A recente trégua comercial entre Estados Unidos e China representa uma série de conquistas diplomáticas para os líderes Donald Trump e Xi Jinping, que serão apresentadas em uma próxima cúpula. Embora esses progressos, considerados mais fáceis de serem alcançados, tenham gerado otimismo entre os investidores, eles deixam intocados os conflitos essenciais e mais profundos que tensionam as relações entre as duas maiores economias globais. Este cenário complexo sinaliza que, apesar das aparências de conciliação, as divergências estruturais continuam a exigir atenção.
Em uma declaração recente na segunda-feira (27), o então presidente americano Donald Trump manifestou um “sentimento realmente bom” sobre a possibilidade de um acordo com a China. Esta fala veio à tona após autoridades malaias terem divulgado, no fim de semana anterior, uma série de entendimentos projetados para mitigar as tensões comerciais entre as nações. Tais avanços, notadamente direcionados a pautas mais palpáveis, buscam desonerar o ambiente de confrontos econômicos que caracterizou os anos recentes das interações bilaterais.
Trégua Comercial EUA-China Avança, Mas Desafios Persistem
As negociações iniciais vislumbraram desdobramentos importantes. Espera-se que a China retome substanciais compras de soja em estados americanos com forte base republicana, um aceno estratégico do governo de Pequim. Em contrapartida, os Estados Unidos acenaram com a possibilidade de recuar em sua ameaça mais recente de implementar uma tarifa de 100%, em troca de garantias quanto ao fornecimento de ímãs de terras raras por parte do governo chinês. Essa medida destaca a dependência tecnológica e a complexidade das cadeias de suprimentos globais. Os mercados financeiros reagiram positivamente a essas notícias, com o índice MSCI para ações globais registrando um teste de máximas históricas, refletindo um alívio temporário, mas notável, na percepção de risco. No entanto, analistas alertaram que o pacto, que seria assinado por Trump e Xi em uma cúpula na Coreia do Sul, intencionalmente contornou e ignorou várias questões altamente delicadas e intrínsecas ao centro do embate bilateral.
Entre as pautas deixadas de lado estavam as disputas fundamentais sobre segurança nacional, que pareciam permanecer intactas, e a missão central declarada pelo ex-presidente Trump de reequilibrar a balança comercial entre os dois países. Essas omissões geram questionamentos sobre a durabilidade e o real impacto dos acordos alcançados. Ademais, o investimento chinês em território americano continua submetido a severas restrições, uma barreira que se mantém sólida em meio às discussões sobre cooperação e desescalada. Sun Chenghao, pesquisador da Universidade Tsinghua, em Pequim, salientou a complexidade inerente a essa abordagem, destacando que “a colheita dos frutos mais fáceis torna o caminho à frente inerentemente mais difícil, porque deixa os conflitos difíceis e de alto risco para o final.”
Essa perspectiva indica que, ao priorizar acordos de menor atrito, os negociadores postergam a resolução das áreas mais espinhosas, que exigem uma reforma estrutural e um comprometimento de longo prazo. A superação de um “grande acordo” demands um enfrentamento direto das divergências profundas que englobam subsídios estatais, a feroz concorrência tecnológica e, principalmente, as questões de segurança nacional – campos onde os modelos econômicos e geopolíticos fundamentais de ambos os lados entram em franco e irredutível conflito. Tal cenário sugere que, em vez de uma resolução abrangente e definitiva, uma série de acordos setoriais de menor escala, negociados por meio de um diálogo contínuo e sustentado, são o desfecho mais provável para os próximos anos. Esta abordagem incremental pode pavimentar o caminho para uma coexistência mais estável, mas também indica que as tensões latentes persistem.
Em meio às negociações comerciais recentes, Scott Bessent, o então Secretário do Tesouro dos EUA, exerceu pressão sobre a China para que esta reequilibrasse sua economia, priorizando o aumento do consumo interno. Contudo, o governo de Pequim pareceu desconsiderar esses apelos na semana anterior, ao divulgar um documento de políticas que enfatizavam enfaticamente a autossuficiência industrial e tecnológica como as principais forças motrizes da economia chinesa, projetando esta diretriz até pelo menos o ano de 2030. Essa postura de Pequim revela uma estratégia de desenvolvimento interno robusta, com menor receptividade às sugestões de Washington em relação a uma maior abertura e consumo.
Os contornos desse acordo com a China emergiram enquanto Donald Trump iniciava sua viagem de uma semana à Ásia. Durante essa jornada, o líder americano formalizou pactos comerciais com a Tailândia e a Malásia que, de forma explícita, abordavam questões críticas relativas às terras raras – minerais essenciais para tecnologias de ponta e cujo fornecimento global é dominado pela China. Além disso, Trump prometeu combater o antidumping com o Camboja, outra área de discórdia comercial com Pequim. Essa movimentação republicana de fortalecer laços com aliados americanos no “quintal” geopolítico da China parecia estrategicamente desenhada para construir uma base de influência e poder negocial, antecedendo sua primeira reunião formal com Xi Jinping desde sua chegada à presidência.
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Em suma, a aproximação comercial entre EUA e China demonstrou capacidade de gerar resultados concretos em temas menos polêmicos, apaziguando mercados e garantindo concessões mútuas. Contudo, as questões estruturais, especialmente no campo da segurança nacional, tecnologia e subsídios estatais, continuam sem uma solução aparente, sugerindo um futuro de negociações fragmentadas e contínuas tensões. Para mais análises aprofundadas sobre o impacto da geopolítica na economia global e local, continue acompanhando nossa editoria de Economia.
Crédito da imagem: Marcelo Brandão/Agência Brasil
