No domingo, 26 de outubro, a Argentina se prepara para importantes eleições legislativas Argentina, que não apenas determinarão a nova composição de seu parlamento, mas também servirão como um crucial teste para o futuro do governo de Javier Milei. Há menos de dois meses, a expectativa era de uma vitória contundente para A Liberdade Avança, o partido do presidente, pintando o Congresso de violeta, a cor que simboliza seu movimento. Contudo, essa previsão de um triunfo avassalador arrefeceu consideravelmente à medida que a data do pleito se aproximava.
Os eleitores argentinos retornam às urnas quase dois anos após terem confiado a presidência a Milei, em um momento decisivo para a governabilidade do país. Em jogo está a renovação de um terço do Senado, abrangendo 24 das 72 cadeiras totais, e a metade da Câmara dos Deputados, que corresponde a 127 dos 257 assentos existentes. Esta votação reflete diretamente o termômetro da gestão presidencial, sendo um referendo popular sobre suas políticas e sua capacidade de engajamento com o cenário político nacional.
Eleições na Argentina Renovam Congresso e Testam Milei
Desde sua ascensão em 2023, carregando o apelo de uma novidade política e prometendo audaciosas reformas para sanar a crise econômica, o mileísmo empreendeu esforços para criticar a classe política tradicional e reduzir a inflação. Apesar de alguns progressos no controle inflacionário, a percepção de apoio popular diminuiu em função da estagnação econômica, da escalada do desemprego e da desvalorização de salários e aposentadorias. Uma série de episódios controversos, como a promoção de um criptoativo desprovido de lastro pelo próprio Milei e as acusações envolvendo Karina Milei, irmã e principal assessora do presidente, em um suposto esquema de propinas para a compra de medicamentos — reveladas em áudios de um ex-diretor de uma agência para pessoas com deficiência —, também impactaram negativamente a imagem da Casa Rosada.
Taticamente, o governo de Javier Milei cometeu equívocos, subestimando a influência de governadores locais em disputas tidas como garantidas. Um exemplo notório é Córdoba, estado que elege nove deputados, onde os libertários enfrentam forte concorrência do ex-governador Juan Schiaretti. Da mesma forma, em Santa Fé, que também elegerá nove deputados, a disputa se dá com o atual governador, Maximiliano Pullaro, integrante do bloco opositor Províncias Unidas. No campo legislativo, a administração presidencial experimentou reveses sequenciais, culminando na percepção de uma perda de capacidade para implementar sua agenda no Congresso argentino.
Analistas políticos apresentam três possíveis cenários para o pleito deste domingo, considerando o total de votos em nível nacional. Um resultado considerado “consagrador” para Milei implicaria a conquista de 40% ou mais dos votos. Atingir 35% seria interpretado como um empate técnico, ao passo que qualquer índice próximo ou abaixo de 30% sinalizaria uma derrota preocupante para o presidente. O patamar de 40% carrega um simbolismo político significativo: nas eleições presidenciais, como as previstas para 2027, um candidato pode ser eleito em primeiro turno caso obtenha 40% dos votos e mantenha uma margem de dez pontos percentuais sobre o segundo colocado. Superar este limiar demonstraria a solidez da base de apoio de Milei e o fortaleceria para uma possível candidatura à reeleição.
Atualmente, o partido governista possui apenas 74 cadeiras na Câmara dos Deputados, o que representa menos de um terço do total, e apenas 13 no Senado, configurando menos de um quinto do corpo legislativo. Projeções da consultoria Directorio Legislativo indicam que, em um cenário de desempenho mediano para A Liberdade Avança, com aproximadamente 35% dos votos nacionais, o partido poderia ultrapassar um terço na Câmara e um quarto no Senado. A conquista de um terço das cadeiras da Câmara (totalizando 86 assentos) concederia ao governo uma quantidade mínima para evitar que eventuais vetos presidenciais fossem revertidos pelo parlamento. Mesmo assim, a aprovação de quaisquer reformas estruturais, como as tributárias, trabalhistas ou previdenciárias almejadas por Milei, continuaria demandando a formação de uma sólida aliança congressual.
Em alguns distritos, a posição de Milei é mais vantajosa. Na estratégica cidade de Buenos Aires, capital federal que elegerá três senadores e treze deputados, a Ministra da Segurança, Patricia Bullrich, apresenta-se como forte candidata ao Senado. Em Mendoza, com cinco deputados em disputa, a expectativa recai sobre a candidatura à Câmara do Ministro da Defesa, Luis Petri. Já em Salta, que elegerá três senadores e três deputados, a divisão do peronismo local abre espaço para um melhor desempenho do mileísmo. Contudo, para um entendimento mais amplo sobre os desafios econômicos da Argentina, um artigo no portal G1 detalha as recentes dificuldades do país, confira aqui.
O descontentamento de uma parcela significativa do eleitorado com a atual gestão de Javier Milei ficou patente em setembro, durante as eleições legislativas locais na província de Buenos Aires, a região mais populosa do país. Nessas eleições, o partido do presidente sofreu uma derrota expressiva, perdendo para o peronismo por mais de 13 pontos percentuais. Apesar da possibilidade de um desempenho um pouco melhor nesta nova rodada na província de Buenos Aires, que renova 35 vagas de deputado, o principal colégio eleitoral do país é considerado já “perdido” pelo governo. Esta província é comandada pelo peronista Axel Kicillof, atualmente o nome mais proeminente da oposição, e foi palco de um recente escândalo que, semanas atrás, desestruturou a candidatura de José Luis Espert, principal nome do mileísmo, que foi vinculado a um empresário sob investigação por narcotráfico.

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No espectro da oposição, o peronismo nacional, cujos principais expoentes estão no Partido Justicialista, liderado pela ex-presidente Cristina Kirchner, participa destas eleições através da coalizão Força Pátria. O grupo nutre chances concretas de consolidar sua influência em diversas províncias, incluindo Tucumán (quatro deputados em jogo), Formosa (dois deputados), La Pampa (três deputados), La Rioja (dois deputados) e Catamarca (três deputados). É importante ressaltar que, ao contrário da coalizão de Milei — que incorporou o PRO do ex-presidente Mauricio Macri e concorre com o mesmo nome em todas as províncias —, o peronismo se apresenta disperso, competindo em diferentes frentes locais, o que pode fragmentar o voto opositor.
A renovação parcial do Congresso argentino, tradicionalmente interpretada como uma avaliação da gestão presidencial na metade do mandato, ganhou este ano um elemento internacional inédito. Javier Milei, inclusive, chegou a pausar sua agenda de campanha pelas províncias para uma visita à Casa Branca, onde obteve o apoio do ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Tal respaldo foi materializado com a intervenção do Tesouro dos EUA para evitar uma crise cambial na Argentina, marcada pela disparada do dólar nas vésperas das eleições. No entanto, Trump foi criticado por avançar o sinal ao condicionar a assistência econômica ao resultado eleitoral, uma atitude que gerou descontentamento na opinião pública e inquietação nos mercados.
O governo de Javier Milei demonstra otimismo e projeta que o presidente emergirá fortalecido das urnas a partir de segunda-feira, 27 de outubro. Esse otimismo se baseia no argumento de que sua coalizão, que já conta com a participação do PRO (partido do ex-presidente Mauricio Macri), é a única a competir de maneira unificada e com a mesma identidade em todas as províncias argentinas. Em contrapartida, o peronismo se apresenta disperso, competindo em diferentes frentes locais, o que pode fragmentar o voto opositor.
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Em suma, as eleições legislativas argentinas deste domingo representam um divisor de águas para o governo de Javier Milei. Os resultados não só definirão a correlação de forças no Congresso, mas também sinalizarão o grau de aceitação das políticas de austeridade e o caminho para as próximas presidenciais em 2027. Para continuar acompanhando de perto os desdobramentos da política e economia global, incluindo o panorama latino-americano, mantenha-se informado em nossa editoria de Política.
Crédito da imagem: Cristina Sille/Reuters, Alessia Maccioni/Reuters



