O ex-auditor fiscal Arnaldo Augusto Pereira, condenado em 2019 por participação na chamada máfia do ISS na Prefeitura de São Paulo, admitiu ter desembolsado R$ 45 mil para obter um atestado de óbito falso. A manobra, segundo ele, tinha como objetivo escapar da iminente condenação definitiva e evitar a prisão, configurando uma estratégia de fuga diante da Justiça.
Pereira, que atuou como subsecretário da Receita Municipal de São Paulo, utilizou esse estratagema de desespero para forjar sua própria morte. Ele foi um dos nomes centrais no esquema de fraudes e desvios que movimentou centenas de milhões de reais na capital paulista, e a emissão do documento fraudulento se deu por meio de pagamento em dinheiro a um intermediário.
Ex-Auditor paga R$ 45 mil por atestado de óbito falso em SP
Para conseguir o atestado de óbito fraudulento, o ex-auditor fiscal Arnaldo Augusto Pereira, já conhecido por seu envolvimento na máfia do ISS, realizou uma jornada de aproximadamente 13 horas. Ele viajou de Mucuri até Salvador, na Bahia, especificamente para se encontrar com uma pessoa que, em suas próprias palavras, “vende esse tipo de documento”. Esse atestado, uma vez emitido por um cartório, foi supostamente utilizado para criar um e-mail na conta de sua esposa, que permanecia alheia à farsa da morte do marido.
Em depoimento concedido à uma entrevista televisiva, Pereira descreveu a aquisição do documento como uma “atitude de desespero”. Ele confessou que o objetivo primordial era não ser condenado em definitivo, um cenário que o levaria à prisão. “Quando você toma uma atitude de desespero, você não consegue pensar racionalmente”, justificou o ex-subsecretário, reiterando a intenção de evadir-se das consequências legais.
Antes de forjar seu falecimento, Pereira havia sido acusado pelo Ministério Público de São Paulo (MP-SP) de ter liderado o grandioso esquema de fraudes de desvios enquanto ocupava o cargo de subsecretário de arrecadação da cidade. Segundo as investigações, ele teria recebido propina de R$ 1,1 milhão para, supostamente, liberar a construção de um empreendimento residencial em Santo André, revelando a extensão de sua participação nas práticas ilícitas.
A farsa do ex-auditor teve fim na Bahia, onde Arnaldo Augusto Pereira foi detido na quarta-feira. Ele havia sido condenado a uma pena de 18 anos de prisão, imposta em 2019, pela sua ativa participação na notória Máfia do ISS. Este esquema criminoso é responsável pelo desvio de mais de R$ 500 milhões dos cofres da prefeitura paulista, operando fraudulentamente entre os anos de 2007 e 2013, e representando um dos maiores escândalos de corrupção envolvendo a arrecadação municipal.
Questionado sobre seu envolvimento e o recebimento dos valores, o condenado Pereira afirmou não sentir vergonha de admitir que embolsou R$ 1,1 milhão no esquema de propinas. Ele se declarou “constrangido” com a situação, mas ressaltou que seria “muito mais constrangedor negar” sua participação. Essa declaração reflete uma tentativa de aceitação de sua conduta, ainda que em meio a um contexto de flagrante ilegalidade.
A confecção do documento fraudulento não contou com a plena ciência ou participação do oficial do cartório. Este, ao ser questionado, alegou que a documentação apresentada pelo hospital, referente ao óbito, parecia perfeitamente legal. “Não é da nossa alçada questionar a declaração de óbito que chega do hospital”, defendeu-se o tabelião, indicando que a fraude se originou em uma etapa anterior ao registro oficial.
O médico que endossou a certidão, Sérgio Ricardo, cujo vínculo profissional era com o Instituto Médico Legal (IML) de Salvador, também se pronunciou através de sua defesa. Conforme os advogados de Ricardo, o médico não possuía qualquer conhecimento prévio de Arnaldo Pereira e, crucialmente, assinou o documento remotamente. Sua decisão se baseou em um vídeo e um relatório médico que lhe foram enviados, conduta esta considerada manifestamente ilegal e questionável em termos éticos e profissionais.
Diante da complexidade do caso e das recentes revelações, os advogados que originalmente defendiam o ex-auditor optaram por abandonar sua representação legal. A decisão se deu pela percepção de que foram enganados por seu então cliente. Com a saída da equipe jurídica anterior, o advogado Eduardo Maurício assumiu a defesa de Arnaldo Pereira, indicando que aguardará o julgamento do processo pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Para mais informações sobre o papel do judiciário em casos de grande repercussão, é útil consultar a página oficial do Superior Tribunal de Justiça.
A localização e prisão de Arnaldo Augusto Pereira ocorreram em Mucuri, no sul da Bahia. Conforme apurado pelo Ministério Público da Bahia, Pereira vivia “sob identidade possivelmente falsa após ter forjado a própria morte”. A prisão preventiva do ex-auditor foi solicitada pelo MP-SP depois de detectar a apresentação da certidão de óbito falsa nos autos do processo e após o término do sequestro de bens em favor da família de Pereira, elementos que indicavam sua intenção de permanecer em fuga.
Esta não é a primeira vez que Arnaldo Augusto Pereira tem problemas com a Justiça. Ele já havia sido detido em operações anteriores, nos anos de 2019 e 2021, e foi condenado por crimes de corrupção. Além disso, Pereira confessou ter mentido durante o acordo de delação premiada que firmou com o MPSP, complicando ainda mais sua situação legal e evidenciando um histórico de condutas desonestas. As penas resultantes de todas as suas condenações ultrapassam os 45 anos de prisão.
No intrincado esquema da Máfia do ISS, o grupo criminoso orquestrava a cobrança de propinas para acelerar a liberação de empreendimentos imobiliários de médio e alto padrão na capital paulista, atividade que perdurou entre 2009 e 2011. Estima-se que cerca de 410 empreendimentos, abrangendo desde construtoras e shoppings até hospitais, foram beneficiados por esta vasta fraude. A quitação do Imposto Sobre Serviços (ISS) é um requisito indispensável para que o empreendedor obtenha o “Habite-se”, o que, por sua vez, permite a ocupação legal do imóvel. A ausência desse certificado trava a operação de qualquer nova edificação.
Para viabilizar a construção de edifícios, as incorporadoras e construtoras geralmente utilizam um modelo de organização jurídica denominado Sociedade de Propósito Específico (SPE). Uma única empresa ou incorporadora pode estabelecer múltiplas SPEs para gerenciar seus diversos projetos. Próximo ao estágio de conclusão da obra, torna-se obrigatória a arrecadação do ISS e a subsequente obtenção da certidão de quitação do imposto, um passo crítico no processo burocrático de licenciamento.
No modus operandi do esquema, os auditores envolvidos emitiam guias de recolhimento do ISS com valores fraudulentamente inferiores ao que era legalmente exigido. Simultaneamente, demandavam que altas somas fossem depositadas em suas contas bancárias pessoais ou nas contas de empresas controladas por eles. Sem esse “pagamento” informal em suas contas, os certificados de quitação do ISS eram retidos e, como consequência direta, os empreendimentos não obtinham a liberação necessária para ocupação, gerando um ciclo vicioso de extorsão e corrupção que lesou os cofres públicos e distorceu o mercado imobiliário paulista.
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O caso do ex-auditor Arnaldo Augusto Pereira destaca a persistência e a audácia da corrupção em setores estratégicos da administração pública. Sua tentativa de forjar a própria morte demonstra um nível extremo de desespero para fugir das consequências de suas ações. Este incidente reitera a necessidade de constante vigilância e aprimoramento dos mecanismos de combate à corrupção e à impunidade no Brasil. Para mais análises aprofundadas sobre política e casos de má conduta administrativa, convidamos você a continuar navegando em nossa editoria de Política.
Imagem: Reprodução/TV Globo


