A indústria do cimento no Brasil, tradicionalmente associada a um alto índice de poluição, está passando por uma significativa transformação, direcionando vultosos investimentos para a redução de suas emissões de dióxido de carbono (CO2). Esse movimento estratégico visa redefinir o papel do setor no equilíbrio ambiental global, adaptando processos e incorporando tecnologias que promovem uma produção mais sustentável e ambientalmente responsável.
A dimensão do desafio é monumental, considerando a importância vital do cimento para a infraestrutura urbana e civil. Cidades inteiras são construídas sobre as fundações do concreto, cujo principal aglutinante é o cimento. A fabricação desse material fundamental, caracterizada por um processo complexo e energicamente intensivo, agora está sendo reavaliada e otimizada por indústrias em todo o país, como uma destacada em Minas Gerais.
Indústria do Cimento Investe para Reduzir Emissões de CO2
Nas salas de controle das fábricas modernas, como ilustrado por Mariana Moura, diretora de pessoas e cultura da Cimento Nacional, é possível observar a aplicação rigorosa de monitoramento ambiental. Ela explica que “Por esses painéis aqui, os nossos colegas monitoram de ponta a ponta tudo o que acontece dentro da fábrica. Inclusive, todas as emissões, todas as questões relacionadas às nossas obrigações voltadas para o meio ambiente”. As obrigações e as metas ambientais tornaram-se prioridade para o setor, que almeja alcançar a ambiciosa neutralidade de carbono até o ano de 2050. No contexto nacional, a indústria do cimento é responsável por cerca de 2,3% do total das emissões antropogênicas, um valor inferior à média global de 7%.
Estratégias para Diminuir Emissões de CO2 na Produção de Cimento
Grande parte das emissões de CO2 geradas pelo setor provém do combustível utilizado para aquecer os fornos rotativos, que chegam a temperaturas elevadíssimas. Historicamente, o coque de petróleo, um insumo rico em carbono, foi amplamente empregado. Contudo, a busca por alternativas mais limpas e eficientes tem impulsionado a indústria a investir em novos recursos. O Brasil, devido à sua vasta extensão territorial e diversidade econômica, oferece uma ampla gama de possibilidades regionais para a substituição desses combustíveis.
Uma das alternativas de destaque, e que representa um ganho ambiental em diversas frentes, é o uso de pneus velhos triturados. Paulo Camillo Penna, presidente da Associação Brasileira de Cimento Portland, enfatiza a relevância dessa prática, declarando que “Hoje, nós utilizamos 75 milhões de pneus. Esses pneus, se enfileirados, são capazes de dar uma volta inteira no eixo da Terra”. Ele adiciona que isso “dá uma dimensão do esforço, do volume e da escala que essa indústria requer para emissão, para redução das emissões de CO2”. Essa iniciativa não apenas mitiga as emissões industriais, mas também colabora com a destinação adequada de resíduos que, de outra forma, se acumulariam em aterros.
Coprocessamento e Novas Fontes de Energia
A estratégia conhecida como coprocessamento é central nesse esforço de descarbonização. Além dos pneus inservíveis, a indústria do cimento também tem incorporado outras formas de biomassa, como a moinha de carvão vegetal, e uma variedade de resíduos provenientes dos setores siderúrgico e minerador. Essa diversificação da matriz energética nos fornos permite substituir gradualmente os combustíveis fósseis. Atualmente, a fábrica citada já conseguiu substituir 30% do combustível fóssil original, e a meta estabelecida é alcançar a marca de 50% até 2030.
Ainda nesse contexto, a reciclagem de lixo doméstico se apresenta como um caminho promissor para o futuro. Mariana Moura destaca a importância dessa colaboração social: “Quanto mais eu conseguir separar esse material, mais eu vou ter condição de trazer resíduo para os meus fornos e para minha fábrica, e evitar que esse resíduo vá para os aterros”. A visão é transformar resíduos urbanos em fontes de energia, integrando ainda mais a indústria do cimento à economia circular.
Inovação no Clínquer e a Resistência do Cimento
Outro desafio intrínseco à fabricação do cimento reside na produção do clínquer, que ocorre quando o calcário e outros materiais são queimados em alta temperatura. Essas “pedrinhas” cinzas são essenciais para a resistência do cimento, mas sua queima é uma das maiores fontes de emissão de CO2. Para lidar com essa questão, a indústria tem explorado ativamente maneiras de diminuir a quantidade de clínquer na composição final do cimento.

Imagem: g1.globo.com
Os testes incluem a diluição da mistura com outros materiais, assegurando que a resistência e durabilidade do produto final não sejam comprometidas. Esses esforços estão demonstrando resultados positivos. De acordo com a Associação Global de Cimento e Concreto, no Brasil, a produção de uma tonelada de cimento libera, em média, 580 kg de CO2, enquanto a média mundial é de 600 kg. Este dado coloca o Brasil em uma posição relativamente vantajosa no cenário global, conforme detalhado pelas iniciativas globais em descarbonização do setor, como as discutidas na Global Cement and Concrete Association.
A colaboração com instituições de ensino e pesquisa é outro pilar dessa transformação. Parcerias com universidades buscam desenvolver soluções inovadoras que garantam tanto a sustentabilidade ambiental quanto a segurança estrutural das edificações. Rafael Pileggi, professor do Departamento de Engenharia de Construção Civil da Escola Politécnica da USP, explica o novo paradigma de engenharia: “Menos clínquer no cimento, menos cimento no concreto e menos concreto na parede ou na estrutura. Paredes mais finas, estruturas mais leves. Aquela coisa da chapa grossa, pilar grosso é mais resistente, já não é verdade. Quanto menos, mais”.
Essa perspectiva é corroborada por Luciana Oliveira, diretora técnica do Instituto de Pesquisas Tecnológicas, que enfatiza a responsabilidade compartilhada: “O fabricante faz a parte dele e quem compra também tem que fazer a parte dele, quem especifica também. E aí você consegue, nessa cadeia, ir reduzindo os impactos. Então, a gente tem que achar estratégias para melhoria: melhoria dos projetos, melhoria dos produtos e melhoria da utilização desses recursos”. O empenho na diminuição das emissões perpassa toda a cadeia de valor, da fabricação à obra concluída, exigindo o compromisso de todos os envolvidos.
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Em suma, a indústria do cimento no Brasil está empenhada em uma profunda reestruturação para diminuir sua pegada de carbono e avançar em direção a um futuro mais verde. Através de investimentos em tecnologias de monitoramento, coprocessamento de resíduos, desenvolvimento de novos cimentos com menor teor de clínquer e parcerias com a academia, o setor reafirma seu compromisso com a sustentabilidade e a inovação. Continue acompanhando as novidades sobre o impacto da economia na indústria brasileira e as ações de sustentabilidade em nossa editoria de Economia.
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