Registro de Nome Africano: Pai Congolês Relata Dificuldades

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Um professor de francês de 36 anos, originário do Congo e naturalizado brasileiro desde 2016, descreveu ter vivido momentos de constrangimento e humilhação ao buscar o registro de nome africano para seu recém-nascido. Abed Betoko afirma que foi obrigado a discutir por mais de uma hora com oficiais de um cartório em Arujá, na Grande São Paulo, na última segunda-feira, dia 27, para que aceitassem o nome composto Zion Nzobale Costa Betoko, escolhido para o seu filho.

De acordo com Betoko, a insistência dos funcionários em questionar a escolha do nome ‘Nzobale’ se tornou uma verdadeira disputa. Ele relata ter indagado: “Se Zion, que nem é um nome de origem portuguesa, é aceito, por que ‘Nzobale’ não pode? Por que a necessidade de justificar? Qual é, de fato, o problema com um nome africano?”. O docente acredita firmemente que o critério aplicado foi motivado por preconceito racial, conforme detalhou ao g1.

Registro de Nome Africano: Pai Congolês Relata Dificuldades

Durante o processo de tentativa de registro de nome africano, o professor Abed Betoko conta que foram solicitados documentos referentes ao bisavô e tataravô da criança, mesmo após ele ter explicado que Nzobale não se trata de um sobrenome. A situação o levou a refletir sobre a percepção cultural de suas raízes. “Eu entendo que, no Brasil, não podemos escolher nomes que causem constrangimento à criança. Mas, a minha cultura seria motivo de vergonha? Considero isso um claro menosprezo por tudo o que se relaciona à África”, desabafou Betoko. Ele inclusive recorreu às redes sociais para demonstrar a existência de inúmeros indivíduos com o nome Nzobale no Congo, provando sua legitimidade e comum uso fora do Brasil. O cartório em questão foi procurado para comentar o ocorrido, mas não havia respondido à reportagem até a última atualização do texto.

Legislação Brasileira e Nomes Étnicos

Para esclarecer os parâmetros legais sobre o tema, Rui Gustavo Camargo Viana, tabelião e especialista em direito notarial e registral, explica a Lei de Registros Públicos. Segundo o artigo 55, parágrafo 1º, a legislação orienta os cartórios a evitar a atribuição de nomes que possam expor o indivíduo ao ridículo. No entanto, Viana ressalta que essa prerrogativa não se aplica a nomes de cunho étnico, sejam eles africanos, indígenas ou judaicos. “A escolha do nome deve ser analisada à luz do contexto cultural em que a criança está inserida”, destaca o especialista. Ele enfatiza que a particularidade ou incomumidade de um nome não o torna “ridículo” sob o olhar da lei. “Não é de competência do cartório impor dificuldades na aceitação de um nome apenas porque ele diverge das tradições locais”, afirma Viana, em declaração que se alinha à visão do Conselho Nacional de Justiça, que incentiva a diversidade de nomes e o respeito às origens familiares.

Viana elucida ainda que a prática vedada pela legislação brasileira é a criação de um sobrenome que não possui vínculo com os antepassados do bebê. No caso de Zion Nzobale, não havia irregularidades evidentes: os sobrenomes escolhidos foram Costa, da mãe, e Betoko, do pai. A dificuldade enfrentada por Betoko pode ter se originado de uma falha de interpretação por parte dos oficiais, que poderiam ter erroneamente associado Nzobale a um sobrenome. Visto que se trata de um nome composto, as normas no Brasil favorecem a liberdade de escolha e o respeito irrestrito à diversidade cultural e étnica.

A Profunda História por Trás do Nome Nzobale

Abed Betoko revela que a escolha do nome Nzobale para seu filho está enraizada em uma antiga tradição familiar de grande significado. Ele compartilha a história de suas tataravós, que frequentemente perdiam seus filhos durante ou logo após o nascimento. Um dia, uma delas teve um sonho revelador: sua mãe, já falecida, lhe aconselhava a preparar um mingau de uma árvore conhecida como Nzobale e dá-lo ao bebê. Ao despertar, ela seguiu o conselho, e para a surpresa e alegria de todos, a criança sobreviveu.

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Imagem: g1.globo.com

É por essa razão, uma memória de sobrevivência e cura transmitida por gerações, que Abed fez questão de que seu filho carregasse esse nome. O significado de “Nzobale” em sua cultura é, justamente, “cura”. “É por causa dessa planta, e do poder dessa história, que eu estou aqui hoje. Minha existência é prova viva desse milagre”, declara o professor. Ele tem o propósito de, no futuro, quando Zion Nzobale for mais velho, relatar-lhe detalhadamente os desafios enfrentados no cartório durante o seu registro de nome africano. A intenção de Betoko é incutir em seu filho o valor e a importância de seu nome, e de suas origens. “Não podemos ceder a pressões ou a concepções errôneas. Quanto mais indivíduos optarem por nomes africanos, mais eles se tornarão uma parte comum e aceita do nosso tecido social. Se eu não tivesse uma mentalidade firme, talvez tivesse sucumbido à vergonha das minhas raízes”, concluiu Abed, defendendo a riqueza da diversidade cultural brasileira.

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O caso do professor Abed Betoko ilustra as complexidades e os desafios culturais que ainda persistem no Brasil, mesmo diante de uma legislação que defende a diversidade e o respeito à individualidade. A busca pelo registro de nome africano para seu filho Zion Nzobale Betoko se tornou um símbolo de resistência e orgulho identitário. Continue acompanhando as notícias de cidadania e direitos humanos em nossa editoria de Análises e Opiniões, onde exploramos as nuances de nossa sociedade e os debates importantes que moldam o futuro do país.

Crédito da imagem: Arquivo pessoal

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