Um cenário preocupante se desenha para o futuro do **Muriquis Ameaçados: Primatas Perdem 61% do Habitat até 2090**. Conforme um recente estudo divulgado no Journal for Nature Conservation, as duas espécies do maior gênero de primatas das Américas – o muriqui-do-norte (Brachyteles hypoxanthus) e o muriqui-do-sul (B. arachnoides) – enfrentam uma redução drástica em seus hábitats adequados até o final do século, impulsionada pelas alterações climáticas. A projeção estima uma perda de área de 44% para o muriqui-do-norte e alarmantes 61% para o muriqui-do-sul. A pesquisa, que contou com o essencial apoio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), destaca a vulnerabilidade desses primatas.
No território paulista, a situação do muriqui-do-norte é ainda mais crítica, com a expectativa de que o estado perca completamente todas as suas áreas climáticas apropriadas para a espécie até 2090. Essas projeções isolam apenas o efeito das mudanças climáticas, desconsiderando outros fatores igualmente devastadores, como o desmatamento contínuo, a fragmentação florestal e a caça indiscriminada, que adicionam camadas de risco à sobrevivência dessas espécies já tão pressionadas.
Muriquis Ameaçados: Primatas Perdem 61% do Habitat até 2090
Tanto o muriqui-do-norte quanto o muriqui-do-sul são primatas endêmicos da rica, mas devastada, Mata Atlântica e, por isso, são classificados como “criticamente ameaçados de extinção” pela IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza). Tiago Vasconcelos, pesquisador do Programa de Pós-graduação em Biociências da Unesp (Universidade Estadual Paulista), em Bauru (SP), e autor principal do estudo, ressalta a gravidade dos dados.
“Somente as mudanças climáticas não extinguirão os muriquis, segundo nossas análises. Contudo, quase metade do hábitat atualmente favorável pode desaparecer. Isso é extremamente alarmante, considerando as múltiplas pressões sobre esses primatas”, explicou Vasconcelos. O trabalho é uma parcela de um projeto mais amplo, também apoiado pela Fapesp no âmbito do Programa de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais, evidenciando o comprometimento com o estudo aprofundado dos impactos ambientais.
As metodologias utilizadas para tais projeções envolvem o uso de softwares especializados que analisam dados complexos sobre a distribuição geográfica atual das espécies e informações climáticas vitais para seus requerimentos fisiológicos. Essas ferramentas permitem caracterizar as preferências ambientais dos muriquis a partir do clima presente e, em seguida, projetá-las em diferentes cenários futuros de alterações climáticas, contemplando variáveis como padrões de chuva, elevação de temperaturas médias mensais e períodos de seca.
Desafio Geográfico e o Interior Ameaçado
Estudos prévios já haviam sinalizado a redução de áreas adequadas para as duas espécies de muriquis até o final do século. No entanto, a contribuição do trabalho de Vasconcelos reside na quantificação dos prejuízos em intervalos mais específicos de curto e médio prazo, analisando os anos de 2030, 2050, 2070 e 2090. “Enquanto outros autores focavam nas reduções até 2050 e 2090, nossa pesquisa conseguiu mapear a perda progressiva que ocorrerá ao longo de todo o século, com maior detalhe e precisão”, detalha o pesquisador, que atualmente atua como professor substituto no Departamento de Biologia e Zootecnia da Faculdade de Engenharia da Unesp, em Ilha Solteira (SP).
Um artigo de 2023, por exemplo, já indicava que as áreas mais vulneráveis para o muriqui-do-sul seriam as florestas semidecíduas no interior do Paraná e de São Paulo. Vasconcelos corroborou esses resultados, adicionando que essas regiões de hábitat continuarão a encolher de forma contínua nas próximas décadas. Adicionalmente, seu estudo revela um deslocamento da área de ocorrência da espécie na direção nordeste.
“Esse movimento não se traduzirá em um aumento de áreas apropriadas, como acontece com outros grupos de animais. Pelo contrário. A significativa perda de áreas na porção oeste de sua distribuição atual resultará em populações remanescentes restritas à parte leste do território”, explicou o especialista.
Para o muriqui-do-norte, o estudo identifica padrões análogos de perda de áreas climaticamente adequadas ao longo das décadas, com uma acentuação drástica entre 2070 e 2090. As maiores perdas para essa espécie também se concentram em regiões do interior, como o leste e sul de Minas Gerais e o centro-oeste do Rio de Janeiro. Particularmente alarmante é a situação do estado de São Paulo, onde toda a área adequada para o muriqui-do-norte deverá ser perdida até 2090. Nesse ano, restarão apenas duas extensões territoriais climaticamente apropriadas para a espécie: uma na Bahia e no nordeste de Minas Gerais (população do norte) e outra no Espírito Santo, com uma menor porção no norte do Rio de Janeiro.

Imagem: www1.folha.uol.com.br
Para ambas as espécies de muriquis, as grandes áreas consideradas mais adequadas climaticamente no final do século se localizam ao longo da costa, associadas às florestas ombrófilas. “As mudanças climáticas representarão desafios extraordinariamente severos para as populações que vivem nas áreas do interior, onde predominam as florestas semidecíduas, caracterizadas pela perda parcial de folhas na estação seca”, adverte o estudo.
Necessidade Urgente de Soluções de Conservação
O pesquisador Tiago Vasconcelos faz um importante alerta: as previsões de seu trabalho consideram apenas o fator climático. Isso significa que o risco real de extinção pode ser substancialmente maior ao considerar a ação conjunta de outras ameaças, como a persistente perda e fragmentação do hábitat. Essa sinergia entre fatores pode levar ao isolamento das populações de muriquis e interromper o fluxo gênico vital, comprometendo a saúde e a viabilidade das populações restantes e diminuindo ainda mais a área de ocorrência. Casos de extinções locais já documentadas ocorreram, inclusive, em áreas degradadas de floresta semidecídua.
Em virtude disso, a conclusão do trabalho enfaticamente recomenda um foco estratégico nos esforços de conservação direcionados às populações do interior. Adicionalmente, o estudo sublinha a importância de aprimorar a compreensão sobre como essas populações se adaptarão efetivamente às mudanças climáticas nas próximas décadas, uma questão crucial para intervenções eficazes.
Em uma perspectiva de médio e longo prazo, a pesquisa indica que a proteção dos muriquis deve concentrar-se nas florestas ombrófilas da costa. Isso envolve a identificação de locais estratégicos para a criação e implementação de corredores ecológicos, que possam interligar populações atualmente desconectadas. Esse planejamento visa a garantir que “as espécies tenham a oportunidade de manter o fluxo gênico e persistir como populações saudáveis neste século”, conclui Tiago Vasconcelos. A preservação da biodiversidade, como se observa, demanda ações interconectadas, assim como o planeta (veja mais sobre programas de pesquisa sobre mudanças climáticas globais aqui).
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Os desafios que os muriquis enfrentam servem como um lembrete urgente das amplas consequências das mudanças climáticas na fauna brasileira. Compreender a escala dessa ameaça e as ações de conservação necessárias é fundamental para mitigar a perda de biodiversidade. Continue acompanhando as notícias e análises ambientais em nosso site para mais informações e para se manter atualizado sobre a proteção de nosso patrimônio natural.
Crédito da Imagem: Bart van Dorp/Wikimedia Commons
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