Os **Protestos da Geração Z** têm demonstrado um papel decisivo na arena política global, culminando na destituição de governantes e fomentando um clamor generalizado por reformas. Liderados por jovens nascidos entre 1995 e 2010, esses movimentos, que se estendem de Madagascar ao Marrocos e do Paraguai ao Peru, utilizam as redes sociais como ferramenta principal para organização e propagação de suas pautas. Contudo, especialistas advertem que essa mesma dependência digital pode se configurar como uma fragilidade para a sustentabilidade dessas mudanças.
Observa-se um padrão global de insatisfação juvenil que impulsiona exigências por mudanças estruturais. Exemplos recentes incluem Madagascar, onde a falta de serviços essenciais, como energia e água, motivou a derrubada do governo, culminando na posse do Coronel Michael Randrianirina como novo presidente em uma sexta-feira (17/10), dias após um golpe militar. No Nepal, a insatisfação com corrupção e nepotismo levou à renúncia do primeiro-ministro, em um contexto de protestos violentos que causaram cerca de 70 mortes.
Protestos da Geração Z: Redes Sociais Moldam Ativismo Global
No Quênia, a juventude utilizou tanto as ruas quanto as plataformas digitais para pressionar por reformas e responsabilização governamental. No Peru, jovens uniram-se a categorias de trabalhadores, como motoristas de ônibus e táxis, para expressar repúdio a escândalos de corrupção e ao agravamento da insegurança pública. A efervescência popular levou o Congresso peruano a aprovar, em 10 de outubro, o afastamento da presidente Dina Boluarte, com a subsequente ascensão interina de José Jerí ao cargo, ainda que os protestos continuem, clamando agora por sua saída. Em outros cantos do globo, a Indonésia testemunhou trabalhadores informais manifestando-se contra cortes em programas sociais, enquanto o Marrocos vivenciou as maiores mobilizações antigovernamentais em anos, com demandas por melhorias na saúde e educação, e críticas aos vultosos investimentos em estádios de futebol para a Copa do Mundo.
As mídias digitais atuam como um catalisador vital para essas manifestações, servindo como ambiente para o compartilhamento de narrativas pessoais, o fortalecimento de laços de solidariedade, a coordenação de táticas e a troca de experiências entre ativistas de diferentes nações. Conforme Janjira Sombatpoonsiri, pesquisadora do Instituto Alemão de Estudos Globais e Regionais, a conectividade digital vem impulsionando uma série de protestos liderados por jovens há cerca de 15 anos. Essa onda histórica de ativismo inclui a Primavera Árabe (2010-2011), o movimento Occupy Wall Street (2011-2012), os “Indignados” na Espanha (2011) contra a austeridade, e manifestações pró-democracia na Tailândia (2020-2021), Sri Lanka (2022) e Bangladesh (2024).
Steven Feldstein, pesquisador sênior do Carnegie Endowment for International Peace, remonta a origem do ativismo digital massivo à Segunda Revolução do Poder Popular nas Filipinas em 2001, quando as mensagens de texto SMS foram cruciais. Segundo Feldstein, a novidade reside na crescente sofisticação tecnológica – com celulares amplamente disseminados, redes sociais, aplicativos de mensagens e inteligência artificial – que impulsionou e facilitou a mobilização em escala global. Para essa geração, o ambiente digital é a forma primordial de comunicação e organização. Imagens e publicações hoje alcançam vastos públicos com rapidez inédita, intensificando a indignação e fortalecendo a solidariedade.
Athena Charanne Presto, socióloga da Universidade Nacional da Austrália, aponta que as redes sociais têm a capacidade de transmutar publicações aparentemente corriqueiras em discussões políticas, e, frequentemente, em mobilizações concretas. A corrupção, que outrora parecia abstrata em relatórios, ganha materialidade quando vislumbrada em dispositivos móveis através de fotos de mansões, veículos esportivos e bens de luxo das elites. Essa exposição transforma a disparidade entre o privilégio governamental e a rotina da população em um afronta pessoal, desvelando a corrupção em fragmentos palpáveis. Um episódio no Nepal, em setembro, é ilustrativo: protestos eclodiram após o filho de um político divulgar no Instagram uma fotografia ao lado de uma árvore de Natal feita com caixas de marcas de luxo, gerando revolta popular. Similarmente nas Filipinas, jovens manifestantes visualizaram nos excessos das elites a negligência governamental em questões cruciais, como projetos de controle de enchentes que afetam diretamente a população.
Além de impulsionar a visibilidade de injustiças, as redes sociais também fomentaram o intercâmbio de estratégias de protesto entre ativistas de diferentes nações. A iniciativa #MilkTeAlliance, uma coalizão pró-democracia pan-asiática originada dos protestos em Hong Kong em 2019, tornou-se um polo de articulação para militantes em Mianmar, Tailândia e outros países. Manifestantes tailandeses, por exemplo, adotaram a tática de Hong Kong, conhecida como “seja como a água”, para alterar locais de protesto de última hora via Telegram, frustrando bloqueios policiais e garantindo maior segurança aos participantes, como afirma Sombatpoonsiri.
A proliferação da dissidência online gera uma resposta repressiva de muitos regimes autoritários, por meio de censura e força. Paradoxalmente, essas táticas de repressão podem, muitas vezes, produzir o efeito contrário ao desejado, exacerbando a indignação pública e deflagrando protestos de maior envergadura, especialmente quando cenas de violência estatal são transmitidas ao vivo. O caso de Bangladesh em 2021 é exemplar: após o governo bloquear a internet e prender opositores, o falecimento do estudante ativista Abu Sayed por disparos da polícia, transmitido em tempo real, transformou-o em um mártir, motivando uma onda ainda maior de manifestações. Padrões semelhantes foram observados no Sri Lanka, Indonésia e Nepal, onde mortes de manifestantes intensificaram o clamor público, endureceram as exigências e, em alguns cenários, contribuíram para a queda de governos.
Embora as redes sociais amplifiquem a capacidade dos protestos, também os tornam vulneráveis à fragmentação e à repressão. A estrutura descentralizada, sem uma liderança fixa, oferece flexibilidade e uma sensação de igualdade, como aponta Sombatpoonsiri, mas pode igualmente expor os movimentos a infiltrações, à violência e a desvios de suas pautas originais. Na Tailândia, debates online e o surgimento de hashtags como #RepublicofThailand e símbolos comunistas contribuíram para a fragmentação do movimento pró-democracia, afastando potenciais aliados. Enquanto isso, protestos sem coordenação adequada no Nepal e em Bangladesh frequentemente resultaram em confrontos violentos. Ademais, estudos indicam que regimes autoritários intensificam o uso de ferramentas digitais para vigilância e repressão, impondo um risco constante aos ativistas desde a Primavera Árabe. Para saber mais sobre o impacto geopolítico dessas revoltas, confira este artigo sobre Os 10 anos da Primavera Árabe na BBC News Brasil: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-56336585.
A longevidade e o impacto de longo prazo dos protestos organizados por redes sociais são objeto de intenso debate. Um estudo da Universidade de Harvard de 2020 revelou uma queda significativa na taxa de sucesso de campanhas não violentas, que passou de 65% nos anos 1980 e 1990 para 34% entre 2010 e 2019. Sombatpoonsiri ressalta que, mesmo quando movimentos de massa conseguem provocar mudanças governamentais, a garantia de transformações duradouras está longe de ser certa. Protestos podem escalar para guerras civis, como no caso da Síria, Mianmar e Iêmen, gerando disputas entre facções. Em outras situações, autocratas podem retornar ao poder e consolidar sua influência, a exemplo do Egito, Tunísia e Sérvia, visto que as reformas falharam em desmantelar as estruturas enraizadas dos regimes anteriores.
Em vista desses desafios, estratégias que combinam abordagens online e offline, as chamadas “estratégias híbridas”, são cruciais para promover alterações políticas e sociais genuínas. Para Steven Feldstein, as redes sociais, por sua natureza, não foram desenhadas para gerar transformações de longo prazo, dependendo de algoritmos e indignação instantânea. A mudança efetiva exige que movimentos online difusos se convertam em ações com visão estratégica, com laços que se manifestem tanto no mundo físico quanto no digital. Os especialistas enfatizam a necessidade de alianças amplas que fomentem a cooperação entre a sociedade civil, partidos políticos, atores institucionais e os movimentos impulsionados pela internet.
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Em suma, a **Geração Z** redefine o ativismo político global através das redes sociais, influenciando quedas de governo e demandas por reformas. No entanto, o sucesso a longo prazo depende da transição de engajamento digital para estratégias híbridas e alianças duradouras. Continue acompanhando a seção de Política para se manter atualizado sobre os desdobramentos desses movimentos transformadores e suas implicações globais.
Crédito da imagem: Prabin Ranabhat / AFP via Getty Images

Imagem: g1.globo.com



