A região amazônica testemunha uma transformação alarmante: o fogo na Amazônia emergiu como o principal catalisador do desmatamento. Embora o ritmo das derrubadas convencionais mostre uma desaceleração, o uso deliberado do fogo para destruir a floresta registrou um crescimento expressivo. Essa nova modalidade de destruição apresenta-se como um método mais econômico, ágil e substancialmente mais desafiador para ser controlado e mitigado pelas autoridades. O que antes era uma ocorrência isolada, hoje se tornou um padrão preocupante em diversas áreas da vasta floresta tropical.
A alteração na tática de desmatamento é nítida. O processo histórico de desflorestamento, que se valia de equipamentos como tratores e motosserras, cedeu lugar a um ciclo dominado por queimadas intencionais. Estas, por sua natureza, são frequentemente mais discretas e menos perceptíveis aos sistemas de monitoramento via satélite, consolidando o fogo como uma ferramenta eficaz na degradação ambiental. Tal mudança foi significativamente impulsionada pela severa seca que assolou a região em 2023 e 2024.
Fogo na Amazônia se torna principal motor do desmatamento
Essa recente onda de estiagem se configura como uma das mais críticas da história recente, resultado direto de complexas interações entre as mudanças climáticas globais, o fenômeno El Niño e o aquecimento do planeta, conforme evidenciado por pesquisas conduzidas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e pela Universidade Federal do Pará. O clima caracterizado por temperaturas elevadas e a diminuição drástica das precipitações pluviométricas transformaram a floresta de uma área naturalmente úmida e exuberante em um ecossistema extraordinariamente vulnerável e inflamável, preparado para a propagação incontrolável de focos de incêndio.
A Nova Dinâmica do Desmatamento: Do Trator à Chama
Diante desse cenário de maior vulnerabilidade ambiental, os atores criminosos também recalibraram suas operações. Previamente, o modus operandi de desmatamento seguia uma sequência mais linear: primeiro a derrubada da floresta, em seguida a espera pelo processo de secagem da vegetação e, por fim, a utilização do fogo para a completa limpeza do terreno. Agora, a estratégia foi radicalmente invertida, conferindo um papel central à chama no estágio inicial da devastação.
O ciclo atual começa com a exploração e extração ilegal de madeira, uma atividade que, ao abrir clareiras e trilhas no interior da mata, torna a floresta mais exposta e propensa à desidratação. Somente após esta fase preliminar é que as queimadas são intencionalmente iniciadas. Esse método confere vantagens operacionais para os criminosos: reduz significativamente os custos e minimiza os riscos de detecção por órgãos fiscalizadores. Áreas degradadas, onde a vegetação não é completamente eliminada, conseguem se mesclar à floresta remanescente, dificultando o registro imediato do avanço do desmatamento pelos satélites.
Estratégias Criminosas: Otimização da Destruição
Este padrão de destruição, conhecido como degradação seletiva, demonstra-se não apenas mais acessível economicamente, mas também altamente eficaz para indivíduos e grupos que lucram com a ocupação ilegal de terras. A adoção desta abordagem prescinde da necessidade de maquinário pesado, como grandes tratores, exigindo apenas equipamentos mais leves, como pequenos caminhões, motosserras e suprimentos de combustível. A consequência é devastadora: porções inteiras da floresta são gradualmente consumidas, sem que um grande alarde seja feito, transformando-se paulatinamente em material combustível altamente inflamável, perpetuando o ciclo de destruição.
O “Efeito Borda” e a Vulnerabilidade da Floresta
Outro fenômeno que exacerba a problemática do fogo é o conhecido “efeito borda”. Este ocorre quando aberturas são criadas no dossel da floresta. As árvores localizadas nas margens dessas clareiras ou estradas ficam diretamente expostas à luz solar intensa, o que resulta na rápida perda de umidade e em seu ressecamento precoce. Essa alteração no microclima da floresta interna, junto ao efeito de clareira, permite que o fogo, que tradicionalmente era contido por barreiras naturais como os pastos, consiga agora adentrar e consumir áreas de mata densa.

Imagem: g1.globo.com
Um dado alarmante de 2024 revela que, pela primeira vez na série histórica recente, a extensão de floresta diretamente afetada pelo fogo superou as áreas de pastagem incendiadas. O Secretário Extraordinário do Meio Ambiente, André Lima, ressaltou que a proliferação das chamas configura-se hoje como um gravíssimo sinal de alerta para a nação. Ele pontuou que, ao se considerar o desmatamento impulsionado pela degradação florestal, o fogo é, sem dúvida, um indicador primordial. No entanto, fez a importante ressalva de que incêndios são, em sua essência, a culminação de modificações no uso e na ocupação do solo, que frequentemente estão interligadas a práticas culturais, embora essas sejam ilegais e desastrosas. Tais atividades são sistematicamente agravadas ou, em raras ocasiões, atenuadas, pelas condições climáticas reinantes.
O Inpe, por exemplo, tem conduzido importantes pesquisas sobre os efeitos combinados do desmatamento e das queimadas. Um estudo recente demonstrou como o calor extremo e a redução de chuvas, especialmente em função de eventos como o El Niño, contribuíram para uma temporada de incêndios florestais mais intensa do que o habitual, evidenciando a ligação intrínseca entre as alterações climáticas e a fragilidade do bioma amazônico. Mais informações sobre as pesquisas do Inpe podem ser acessadas diretamente no site oficial da instituição.
Estratégias de Combate e Perspectivas Governamentais
Diante do quadro crítico, o governo brasileiro tem mobilizado esforços, apostando em abordagens preventivas para mitigar o problema do fogo e do desmatamento na Amazônia. O Inpe, em colaboração estratégica, passou a implementar um método que integra dados de desmatamento e queimadas, visando identificar e mapear as regiões de maior vulnerabilidade para intervenções mais assertivas. Adicionalmente, planos de ação robustos destinados ao combate do desmatamento foram revitalizados, buscando antecipar e neutralizar os focos de degradação antes que escalem.
O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima afirma que estas estratégias coordenadas estão começando a render frutos. De acordo com os dados oficiais divulgados, o Brasil tem registrado, em 2025, os patamares mais baixos de incêndios florestais da última década, um feito que se estende por todos os biomas nacionais. Em paralelo, a taxa de desmatamento também exibe uma consistente trajetória de queda, indicando uma potencial inflexão no cenário da proteção ambiental brasileira.
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Este aprofundamento sobre a predominância do fogo como motor do desmatamento na Amazônia é essencial para compreender os desafios atuais da preservação ambiental. Continue acompanhando a seção de Análises para mais reportagens detalhadas sobre o meio ambiente e as complexas dinâmicas socioeconômicas que moldam nosso país.
Crédito da imagem: Marizilda Cruppe/Greenpeace, Adriano Machado/Reuters, Bruno Kelly/Reuters


