A possível fusão entre Gol e Azul, que gerou intensas especulações no mercado, foi oficialmente sepultada na noite da quinta-feira, 25 de setembro. Segundo fontes próximas às negociações, o projeto já se encontrava inativo entre as duas principais companhias aéreas do país há diversos meses, especificamente congelado desde junho. A iniciativa para formalizar o fim do processo partiu da Abra, holding controladora da Gol, que comunicou ao mercado a decisão, buscando assim, por um ponto final nas diversas conjecturas sobre uma potencial união estratégica no setor aéreo brasileiro.
Assinado em janeiro, o memorando de entendimentos entre as duas companhias aéreas visava estabelecer os termos para uma eventual fusão. Naquele momento, a Gol Linhas Aéreas estava em fase de reestruturação financeira, empenhada em ajustar suas pendências com credores no âmbito do Chapter 11, processo de recuperação judicial nos Estados Unidos. Paralelamente, a Azul Linhas Aéreas, embora já enfrentasse alguns desafios em seus balanços financeiros, encontrava-se em uma posição um tanto menos complexa em comparação à sua concorrente.
Fim da Fusão Gol Azul: Acordo é Oficialmente Encerrado
O memorando inicial, contudo, representava mais do que um simples indicativo de intenção. Ele funcionava como um plano estratégico, concebido para avaliar a união de forças em um segmento da economia global que é conhecido por sua extrema sensibilidade e vulnerabilidade a flutuações. Ambas as transportadoras enfrentaram significativos apertos financeiros no período pós-pandemia, culminando em um aumento drástico de suas dívidas, agravado pela alta do dólar e pelo encarecimento contínuo do querosene de aviação, que impactam diretamente seus custos operacionais.
Divergências Estratégicas Marcam o Congelamento da União
Embora as negociações preliminares previssem uma divisão equitativa da governança (meio a meio), o desenho da futura operação sinalizava que a Azul ficaria com uma parcela majoritária, enquanto a Gol detería aproximadamente 10% das ações. Este cenário, no entanto, sofreu uma reviravolta fundamental no final de maio. Foi nesse período que a Gol Linhas Aéreas concluiu com sucesso seu processo de recuperação judicial nos EUA. Quase que imediatamente, a Azul Linhas Aéreas seguiu um caminho oposto, comunicando sua própria adesão ao Chapter 11.
Segundo a análise de agentes do mercado de aviação, o momento da entrada da Azul na recuperação judicial foi decisivo. A companhia aérea teria explicitado à Abra sua nova prioridade: o foco absoluto em seu próprio processo de reestruturação, sinalizando um afastamento da mesa de negociações sobre a fusão. A Azul também escolheu uma estratégia considerada mais arrojada, diferindo da maioria das companhias aéreas que, após entrarem em recuperação nos EUA, recorrem ao mercado para levantar capital.
Prioridade na Recuperação e Conflitos de Interesse
A abordagem da Azul incluiu a garantia de um financiamento robusto, totalizando US$ 1,6 bilhão (equivalente a aproximadamente R$ 5,3 bilhões) obtidos diretamente com seus credores. Além disso, foram garantidos aportes de US$ 300 milhões (cerca de R$ 1,6 bilhão) provenientes da United Airlines e da American Airlines. O fato de a American Airlines ser uma parceira estratégica de longa data da Gol Linhas Aéreas, injetando capital na rival Azul, teria provocado um certo nível de tensão e desconforto nos bastidores das relações corporativas.
Os mais recentes balanços financeiros de ambas as empresas oferecem uma perspectiva clara dos desafios individuais enfrentados nesta fase de suas operações. No segundo trimestre do ano corrente, a Gol Linhas Aéreas registrou um prejuízo líquido de R$ 1,5 bilhão. Embora ainda representasse uma cifra elevada, esse valor denotava uma melhora de 60% se comparado ao prejuízo contabilizado no mesmo período de 2024. Já a Azul Linhas Aéreas reportou um lucro líquido de R$ 1,2 bilhão, revertendo o prejuízo de R$ 3,5 bilhões registrado no período anterior, demonstrando os primeiros sinais de recuperação de sua própria reestruturação.
O Codeshare Mal-Sucedido e a Intervenção do CADE
Antes de tornar pública a informação sobre o cancelamento do memorando de entendimentos e, consequentemente, do acordo de codeshare (compartilhamento de voos) que existia entre as duas empresas, a Abra fez questão de notificar previamente a Azul sobre sua movimentação no mercado. Apesar do comunicado da Abra ter um tom que alguns analistas interpretaram como “belicoso”, ambas as partes asseguram que o desfecho se deu de forma amigável, sem qualquer conflito direto. Cada companhia, em particular, optou por dedicar seus esforços à concentração em seus respectivos modelos de negócio.

Imagem: www1.folha.uol.com.br
Ainda assim, existe uma leitura disseminada no setor aéreo de que a Abra teria emitido um comunicado carregado de certa “emoção”, algo que, na avaliação dos especialistas, não seria estritamente necessário dada a realidade das negociações nos meses precedentes. Um executivo com conhecimento das tratativas revelou que a Gol Linhas Aéreas, enquanto operadora, não se envolveu diretamente nas discussões de fusão, as quais foram conduzidas de maneira exclusiva entre a Abra e a Azul. Esta distinção é considerada benéfica, pois permite que a Abra atue com maior autonomia estratégica, enquanto a Gol permanece integralmente focada nas operações de aviação. Para mais detalhes sobre o panorama econômico das empresas brasileiras, veja esta análise do Valor Econômico sobre o setor de aviação civil.
Quanto ao acordo de codeshare entre Gol e Azul, ele não alcançou os resultados esperados. Originalmente, a parceria se concentrava em rotas complementares, com cada empresa preenchendo as lacunas geográficas da outra onde tivesse maior presença. Contudo, os comentários do mercado indicam que o compartilhamento foi “muito pequeno” ou “praticamente nulo”. As empresas, de início, optaram por não submeter as rotas ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), baseando-se no entendimento de que, por se tratar de um acordo de menor escala, a intervenção do órgão não seria mandatória.
No entanto, no começo de setembro, o Cade formalizou uma reclamação e exigiu a apresentação das rotas que estavam sendo compartilhadas. Dada a ineficácia da parceria e a subsequente pressão do Conselho, Gol e Azul chegaram a um acordo mútuo para encerrar também o codeshare. O mercado financeiro reagiu positivamente à notícia do fim das negociações na sexta-feira, 26 de setembro. As ações da Azul Linhas Aéreas registraram alta de 17,1%, sendo negociadas a R$ 1,23, enquanto as da Gol Linhas Aéreas fecharam o dia com um crescimento de 5,3%, atingindo R$ 5,95.
Confira também: artigo especial sobre leis e valortrabalhista
O encerramento do acordo de fusão e do codeshare sinaliza um novo capítulo para as companhias Gol e Azul, cada uma agora mais focada em suas estratégias individuais de recuperação e crescimento. Este desfecho reorienta a dinâmica competitiva do setor aéreo nacional. Para acompanhar outras notícias importantes do cenário econômico e corporativo, continue explorando nossa editoria de Economia.
Crédito da imagem: Ricardo Moraes -21.jan.25/Reuters
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