão ou chat de suporte. A solução drástica encontrada foi renunciar ao seu chip de celular, que possuía há 20 anos, para cortar completamente o acesso a esse site.
O impacto do **vício em apostas** no Brasil é demonstrado por dados globais. O país lidera mundialmente em novas assinaturas para o Gamban, um software que bloqueia sites de apostas, superando nações como Reino Unido e Estados Unidos. Em 2024, o Brasil se tornou o segundo maior país em visitas ao site do Gamban. Matt Zarb-Cousin, cofundador do Gamban e ele próprio um ex-viciado em apostas, destaca que cerca de 6 mil pessoas por mês baixam o aplicativo no Brasil, um movimento orgânico que reflete o desespero daqueles que buscam auxílio.
Contudo, Zarb-Cousin alerta que o custo do serviço é um obstáculo para muitos brasileiros afetados, que geralmente enfrentam graves problemas financeiros. Ele defende a disponibilização de acesso gratuito ao Gamban no Brasil, similar a arranjos em outros países onde serviços locais de apoio a viciados financiam o software para seus usuários.

Imagem: www1.folha.uol.com.br
O cenário é corroborado por dados de crescimento empresarial. A BigDataCorp registrou um salto no número de empresas de jogos de azar online no Brasil, de aproximadamente 840 em 2022 para mais de 2,1 mil ao final de 2024, um aumento de 153%. A projeção é de mais 1,2 mil novos registros em 2025.
Uma análise regional da BigDataCorp aponta uma concentração desproporcional dessas empresas nas regiões Norte e Nordeste. O Amazonas, por exemplo, embora represente apenas 0,95% do total de empresas no país, abriga 3,5% das companhias de apostas online. Outros estados com números relevantes incluem Ceará (5,5% do setor contra 2,7% no geral), Maranhão (3,4% contra 1,3%) e Rio Grande do Norte (3,2% contra 1,1%). Somadas, Norte e Nordeste concentram 37,3% das empresas de apostas online registradas no Brasil, enquanto representam apenas 19,5% do total de CNPJs nacionais.
Segundo Thoran Rodrigues, CEO da BigDataCorp, essa distribuição reflete a prevalência da população de mais baixa renda nessas regiões, que tende a engajar-se mais nesse tipo de mercado. A presença de “polos tecnológicos interessantes no Nordeste” também contribuiu para esse alinhamento entre oferta e demanda socioeconômica.
Medidas Essenciais para Superar o Vício em Apostas e a Necessidade de Políticas Públicas
Diante do quadro de uma verdadeira epidemia do **vício em apostas** que assola as camadas mais vulneráveis da população, o psiquiatra Rodrigo Machado detalha uma série de ações cruciais para indivíduos que reconhecem o problema em si ou em familiares:
- Procure ajuda especializada de psicólogos ou psiquiatras para um diagnóstico adequado do transtorno do jogo.
- Busque suporte em grupos como os Jogadores Anônimos.
- Faça uso de aplicativos e softwares que bloqueiam o acesso a sites de apostas em computadores e celulares.
- Solicite a autoexclusão através dos canais disponíveis nas próprias plataformas de apostas.
- Garanta o suporte e a supervisão financeira de um familiar de confiança. Isso pode envolver o compartilhamento de contas bancárias, o recebimento direto do salário por esse familiar, o monitoramento de dívidas e empréstimos via plataforma do Banco Central, e assistência na renegociação de dívidas.
Machado destaca o “bastante benéfico” suporte financeiro familiar, especialmente nas fases iniciais de enfrentamento do vício. Ele ressalta, no entanto, que não há uma “receita de bolo” universal; cada caso é único e requer uma análise personalizada de gatilhos e a formulação de soluções específicas, o que reforça a importância do trabalho de equipes multiprofissionais. Além das ações individuais, o especialista sublinha a necessidade imperativa de políticas públicas para enfrentar o problema em larga escala:
- Proibição rigorosa do marketing de influência, impedindo que celebridades e atletas promovam sites de apostas.
- Criação e execução de campanhas educacionais abrangentes para conscientizar a população.
- Banimento de mecanismos de apostas comprovadamente nocivos, como as “apostas in-play” e apostas múltiplas.
- Implementação de serviços públicos de apoio a jogadores disponíveis 24 horas, moldados nos moldes dos serviços de prevenção ao suicídio.
- Criação de um serviço centralizado público para bloqueio e autoexclusão de plataformas de apostas, que seria preferível a parcerias com empresas privadas.
O psiquiatra conclui que, com boa vontade e dedicação dos legisladores e governantes, “existem medidas plausíveis” para salvaguardar a saúde mental e financeira da população, citando como modelo o sucesso das regulamentações brasileiras contra o tabagismo.
Para aqueles que necessitam de apoio imediato ou que perderam alguém para o suicídio, diversos recursos estão disponíveis: o Centro de Valorização da Vida (CVV), pelo telefone 188 ou chat 24h; o chat Pode Falar do Unicef (para jovens de 13 a 24 anos); e os serviços de emergência (Bombeiros 193, Polícia Militar 190, SAMU 192). A rede pública de saúde, incluindo Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Unidades de Pronto Atendimento (UPA) 24h, também oferece assistência. O Mapa da Saúde Mental e a Associação Brasileira dos Sobreviventes Enlutados por Suicídio (Abrases) são outras fontes importantes de ajuda.
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A batalha contra o vício em apostas demanda um esforço conjunto e contínuo, tanto no âmbito individual quanto nas políticas públicas. É vital que a sociedade reconheça a seriedade da questão e trabalhe em prol de soluções eficazes para tratamento e prevenção. Mantenha-se informado e aprofunde seus conhecimentos sobre as dinâmicas sociais e econômicas do país explorando as outras matérias de nossa editoria de Economia.
*Nome fictício para preservar a identidade do entrevistado.
Crédito da imagem: Getty Images / AFP
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