O Jimmy Kimmel, um dos mais renomados comediantes e apresentadores de talk shows nos Estados Unidos, retornou ao ar na noite de terça-feira, marcando um dos eventos televisivos mais aguardados do ano e, ao mesmo tempo, um momento de considerável constrangimento para a The Walt Disney Company, sob a liderança de Bob Iger. A decisão de suspender e depois reintegrar Kimmel mergulhou a gigante da mídia em uma complexa polêmica, envolvendo não apenas o entretenimento, mas também as divisões políticas e a classe criativa de Hollywood.
A situação escalou a partir de um episódio onde a Disney, uma corporação que historicamente tentava se manter distante das denominadas “guerras culturais” que permeiam a era de Donald Trump na política norte-americana, viu-se subitamente no epicentro de uma controvérsia generalizada. A suspensão de Kimmel, provocada por seus comentários referentes ao assassinato de Charlie Kirk, um influenciador trumpista, deflagrou uma onda de reações adversas que exigiram uma revisão por parte da companhia.
Jimmy Kimmel de Volta à Disney em Meio a Forte Polêmica
A reintegração de Jimmy Kimmel, ocorrida após apenas cinco dias de suspensão, foi o desfecho de uma intensa pressão que veio de diversas frentes. Segundo fontes familiarizadas com o assunto, protestos de assinantes, importantes sindicatos da indústria cinematográfica, personalidades de renome em Hollywood e até mesmo políticos republicanos proeminentes, como o Senador Ted Cruz, desempenharam um papel crucial. O retorno foi selado após uma reunião estratégica realizada na segunda-feira pela manhã, envolvendo Kimmel e representantes da Disney.
Este turbulento episódio revelou muito sobre o estilo de liderança e a dinâmica de tomadas de decisão nos mais altos escalões da Disney, um dos conglomerados de mídia mais poderosos do mundo, avaliado em cerca de 200 bilhões de dólares. Um veterano da Disney, com experiência prévia de trabalho com Bob Iger, observou que, “apesar do perfil público que Iger construiu, ele não é alguém que enfrenta batalhas difíceis”. Esta análise sugere uma preferência por evitar confrontos prolongados e optar por resoluções mais ágeis frente a crises.
A decisão de trazer Kimmel de volta, conforme revelado por ex-executivos e fontes internas, pareceu ser impulsionada pelo receio de Iger e da chefe de televisão da empresa, Dana Walden, diante da forte repercussão negativa da comunidade criativa de Hollywood. “Eles estavam recebendo ligações dizendo que isso não estava certo”, detalhou uma das fontes, evidenciando o poder de influência do meio artístico quando mobilizado. A resposta coletiva do talento da indústria tornou a posição da Disney insustentável sem ceder.
O impacto público se intensificou quando mais de 400 celebridades de Hollywood, um número significativo que demonstra a unidade da classe, assinaram uma carta aberta condenando veementemente a suspensão do comediante. Nomes de peso como Meryl Streep, Jennifer Aniston e Selena Gomez estavam entre os signatários, tornando a repreensão algo difícil de ignorar ou relativizar pela direção da Disney. A mobilização de figuras tão influentes enviou um sinal claro sobre as expectativas da indústria em relação à liberdade de expressão.
Contrariando a narrativa de uma reação a um evento isolado, uma pessoa próxima ao desenrolar dos acontecimentos afirmou que a decisão de reintegrar Kimmel não foi motivada por um único fator específico, mas que a Disney “sempre teve a intenção de trazê-lo de volta”. A meta primordial da empresa, nesse sentido, era “acalmar as coisas”, evitando um prolongamento desnecessário da polêmica. Uma terceira pessoa envolvida nas discussões complementou que o movimento foi “guiado por princípios e pelo desejo de fazer a coisa certa como empresa”, reforçando que nunca houve a intenção real de cancelar o programa, mas sim de resolver a situação em parceria com o apresentador.
A velocidade das mudanças envolvendo o talk show de Kimmel, que alcança cerca de 1,7 milhão de telespectadores, levantou questionamentos substanciais sobre a gestão e a direção da Disney sob o comando de Iger. Em menos de uma semana, a empresa pareceu perder o controle de uma controvérsia que conseguiu envolver desde o ex-CEO da empresa, Michael Eisner, até o Senador Ted Cruz, atravessando diversas esferas de poder e influência. Michael Eisner, em um comentário na plataforma X, questionou publicamente: “Para onde foi toda a liderança? Se não forem os reitores de universidades, sócios-gerentes de escritórios de advocacia e CEOs corporativos que se levantam contra os valentões, quem então defenderá a Primeira Emenda?” Segundo outra pessoa ligada ao meio, os comentários de Eisner, apesar de irritarem Iger, não foram decisivos na reversão da decisão.
A raiz da discórdia começou na segunda-feira anterior à suspensão, quando Jimmy Kimmel, durante seu programa, acusou os apoiadores de Donald Trump de tentarem capitalizar politicamente o tiroteio de Charlie Kirk. O comediante criticou a tentativa de “desesperadamente tentar caracterizar esse garoto que assassinou o influenciador como qualquer coisa menos um deles”. Tyler Robinson, de 22 anos, foi acusado pelo assassinato de Kirk no início do mesmo mês, e as motivações por trás do crime permanecem sob investigação.
As declarações de Kimmel provocaram uma reação veemente de Brendan Carr, chefe da Comissão Federal de Comunicações (FCC) nomeado por Trump, que classificou os comentários como a “conduta mais doentia possível”. Carr foi ainda mais longe, ameaçando revogar as licenças de transmissão de afiliadas da ABC, uma subsidiária da Disney, afirmando: “Podemos fazer isso do jeito fácil ou do jeito difícil”, em um podcast conservador. A menção à possibilidade de interferência na regulamentação de licenças de transmissão por um órgão federal foi um ponto de alta tensão na controvérsia.
Como consequência direta das ameaças de Carr e da pressão política, as empresas de radiodifusão Sinclair e Nexstar, que juntas possuem mais de 60 afiliadas da ABC – estações de televisão locais que retransmitem a programação da rede – removeram Kimmel de suas grades de programação logo após a intervenção. A Nexstar, sediada no Texas, opera estações da ABC em importantes estados como Tennessee, Kansas, Ohio e Louisiana, e atualmente busca a aprovação da FCC para uma fusão avaliada em US$ 6 bilhões com sua rival Tegna. Da mesma forma, as estações da ABC da Sinclair estão espalhadas por Nebraska, Michigan, Texas e Alabama. Além da remoção, a Sinclair exigiu que Kimmel se desculpasse com a família de Kirk e fizesse um pagamento indenizatório ao grupo conservador jovem Turning Point USA.
Apesar da decisão da Disney de reintegrar o programa do comediante, tanto a Nexstar quanto a Sinclair mantiveram sua posição de não exibir Kimmel em seus canais de transmissão. Contudo, seu programa permanece acessível em alguns serviços de streaming pagos. A conduta dessas afiliadas, de certa forma, solidificou a impressão de que a Disney teria cedido à pressão de interesses corporativos menores. No entanto, alguns executivos do setor de mídia questionaram o verdadeiro grau de influência que Sinclair e Nexstar exercem sobre a Disney, especialmente considerando que a corporação detém os valiosos direitos de mídia para programas altamente populares, como os jogos da NFL, uma fonte de receita extremamente lucrativa para as próprias afiliadas.
Um informante da Disney relativizou o poder dessas emissoras, declarando: “Os caras da mídia dos EUA têm realmente medo das afiliadas. Mas a Disney é tão grande. A Sinclair não iria descartar toda a rede Disney. Na pior das hipóteses, eles bloqueariam o programa de Kimmel. Grande coisa”. Essa perspectiva indica uma visão de que a força da Disney é suficientemente robusta para absorver boicotes parciais sem grandes danos estruturais à rede.
Ainda que Jimmy Kimmel esteja de volta ao ar, o legado desse caso permanece uma fonte de perplexidade para os observadores da mídia norte-americana, especialmente em relação à atuação da Disney de Iger. A preocupação com o papel de Carr na FCC e, de forma mais ampla, com a liberdade de expressão sob a potencial volta de um governo Trump – particularmente para comediantes que fazem críticas e piadas políticas – é palpável. Tudo isso acontece em um contexto onde, apenas dois meses antes, a Paramount anunciou o cancelamento do programa “The Late Show” de Stephen Colbert, sugerindo uma tendência preocupante para o humor político na televisão. Para entender melhor os limites da expressão e o papel da FCC, consulte a página oficial da FCC sobre Liberdade de Expressão.
Anna Gomez, a única comissária democrata da FCC, expressou seu descontentamento com o ocorrido, qualificando o “lamentável capítulo” como uma “mancha na FCC”, ao mesmo tempo em que recebia a notícia da volta de Kimmel ao ar. Oportunamente, até alguns republicanos criticaram as ameaças proferidas por Carr contra a Disney. O senador do Kentucky, Rand Paul, afirmou que “a FCC estava errada em se manifestar” e garantiu que “lutará contra qualquer tentativa do governo de se envolver com a liberdade de expressão”. Complementando essa crítica, Ted Cruz descreveu os comentários de Carr sobre a revogação de licenças como “incrivelmente perigosos” e os comparou a “táticas de mafioso”, ressaltando a seriedade da intrusão governamental na mídia. Advogados representando Jimmy Kimmel e Brendan Carr optaram por não responder aos pedidos de entrevista sobre o assunto.
Um executivo do setor de mídia nos EUA sumariou a situação de forma concisa, afirmando que o desdobramento se transformou em uma “bagunça” para a Disney, concluindo: “Ninguém está feliz”. Este comentário final ilustra a complexidade da situação, onde mesmo a resolução imediata não conseguiu aplacar as múltiplas insatisfações e as questões subjacentes que foram expostas pela controvérsia.
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O retorno de Jimmy Kimmel ao seu talk show na Disney, embora ponha fim a uma semana de turbulência, destaca a delicada interseção entre o entretenimento, a política e a liberdade de expressão em um cenário midiático cada vez mais polarizado. As tensões entre grandes corporações, criadores de conteúdo e reguladores governamentais continuam a moldar o futuro da televisão e da mídia nos EUA. Para se manter atualizado sobre outras análises profundas e desdobramentos no cenário político e de mídia, continue acompanhando nossa editoria de Análises.
Crédito da imagem: Patrick T. Fallon/AFP
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