Desmatamento da Cafeicultura Brasileira: 313 Mil Hectares Perdidos

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O desmatamento da cafeicultura brasileira foi responsável pela conversão direta de pelo menos 313 mil hectares de áreas florestais nos últimos 25 anos. Este montante, equivalente à área de duas cidades de São Paulo, é um dos resultados de um levantamento inédito da organização Coffee Watch, divulgado exclusivamente no Brasil pela Folha.

De acordo com a pesquisa, entre os anos de 2001 e 2023, a perda total de cobertura florestal dentro de propriedades cafeeiras brasileiras alcançou 737 mil hectares. Destes, os mencionados 313 mil hectares foram diretamente convertidos em novas áreas para o cultivo do café, destacando a pressão exercida pela expansão agrícola sobre ecossistemas naturais. A Coffee Watch aponta que a diminuição dessas áreas verdes compromete a qualidade do solo, eleva o risco de incêndios e altera o regime de chuvas em regiões produtoras de café, contribuindo, entre outros fatores, para a escalada dos preços do produto no mercado.

Desmatamento da Cafeicultura Brasileira: 313 Mil Hectares Perdidos

Para além do impacto direto, o estudo indica que mais de 11 milhões de hectares de florestas foram perdidos em municípios onde a produção de café está presente. Esta estatística engloba o desmatamento indireto, que se manifesta por meio da implementação de infraestrutura e do crescimento populacional nas adjacências das zonas cafeeiras. Em uma perspectiva mais ampla, dados do Mapbiomas, organização especializada em estudos de uso da terra com base em imagens de satélite, revelam que o Brasil perdeu 111,7 milhões de hectares de suas áreas naturais em quarenta anos, entre 1985 e 2024, considerando todos os propósitos de desmatamento.

A maior parte da devastação em fazendas de café está concentrada no Cerrado, com 77% dos registros, principalmente no estado de Minas Gerais. Os 20% restantes foram verificados no bioma da Mata Atlântica, indicando a vulnerabilidade desses ecossistemas frente ao avanço do agronegócio cafeeiro.

Contrariamente às descobertas da Coffee Watch, o Cecafé (Conselho dos Exportadores de Café do Brasil) defende que outras análises atestam que a cafeicultura nacional preserva matas nativas além dos limites exigidos pelo Código Florestal. O conselho ressalta que o estudo da Coffee Watch analisa o desmatamento em termos absolutos, sem considerar o enquadramento legal brasileiro. Adicionalmente, o Cecafé informa que 99% das 115.000 propriedades cafeeiras de Minas Gerais, registradas no Cadastro Ambiental Rural (CAR), não apresentaram desmatamento significativo após 2008. Além disso, aproximadamente um terço dessas propriedades possui uma quantidade de vegetação nativa superior ao determinado pelo Código Florestal, totalizando um excedente florestal de 302 mil hectares.

O relatório da Coffee Watch surge em um momento crucial, onde o setor cafeeiro brasileiro busca convencer os principais mercados consumidores globais, como Estados Unidos e Europa, sobre a sustentabilidade de sua produção. O objetivo é mitigar as barreiras comerciais, incluindo a rigorosa lei antidesmatamento da União Europeia. Essa legislação impede a importação de diversos produtos agrícolas, entre eles o café, que tenham origem em áreas desmatadas após dezembro de 2020. Recentemente, em 21 de maio, a Comissão Europeia propôs uma flexibilização da norma, mas manteve a data de início de aplicação para 30 de dezembro de 2025.

A pesquisa ainda aponta uma disparidade notável nos dados relativos à expansão da área cultivada de café no Brasil. Segundo a Produção Agrícola Municipal (PAM), do IBGE, a área colhida de café teve uma redução nas últimas décadas, caindo de aproximadamente 2,5 milhões de hectares em 1990 para cerca de 1,9 milhão em 2023. No entanto, os dados de satélites compilados pela Coffee Watch apresentam um cenário oposto, indicando que a área de cultivo cresceu mais de 105% no mesmo período, passando de 0,6 milhão para 1,23 milhão de hectares. A organização contesta as estatísticas oficiais, afirmando que são “baseadas em autorrelato, usando levantamentos feitos com metodologias inconstantes e dados de campo desatualizados”. Para mais informações sobre a evolução do desmatamento em biomas brasileiros, acesse os dados fornecidos pelo MapBiomas.

Os fundamentos metodológicos da Coffee Watch são embasados em dados provenientes do MapBiomas, do Hansen Global Forest Change – sistema desenvolvido pela Universidade de Maryland, nos EUA – e do SPAM (Spatial Production Allocation Model), uma ferramenta criada pelo IFPRI (International Food Policy Research Institute) e pelo IIASA (International Institute for Applied Systems Analysis).

Desmatamento da Cafeicultura Brasileira: 313 Mil Hectares Perdidos - Imagem do artigo original

Imagem: www1.folha.uol.com.br

A análise da organização também estabelece uma correlação direta entre o desmatamento e a instabilidade pluviométrica nas áreas de produção de café ao longo dos anos recentes. De acordo com informações do CHIRPS (Climate Hazards Group InfraRed Precipitation with Station data), anomalias climáticas em relação às chuvas têm sido persistentes nessas regiões desde 2014, particularmente nos meses cruciais para a floração e o amadurecimento dos frutos do cafeeiro.

Uma forte estiagem em 2014 resultou em perdas significativas na safra daquele ano. Subsequentemente, o relatório aponta que oito dos últimos dez anos registraram déficits pluviométricos. Consequentemente, as safras têm ficado abaixo das expectativas, impactando os estoques globais e contribuindo para o aumento contínuo dos preços do café, uma tendência observada há pelo menos dois anos no mercado internacional.

A seca e a aridez que se instauraram devido à escassez hídrica também agravam a ocorrência de incêndios florestais. O estudo da Coffee Watch afirma que “o cinturão cafeeiro do Brasil, principalmente no Cerrado e nas zonas de transição, é agora uma das regiões mais propensas a incêndios do país”, sublinhando a vulnerabilidade das lavouras de café e de seus entornos.

Diante do quadro, a Coffee Watch enfatiza a urgência de medidas que não apenas garantam o cumprimento dos acordos de desmatamento zero, mas que também promovam a recuperação das áreas já degradadas e a transição para modelos agroflorestais regenerativos. A organização, com sede nos Estados Unidos, é dedicada a investigar e reportar potenciais violações socioambientais na cadeia produtiva do café, com foco na transparência e sustentabilidade do setor.

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Este levantamento reforça a complexidade dos desafios ambientais enfrentados pela cafeicultura no Brasil, um dos maiores produtores globais. Para mais insights sobre o cenário econômico e as dinâmicas do agronegócio brasileiro, continue acompanhando as notícias em nossa editoria de Economia.

Crédito da imagem: David Lucena/Folhapress

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