Em 2025, o panorama da premiação do Prêmio Nobel nas categorias científicas – Medicina, Física e Química – novamente evidencia uma participação feminina aquém do esperado. O evento deste ano registrou a concessão de apenas uma láurea a uma mulher nesses campos, reiterando um padrão de sub-representação já frequentemente observado ao longo da história da premiação. Em contrapartida, um fato notável e raro foi a entrega de um Nobel científico a um pesquisador originário do Oriente Médio, embora sua trajetória acadêmica e profissional tenha se desenvolvido predominantemente nos Estados Unidos.
A única cientista a receber um Nobel nessas categorias em 2025 foi a americana Mary E. Brunkow. Ela partilhou o reconhecimento na área da Medicina com outros dois pesquisadores do sexo masculino. Nas outras duas disciplinas científicas, os seis agraciados foram exclusivamente homens, sublinhando a baixa proporção de mulheres no prestigiado prêmio global. Esse desequilíbrio persiste apesar da crescente presença e do papel crucial de mulheres em diversas esferas do conhecimento científico atualmente.
Mulheres no Nobel Científico 2025: Persistente Disparidade
A questão da presença minoritária de mulheres no Prêmio Nobel não se constitui em novidade. A histórica discrepância é patente, e em anos recentes, já ocorreram edições em que nenhuma mulher foi contemplada nas categorias científicas, como em 2024, mesmo diante do elevado número de pesquisadoras atuando em várias áreas do saber ao redor do globo. Esse cenário levanta questões pertinentes sobre as barreiras e os desafios enfrentados pelas mulheres no campo científico e na arena das grandes distinções.
Uma análise histórica desde 1901, quando as láureas foram instituídas e considerando exclusivamente as três categorias científicas, revela uma presença feminina em apenas 21 dos anos em que os prêmios foram entregues (excluindo os períodos de guerras mundiais onde o prêmio não foi concedido). No total, mulheres foram laureadas 27 vezes, o que representa um grupo de 26 cientistas, já que Marie Curie foi duplamente agraciada em Física e Química. Em contraste, os homens receberam prêmios 635 vezes, com quatro deles também sendo laureados mais de uma vez.
Poder-se-ia argumentar que, historicamente, o ingresso de homens em carreiras científicas era significativamente maior. Esta premissa contém certo grau de veracidade, considerando os obstáculos de acesso à educação superior para mulheres no passado. No entanto, exemplos notáveis como o de Marie Curie e sua filha Irène Joliot-Curie demonstram inequivocamente que mulheres estiveram engajadas em descobertas científicas cruciais durante todo esse tempo. Mesmo com as transformações sociais e acadêmicas das últimas décadas, a escassez de premiações para mulheres persiste, indicando que a situação transcende meramente o acesso inicial.
Márcia Barbosa, que é reitora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC), manifesta que o desfecho deste ano não surpreende. “Em algumas áreas, como a física, onde o percentual de mulheres ingressantes é muito reduzido, atingir o ápice se torna consequentemente uma meta de difícil alcance,” pontua Barbosa. Ela acrescenta que, “na química, a situação é ligeiramente mais surpreendente, pois é uma área onde a proporção de mulheres no ingresso atual é de cerca de 50%. Poderíamos, assim, ter uma expectativa de que ao menos uma mulher fosse agraciada entre os três vencedores. Contudo, percebe-se a existência de subáreas de pesquisa com maior participação feminina, o que pode influenciar os resultados.”
Luiz Augusto Campos, professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e pesquisador apoiado pelo Instituto Serrapilheira, invoca estudos de sociologia da ciência datados das décadas de 1960 e 1970, conduzidos por Harriet Zuckerman, da Universidade Columbia. Esses estudos já identificavam as dificuldades que as mulheres encontravam no ambiente acadêmico daquela época. Em um de seus trabalhos, Zuckerman provocou: “O que, então, pode ser dito sobre a distribuição de premiações entre homens e mulheres da ciência?”
De acordo com Campos, que é coordenador de pesquisas sobre diversidade no meio acadêmico, os estudos de Zuckerman salientam que o campo científico opera por meio de uma “série de filtros interpostos, uma espécie de olimpíada que consistentemente replica e amplifica as desigualdades sociais”. Campos afirma veementemente que “os prêmios, em particular, representam um espaço de grande potencialização dessas desigualdades, tornando-se palco para a manifestação destas.” A tese do “princípio da tripla penalidade”, elaborada por Zuckerman, argumenta que as mulheres cientistas sofrem em três frentes: superando obstáculos para entrar na ciência; enfrentando as consequências psicológicas de uma discriminação percebida, que leva a uma aspiração limitada; e sofrendo discriminação real na alocação de oportunidades e recompensas.
É importante destacar que a análise desta reportagem foca estritamente nas áreas científicas do Prêmio Nobel. Quando todas as categorias são consideradas, a representação feminina apresenta uma leve melhora. Por exemplo, em 2025, o Nobel da Paz foi conferido a María Corina Machado, figura proeminente da oposição venezuelana. Ainda assim, o número total de mulheres laureadas em todas as categorias de 2025 até o momento contabiliza apenas duas.
Adicionalmente, Márcia Barbosa compartilhou um dado de sua própria pesquisa sobre mulheres reitoras em universidades federais no Brasil nos últimos vinte anos. Ela notou que o percentual de reitoras saltou de pouco mais de 10% no início do governo Dilma Rousseff para quase 30% ao final de sua gestão. “Fica bastante evidente que a política pública com maior impacto no aumento do percentual de mulheres reitoras foi, de fato, a presença de uma mulher na Presidência da República durante o período de governo Dilma,” ressaltou Barbosa, sugerindo a influência da representatividade política no cenário acadêmico.
Mais um Prêmio Nobel para Pesquisador do Oriente Médio
Em um período de intensas discussões sobre políticas de imigração, especialmente nos EUA sob o governo do republicano Donald Trump, um evento curioso e positivo no cenário científico foi a atribuição de mais um Prêmio Nobel a um imigrante do Oriente Médio, que levou o reconhecimento para os Estados Unidos. Omar M. Yaghi, de 60 anos, renomado pesquisador da Universidade da Califórnia, Berkeley, foi agraciado com o Prêmio de Química deste ano, dividindo a láurea com outros dois cientistas. Nascido na Jordânia, Yaghi é o primeiro laureado com o Nobel de seu país de origem.
“Eu vim de uma família de refugiados e meus pais mal tinham domínio da leitura ou da escrita. É uma jornada e tanto, e a ciência oferece essa possibilidade de realização. A ciência, na minha opinião, é a força mais equitativa do mundo”, declarou Yaghi em uma entrevista divulgada no site oficial do Prêmio Nobel. Essa é apenas a nona vez que um cientista nascido nesta região do mundo recebe a prestigiada honraria, sendo a oitava na categoria de Química. A premiação anterior a uma pessoa do Oriente Médio havia ocorrido em 2021, em Medicina, para Ardem Patapoutian, o primeiro nascido no Líbano a ser agraciado com um Nobel.
Contudo, um aspecto marcante comum a todos esses prêmios é que a totalidade dos cientistas laureados desenvolveram suas carreiras fora de seus países natais, em sua maioria nos EUA. As exceções foram um pesquisador que conduzia suas investigações na Universidade de Oxford, no Reino Unido, e grande parte dos cientistas israelenses mencionados, que atuaram em seu país de origem, com apenas um desenvolvendo pesquisas na Califórnia, nos Estados Unidos.
O primeiro jordaniano a conquistar o Nobel ressaltou: “Pessoas inteligentes, talentosas e habilidosas existem em toda parte. Por isso, devemos concentrar nossos esforços em desvendar seu potencial, proporcionando-lhes as oportunidades necessárias.”
A situação das mulheres no Nobel científico de 2025, com apenas uma laureada, espelha um padrão histórico de disparidade que precisa ser amplamente discutido e combatido. Simultaneamente, a distinção a Omar M. Yaghi, um cientista imigrante do Oriente Médio, demonstra que o talento e o potencial para a ciência são universais, independentemente das origens. Esses eventos reiteram a necessidade contínua de promover a diversidade e a equidade no cenário científico global.
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Crédito da imagem: David Ryder/Getty Images via AFP
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