Desafios do Conteúdo Nacional no Streaming sob Nova Lei

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O futuro da produção nacional no streaming está no centro do debate com a recente inserção do projeto de lei que visa taxar as plataformas de vídeo sob demanda na pauta do Congresso Nacional. A proposta, agendada para votação na próxima semana, promete direcionar mais recursos para o desenvolvimento de filmes e séries brasileiros independentes, na esperança de expandir o acesso do público a conteúdos nacionais. Contudo, especialistas levantam questionamentos cruciais sobre se a simples alocação de verbas será suficiente para garantir a visibilidade e a soberania cultural da produção brasileira.

Uma das principais preocupações manifestadas por observadores do setor audiovisual diz respeito a uma lacuna percebida no projeto de lei, especificamente a falta de mecanismos que simulem a função dos “canais superbrasileiros” já existentes na televisão por assinatura. Com a contínua expansão do streaming e o declínio da TV paga, o cenário para canais tradicionalmente focados em produções nacionais, como o Curta! e o Canal Brasil, torna-se cada vez mais incerto, ressaltando um dilema na estratégia de distribuição.

Desafios do Conteúdo Nacional no Streaming sob Nova Lei

Esses canais fazem parte da categoria dos Cabeqs – Canais Brasileiros de Espaço Qualificado –, que possuem a exigência de destinar até doze horas diárias à exibição de conteúdo produzido no Brasil. Outros exemplos incluem Arte1, Modo Viagem, Off, Prime Box Brazil, TV Rá Tim Bum! e Bis, cada um com suas próprias cotas. Rumores nos corredores do Congresso sugerem que o projeto de lei sobre o streaming pode não incorporar provisões análogas às dos Cabeqs, focando mais em cotas de catálogo, o que para alguns, seria insuficiente para promover efetivamente a produção independente. A situação se agrava para veículos que não contam com o apoio de grandes grupos, como o Canal Brasil, que tem a Globosat como parceira.

Julio Worcman, diretor do Curta!, expressa forte preocupação com a delegação da curadoria a empresas estrangeiras. “É uma ideia maluca dizer que os grandes streamings vão dar conta de exibir o conteúdo brasileiro. Se você deixar a curadoria na mão de plataformas estrangeiras, o povo brasileiro só vai assistir às vozes selecionadas por essas curadorias gringas. É uma questão de soberania”, argumentou Worcman, sublinhando a importância da autodeterminação cultural no audiovisual.

Questionado sobre a inclusão de mecanismos para garantir a presença do conteúdo nacional nos territórios do vídeo sob demanda, semelhantes aos Cabeqs, o relator do projeto de lei, Doutor Luizinho (PP-RJ), limitou-se a informar que “Se for canal público, educativo ou religioso, não vai ter alíquota de streaming.”

A Distorção na Vantagem e a Crise da Distribuição

Para André Saddy, diretor-geral do Canal Brasil, a legislação proposta corre o risco de desfavorecer as produções nacionais independentes, ao conceder maior vantagem às gigantes plataformas de vídeo sob demanda. Saddy relembra a importância da Lei do SeAC (Lei 12.485/2011), um marco regulatório da TV por assinatura de 2011, que impôs aos provedores a obrigatoriedade de incluir uma cota mínima de Cabeqs em seus pacotes. “Na época havia muita clareza de que não adianta olhar só para a produção sem ter onde exibir ou só para a exibição e não ter nada para exibir”, diz Saddy, evidenciando a visão holística que, em sua análise, o novo projeto de lei para o streaming parece negligenciar.

O cerne da questão reside na distribuição, apontada por especialistas como um dos principais desafios do audiovisual brasileiro. Embora o projeto de lei proponha a cobrança de uma contribuição sobre o faturamento bruto das plataformas, a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine), até 70% desse montante pode ser deduzido para que as próprias plataformas produzam filmes e séries, ou para licenciem títulos nacionais, integrando-os aos seus catálogos. A expectativa é que isso impulsione a produção nacional independente, mas o risco é que tais produções precisem se adequar aos critérios e gostos das grandes plataformas para garantir visibilidade, resultando em parte do conteúdo sem público.

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Imagem: www1.folha.uol.com.br

Sobre a audiência dos canais dedicados ao conteúdo brasileiro, dados da Claro, que representa 53,7% do mercado de TV por assinatura no país, revelam que Canal Brasil, Curta! e Prime Box Brazil somaram uma média de 3,26 milhões de horas assistidas por mês entre janeiro e outubro do ano passado. No mesmo período, o Modo Viagem registrou cerca de 8 milhões de horas mensais, e o Off, 2 milhões de horas. Embora menores que os 20 milhões de horas do Globoplay Novelas, campeão de audiência da TV a cabo, esses números não são desprezíveis, considerando que se tratam de canais de nicho, sem o apelo comercial de novelas.

Streaming: o Retorno da Lógica dos Pacotes?

A pergunta de Julio Worcman é se a lógica dos canais se encaixa no ambiente do streaming. Para ele, sim. O diretor do Curta! aponta que o vídeo sob demanda, após inicialmente desorganizar o panorama da TV paga com a flexibilidade de catálogos avulsos e sem grade fixa, parece estar fechando um ciclo. As plataformas, outrora símbolos da liberdade de escolha, agora tendem a absorver a estratégia de empacotamento. Casos como o do Prime Video, que atua como agregador de outros catálogos (Mubi, Telecine, Apple TV+), exemplificam essa tendência. Além disso, surgem pacotes de plataformas associados a planos de telefonia ou internet.

Diante desse cenário, Worcman sugere que seria coerente exigir que esses pacotes e agregadores de streaming ofertem catálogos com conteúdo predominantemente nacional e independente. Essa medida garantiria que, assim como na TV a cabo, onde a presença dos Cabeqs era obrigatória nos pacotes, o conteúdo brasileiro tenha seu espaço garantido e valorizado no ambiente digital. Para mais detalhes sobre as implicações legais, consulte a Lei do SeAC (Lei 12.485/2011).

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Em suma, a nova legislação de streaming tem o potencial de impulsionar a indústria audiovisual brasileira, mas também levanta debates sobre a efetividade da distribuição e a preservação da identidade cultural no conteúdo nacional. A questão não é apenas alocar recursos, mas assegurar que o público brasileiro possa acessar e consumir o rico universo de filmes e séries produzidos em seu próprio país. Continue acompanhando nossa editoria de Análises para entender os desdobramentos dessa importante discussão.

Crédito da imagem: Reprodução/Curta!

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