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Trump e a Estratégia de Desvalorizar o Dólar Americano

O ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem empreendido uma série de iniciativas que apontam para um propósito subjacente: o enfraquecimento do dólar americano. Analistas econômicos consultados indicam que o republicano busca intencionalmente criar um cenário de “caos” no mercado, utilizando artifícios como o incremento de tarifas alfandegárias e duras críticas ao Federal Reserve (Fed), […]

O ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem empreendido uma série de iniciativas que apontam para um propósito subjacente: o enfraquecimento do dólar americano. Analistas econômicos consultados indicam que o republicano busca intencionalmente criar um cenário de “caos” no mercado, utilizando artifícios como o incremento de tarifas alfandegárias e duras críticas ao Federal Reserve (Fed), o banco central do país. No entanto, o sucesso desta estratégia é incerto, visto que a economia norte-americana enfrenta desafios estruturais significativos e o dólar mantém sua posição de hegemonia global há décadas. Historicamente, presidentes anteriores dos EUA também exploraram táticas para controlar o valor da moeda, sem sempre atingir os objetivos desejados.

Donald Trump já manifestou, em diversas ocasiões, sua preocupação com a valorização da moeda nacional. Em uma declaração em julho, antes de uma viagem à Escócia, o ex-mandatário expressou a predileção por um dólar forte, mas ponderou que um “dinheiro mais fraco” poderia gerar maior lucratividade. Ele argumentou que, embora um dólar forte “soa bem”, ele compromete setores como o turismo e dificulta as exportações de produtos americanos, como tratores e caminhões. A seu ver, a principal vantagem de um dólar robusto residiria apenas no controle da inflação. Essa percepção reforça a ideia de que a valorização da moeda representa um entrave à meta do republicano de reduzir o déficit na balança comercial dos EUA, impactando diretamente o preço dos produtos americanos para o mercado internacional e, consequentemente, as vendas externas.

Trump e a Estratégia de Desvalorizar o Dólar Americano

O déficit comercial é uma realidade para os EUA quando o volume de produtos importados supera o das exportações. André Perfeito, economista, observa que mesmo com a eventual transferência de parte da produção de empresas globais para o território americano – conforme o desejo de Trump –, tal medida seria insuficiente para sanar o desequilíbrio das contas externas do país, que vêm acumulando déficits sucessivos. Ele exemplifica que tarifar o mundo em 15% enquanto a moeda está 15% mais valorizada resultaria em um efeito nulo, justificando o debate sobre a necessidade de desvalorizar o dólar e alinhando as ações de Trump a essa diretriz. André Roncaglia, diretor-executivo do Brasil no Fundo Monetário Internacional (FMI) e professor licenciado da Universidade de Brasília (UnB), adiciona que o objetivo de Trump é desvalorizar o dólar sem que este perca seu status primordial como moeda de reserva global. A estratégia visaria assegurar uma demanda estrutural pela moeda, mantendo-a como ativo de reserva e meio de transações internacionais.

Consequências da Política Tarifária e Econômica: O Efeito Trump

A imposição de tarifas em grande escala por Donald Trump acentuou a percepção de instabilidade econômica global, com reflexos no comércio mundial. Um dos efeitos colaterais notáveis foi o enfraquecimento do dólar, mesmo este sendo amplamente considerado um porto seguro para investidores. Este movimento foi evidenciado em abril, logo após a escalada de tarifas imposta por Trump, quando a moeda americana registrou perdas frente a outras moedas fortes. A preocupação central do mercado girava em torno de um possível aumento da inflação e desaceleração da economia dos EUA. O índice DXY, que compara o desempenho do dólar frente a uma cesta de seis importantes moedas, incluindo o euro e o iene, já acumula uma queda superior a 10% no ano de 2025, impulsionada pelas políticas comercial e econômica do governo republicano. As incertezas no cenário econômico também contribuíram para a valorização do ouro ao longo da gestão Trump, com o metal precioso – visto como um ativo seguro em períodos de instabilidade – registrando uma alta de quase 40% em 2025. Paralelamente, o real brasileiro, embora sendo uma moeda de mercado emergente, tem se beneficiado do enfraquecimento do dólar, com uma valorização próxima a 14% em 2025. No pregão da sexta-feira, o dólar encerrou cotado a R$ 5,32, reflexo do diferencial de juros entre Brasil e EUA. Conforme André Perfeito, a valorização do real se dá, na verdade, pela fraqueza do dólar, e não por uma melhora inerente da economia brasileira. A hegemonia do dólar se explica pela sua demanda global como moeda de reserva, ilustrada por Perfeito com a analogia de uma rede social, onde seu uso generalizado confere aos EUA um “privilégio exorbitante”, permitindo consumo elevado e importação de bens sem a desvalorização natural da moeda que ocorreria em outros países com déficits comerciais.

Precedentes Históricos: A Luta pela Desvalorização do Dólar

A busca pela redução do valor do dólar para equilibrar as contas externas não é uma exclusividade da gestão Trump, como apontam especialistas. Historicamente, governos americanos implementaram medidas similares em pelo menos três momentos cruciais. Em 1971, o então presidente Richard Nixon decretou o fim da “janela dourada”, eliminando a conversibilidade do dólar em ouro para outras nações. Essa ação unilateral desvalorizou substancialmente a moeda americana, mas gerou um aumento inflacionário nos EUA, culminando em uma subsequente elevação das taxas de juros. Em 1985, o Acordo de Plaza marcou uma intervenção cambial coordenada entre o governo de Ronald Reagan, a Alemanha Ocidental, Japão, Reino Unido, Canadá e França, visando enfraquecer o dólar e diminuir o déficit comercial dos EUA. Contudo, a combinação de elevados gastos e o déficit fiscal, conhecidos como déficit gêmeo, limitou os resultados. Já em 2009, no aftermath da crise do subprime, o governo de Barack Obama tentou incentivar a valorização do yuan chinês, ao mesmo tempo em que mantinha juros baixos e expandia a base monetária. Mesmo diante dessas ações, o dólar manteve-se forte, amparado pela demanda global por ativos seguros. Para contextualizar, o Sistema de Reserva Federal (Fed), criado pelo Congresso para supervisionar o sistema bancário, possui como um de seus principais objetivos maximizar o emprego e estabilizar os preços.

Roberto Dumas, professor de economia do Insper e autor, ressalta que a guerra comercial é a tática adotada por Trump para desvalorizar o dólar e impulsionar as exportações americanas. Contudo, ele projeta que o plano é improvável de alcançar os efeitos esperados no médio e longo prazo. Dumas enfatiza que os desafios das contas externas dos EUA vão além da desvalorização cambial ou das tarifas, estando intrinsecamente ligados à baixa poupança doméstica e ao alto nível de consumo do país. Ele cita os fracassos de gestões anteriores como prova de que essas medidas isoladas não solucionam o problema estrutural. Na análise de Dumas, as iniciativas de Trump refletem uma interpretação inadequada de conceitos macroeconômicos. A raiz das dificuldades econômicas dos EUA residiria no excesso de gastos e na insuficiente poupança doméstica; uma maior poupança, tanto no setor público quanto no privado, aliviaria as pressões externas.

Ataques ao Fed e o Manejo dos Juros

Os economistas consultados identificam as críticas e pressões de Trump sobre o Federal Reserve como mais uma via para desvalorizar o dólar. André Roncaglia esclarece que a intenção por trás dessa tática é reduzir o fluxo de capitais para os Estados Unidos. Segundo ele, uma diminuição das taxas de juros, acompanhada por uma maior circulação de crédito, tende a enfraquecer a entrada massiva de capitais nos EUA, já que outras regiões se tornam mais atrativas para investidores. Dessa forma, o dólar ainda seria procurado como moeda de reserva, mas a demanda não se concentraria de forma a gerar pressão valorizadora no câmbio, provocando apenas uma tendência leve de desvalorização, mantendo seu papel global.

A investida de Donald Trump contra o Fed ganhou destaque nas semanas precedentes. Após meses de ataques verbais ao presidente da instituição, Jerome Powell, que foi rotulado de “burro” e “teimoso” por Trump, o foco republicano se voltou para a indicação de indivíduos alinhados à sua pauta econômica. Na quarta-feira, dia 17, o Fed procedeu ao corte das taxas de juros do país em 0,25 ponto percentual (p.p.), estabelecendo a nova faixa entre 4% e 4,25% ao ano. Essa foi a primeira redução em nove meses. Curiosamente, o único voto contrário à medida partiu de Stephen Miran, um nome indicado por Trump ao Fed, que defendeu um corte mais agressivo, de 0,50 p.p., para o intervalo de 3,75% a 4% ao ano.

Stablecoins: Novo Elemento na Estratégia

A diminuição na taxa básica de juros dos EUA, desejada por Trump, exerce pressão sobre os rendimentos dos títulos do Tesouro americano. Rendimentos menores tornam esses papéis menos atraentes, potencialmente direcionando investidores a outros mercados, apesar de a demanda por esses ativos poder ser sustentada pelo seu caráter seguro. Para mitigar uma eventual queda na demanda pelos títulos do governo, a administração Trump introduziu a possibilidade de uso de stablecoins – moedas digitais lastreadas em ativos, tipicamente o dólar – como forma de sustentar o mercado. Em julho, Trump sancionou o Genius Act, a primeira legislação federal dos EUA a regulamentar as stablecoins. A norma estabelece um arcabouço regulatório que visa garantir a estabilidade e a credibilidade dessas moedas digitais, impondo regras rigorosas quanto às reservas e à transparência. Nesse contexto, a regulamentação busca conferir credibilidade às stablecoins, exigindo que sejam lastreadas por ativos seguros, como os títulos da dívida pública americana. Esse mecanismo pode gerar uma demanda estrutural por tais títulos.

“Imagine que estou emitindo uma stablecoin. Eu te aviso que vale US$ 100 e você me dá esse valor. Então, o que eu faço com os US$ 100? Compro o título do governo americano”, ilustra o economista André Perfeito. Dessa forma, as stablecoins atuam como intermediárias: o usuário adquire a moeda digital, e o emissor utiliza os fundos para adquirir títulos do governo, elevando o preço destes e, consequentemente, reduzindo a taxa de juros. André Roncaglia explica que “a redução dos juros pelo Fed estaria sendo acompanhada por esse processo, com o investidor estrangeiro aceitando uma taxa menor para financiar a dívida do governo americano, que é bastante pressionada”. No entanto, os economistas ponderam sobre o sucesso da estratégia. “É difícil saber, pois há muitos fatores envolvidos”, adiciona Roncaglia, concluindo que o êxito dependerá da “própria aceitação do mercado”.

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Em suma, a tentativa de Donald Trump de desvalorizar o dólar por meio de tarifas, pressões sobre o Fed e a adoção de stablecoins representa uma estratégia multifacetada para impulsionar a economia americana, apesar do ceticismo de economistas quanto ao seu sucesso a longo prazo. As políticas econômicas e seus impactos continuam a ser um foco central em nosso portal. Acompanhe nossas análises e últimas notícias sobre o cenário econômico global em nossa editoria de Economia.

Crédito da imagem: Foto: Reuters/Brian Snyder

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