A recusa de ‘Frankenstein’ da Netflix pela rede de cinemas Estação Net, uma das mais tradicionais do Rio de Janeiro, gerou repercussão no mercado audiovisual brasileiro. A decisão, anunciada pela sócia-fundadora Adriana Rattes, reflete uma insatisfação crescente com as políticas de janelas de exibição curtas praticadas por grandes plataformas de streaming, como a Netflix, impactando diretamente o setor de exibição cinematográfica.
A justificativa para a não exibição do aguardado longa-metragem dirigido por Guillermo del Toro foi a demanda da plataforma por uma janela de exibição nos cinemas de apenas 15 dias. Segundo Rattes, à frente de um grupo que opera 13 salas em três diferentes cinemas na capital fluminense, esse prazo é consideravelmente prejudicial tanto para a sustentabilidade dos filmes em cartaz quanto para o mercado como um todo. A exibidora argumenta que uma janela adequada deveria ser de, no mínimo, três meses, um período já regulamentado e estendido em diversas nações para preservar a experiência cinematográfica e o modelo de negócio dos exibidores.
Recusa: Estação Net não exibe ‘Frankenstein’ da Netflix
No Brasil, atualmente, existe um acordo informal entre distribuidores e exibidores que estabelece um mínimo de 45 dias para que um filme saia das salas de cinema e seja disponibilizado em outras mídias. Para a Estação Net, aceitar uma janela de apenas 15 dias equivale a utilizar as salas de projeção simplesmente como ferramenta promocional para valorizar os títulos das grandes plataformas internacionais, o que, em última análise, acabaria por sufocar a própria exibição nos cinemas. A rede afirmou categoricamente que não irá “compactuar com isso”, sublinhando a sua postura de defesa do modelo tradicional de distribuição cinematográfica.
A rejeição de “Frankenstein” não é um incidente isolado na trajetória da Estação Net. A rede já havia tomado decisões semelhantes em relação a outros filmes originais de plataformas de streaming. Exemplos incluem “O Filho de Mil Homens”, do diretor Daniel Rezende, com a atuação de Rodrigo Santoro e baseado na obra de Valter Hugo Mãe, que ofereceu uma janela de três semanas, mas também foi recusado. Filmes como “Casa de Dinamite”, de Kathryn Bigelow, e “Apocalipse nos Trópicos”, de Petra Costa, ambos originais de plataformas (contextualmente inferidos como da Netflix por sua política), também tiveram suas exibições barradas devido à imposição de uma janela de 15 dias. Essas escolhas indicam uma política interna consistente da Estação Net em face às propostas das gigantes do streaming.
Pode soar contraintuitivo que uma rede de cinemas recuse a exibição de um potencial blockbuster com nomes de peso como Guillermo del Toro e Mia Goth (que está no elenco do filme). No entanto, Adriana Rattes esclarece que a decisão não pode ser pautada exclusivamente pelos resultados imediatos da bilheteria de um único título. Ela enfatiza a trajetória de 40 anos do grupo Estação Net, dedicada a formar e atender um público que valoriza a qualidade cinematográfica e a experiência de assistir a filmes na tela grande. A visão da Estação Net é de que seu trabalho colabora com as plataformas, ajudando a criar uma cultura cinematográfica que, em última instância, beneficia todo o ecossistema, em vez de prejudicá-lo.
O episódio envolvendo o filme “Frankenstein” no Rio de Janeiro, produzido pela Netflix, é percebido pelos players do setor como um sintoma mais amplo de um mercado em crise profunda. Não apenas as relações entre exibidores e distribuidores digitais estão em xeque, mas a própria sustentabilidade dos cinemas de pequeno e médio porte em todo o Brasil. Apesar da posição firme da Estação Net, a realidade é que nem todas as empresas de exibição de menor escala possuem a mesma capacidade financeira e estratégica para se dar ao luxo de boicotar produções que poderiam atrair um grande público e gerar receita a curto prazo.
Jack Silva, representante da Aexib, a Associação dos Exibidores Brasileiros de Cinemas de Pequeno e Médio Porte, ressalta que o cenário atual exigirá uma reação por parte do setor. Ele expressa que, em sua memória, não há precedentes para uma recusa de um filme de grande porte que promete alto retorno financeiro por parte de cinemas de médio porte. Para Silva, este é um período “terrível em termos de resultado”, o que leva muitos exibidores a buscar exibir qualquer filme que apareça, na esperança de gerar alguma receita e manter suas operações. Essa dependência econômica fragiliza a capacidade de negociação e a manutenção dos princípios que exibidores como a Estação Net buscam defender.

Imagem: www1.folha.uol.com.br
A crise no mercado de exibição é multifacetada e se agrava com outras questões regulatórias, como a legislação da cota de tela. Segundo Jack Silva, a lei da cota de tela – que obriga as salas a exibirem um percentual de obras nacionais – corre o risco de não ser devidamente contemplada no Projeto de Lei de regulamentação do streaming. Essa omissão pode dificultar ainda mais a já precária situação dos exibidores de porte pequeno e médio, que já enfrentam dificuldades em cumprir as exigências da cota.
A lei estabelece que um cinema com apenas uma sala, por exemplo, deve dedicar pelo menos 7,5% de suas sessões a obras nacionais e apresentar um mínimo de três títulos brasileiros diferentes. Para redes maiores, com 201 salas ou mais, a cota atinge 16,0%. Contudo, um grande número de exibidores tem enfrentado obstáculos para cumprir essas metas com facilidade. A preocupação de Silva é latente: em um período de imensa crise financeira, muitos exibidores correm o risco de sofrer sanções e multas significativas pelo descumprimento das cotas de tela, adicionando mais uma camada de desafio ao já complexo panorama. Para um panorama mais amplo sobre a situação do setor audiovisual, consulte análises do setor cultural brasileiro.
Apesar da intensa discussão, a reportagem que abordou o tema não obteve um posicionamento oficial da Netflix sobre a recusa do filme “Frankenstein” e as críticas às políticas de janelas de exibição. A ausência de um pronunciamento da plataforma sugere a complexidade e a delicadeza do debate, que continua a moldar o futuro do consumo de conteúdo cinematográfico.
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Em suma, a decisão da Estação Net de não exibir ‘Frankenstein’ da Netflix serve como um alerta para as tensões crescentes entre cinemas tradicionais e plataformas de streaming. A controvérsia sobre as janelas de exibição e o futuro das cotas de tela apontam para um período de profundas transformações e desafios no mercado audiovisual brasileiro. Para acompanhar todas as nuances dessa discussão e outras notícias relevantes, continue conectado em nossa editoria de análises.
Crédito da Imagem: Ken Woroner/Netflix



