O cenário de cortes de juros, as eleições vindouras e a influência de Donald Trump constituem fatores determinantes que, segundo especialistas, continuarão a moldar a volatilidade dos mercados globais e nacionais. Embora o Real tenha registrado uma valorização robusta de quase 14% este ano, e o Ibovespa tenha atingido recordes sucessivos na bolsa brasileira, as incertezas macroeconômicas persistem, indicando um panorama de atenção redobrada nos próximos meses.
De acordo com análises de profissionais do setor, aspectos como o dinamismo da atividade econômica, as condições do mercado de trabalho tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, a trajetória da inflação e as políticas monetárias dos bancos centrais, somados ao ambiente político doméstico e internacional, serão elementos-chave a serem monitorados. Estes fatores compõem a complexa teia que deverá guiar as decisões de investidores e analistas no horizonte imediato.
Cortes de Juros, Eleições e Trump: Entenda a Agitação do Mercado
As avaliações do mercado indicam que o panorama fiscal brasileiro permanece como uma fonte de apreensão, prometendo intensificar-se nos meses que antecedem 2026, marcando o início de um período eleitoral caracterizado por potenciais turbulências. Conforme especialistas, as incertezas derivam de possíveis ajustes em programas de transferência de renda e questionamentos acerca da formatação do Orçamento público para o ano de 2026.
Cenário Fiscal e Economia Brasileira
A pauta fiscal está projetada para assumir um protagonismo ainda maior nas análises do mercado, dado o início da discussão sobre o Orçamento de 2026 neste segundo semestre. Este ano se mostra politicamente sensível. Álvaro Frasson, macro estrategista do BTG Pactual Portfolio Solutions, observa: “Será que teremos reajuste do Bolsa Família, por exemplo? Ou será que o governo vai avançar e conseguir monitorar o fiscal como deveria?”. Estas indagações ressaltam a ambiguidade que cerca o planejamento econômico e a sua interação com o ciclo político.
Atenção nos Estados Unidos
No cenário internacional, especialistas reiteram a necessidade de vigilância, sobretudo em relação aos Estados Unidos. Além das políticas tarifárias adotadas pelo ex-presidente Donald Trump contra parceiros comerciais relevantes, investidores acompanham com atenção as possíveis interferências governamentais na independência do Federal Reserve (Fed), o banco central norte-americano. Esses elementos se somam para criar um quadro de cautela no ambiente externo.
O Impacto do Tarifaço de Trump
Referente às tarifas, a Suprema Corte dos EUA decidiu revisar a constitucionalidade do “tarifaço” implementado por Trump. A medida veio após um recurso apresentado pelo Departamento de Justiça, que contestou uma decisão de um tribunal de apelações tomada no final de agosto. Na ocasião, o tribunal havia concluído que grande parte das tarifas aplicadas pelo ex-presidente carecia de embasamento legal, argumentando que Trump extrapolou sua autoridade ao instituir as taxas sob uma lei federal originalmente concebida para situações de emergência. A questão mantém investidores e nações em suspense sobre os efeitos de curto e longo prazo nas trocas globais. O processo judicial avançou rapidamente, com os primeiros debates orais previstos para a primeira semana de novembro, menos de sete dias após a solicitação de revisão por parte do governo.
Exportações Brasileiras e Tarifaço
Para o Brasil, o decreto assinado pelo republicano em julho impunha uma taxação de 50% sobre importações, contudo, diversas categorias de produtos foram excluídas. Mário Mesquita, economista-chefe do Itaú Unibanco, destacou que essa lista de isenções se mostrou bastante benéfica, resultando em uma tarifa média efetiva de 30% em vez dos 50% iniciais. Mesquita complementou, em um encontro com jornalistas em agosto, que o “impacto direto das tarifas de Trump no PIB do país ainda seja muito limitado, algo em torno de 0,1%. O impacto inflacionário também é desprezível.” A economista Julia Gottlieb acrescentou a perspectiva de que o Brasil tem a capacidade de realocar parte de suas exportações para outros mercados, mitigando assim os efeitos mais adversos do regime tarifário. “Se aplicarmos esses 30% sobre o total exportado para os EUA, o impacto poderia chegar a cerca de US$ 13 bilhões. Mas é razoável supor que haverá algum redirecionamento comercial, especialmente no setor de commodities”, ela ponderou, completando que, devido à diversificação dos destinos de exportação, o impacto tende a ser menos severo.

Imagem: g1.globo.com
A Independência do Federal Reserve
No que diz respeito ao Federal Reserve (Fed), apesar de a legislação norte-americana impedir o presidente de destituir membros do banco central sem comprovada má conduta, ações recentes de Donald Trump reacenderam as preocupações no mercado sobre sua autonomia. O caso mais recente envolveu Lisa Cook, diretora do Fed, alvo de um pedido de afastamento por parte do republicano. Uma decisão judicial inicial proibiu temporariamente Trump de efetivar a demissão, porém, o governo recorreu, buscando a exclusão de Cook antes de uma reunião crucial do Fed sobre política monetária. Esse episódio, sem precedentes na história do Federal Reserve, foi interpretado como uma escalada nos ataques do republicano à independência da instituição, em linha com suas tentativas contínuas, por meses, de influenciar o Fed a reduzir as taxas de juros do país. Trump alegou fraude hipotecária por parte de Cook, que supostamente teria declarado duas residências como principais para obter financiamento com condições mais vantajosas. A defesa da independência do banco central americano é um pilar crucial da estabilidade econômica, conforme delineado, por exemplo, nas publicações oficiais da instituição.
O Recente Corte de Juros e Projeções
No corrente mês, o Federal Reserve implementou uma redução nas taxas de juros dos EUA, cortando 0,25 ponto percentual, fixando-as na faixa entre 4% e 4,25% ao ano. Essa foi a primeira redução nas taxas de juros norte-americanas em nove meses. Segundo Mesquita, do Itaú, mesmo com a recente desaceleração observada no relatório de emprego (payroll), a economia dos Estados Unidos demonstra resiliência, e ainda é suscetível a impactos inflacionários provenientes das tarifas. “A dúvida é sobre a duração do ciclo. Ainda assim, não deve cortar os juros tanto quanto o mercado espera, porque a economia segue forte e o nível de emprego continua elevado”, pontuou o economista. As projeções do Itaú indicam um total de três cortes de juros pelo Fed ao longo deste ano, embora Mesquita acredite que o ciclo de flexibilização será “relativamente curto”. Embora uma redução dos juros nos EUA possa ser benéfica para o Brasil, potencializando o Real frente ao Dólar e atraindo capitais estrangeiros, os sinais de intromissão de Trump nas decisões do Fed continuam a gerar apreensão. Caso Trump consiga influenciar cortes de juros mais acentuados nos EUA sem embasamento técnico, os níveis de incerteza no mercado tendem a elevar-se, resultando em maior volatilidade e um provável decréscimo nos investimentos globais. Acompanhar a atuação de bancos centrais é essencial para entender as políticas monetárias globais.
Perspectivas Futuras para Ativos Nacionais
Apesar dos múltiplos alertas emitidos pelos especialistas consultados, o cenário apresenta elementos que podem impulsionar os ativos brasileiros. A redução das expectativas inflacionárias, por exemplo, surge como um fator de fôlego. Nos últimos meses, economistas e analistas têm ajustado para baixo as projeções de inflação para 2025, impulsionados pela valorização do Real e por indicadores de uma moderação na atividade econômica doméstica. Mário Mesquita salienta que, embora o início do ano tenha sido marcado por um forte crescimento, impulsionado pelo agronegócio, este ritmo já demonstra sinais de desaceleração. Dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil cresceu 0,4% no segundo trimestre deste ano. Este resultado, apesar de positivo, representa uma significativa desaceleração em comparação com o trimestre anterior (+1,3%) e reflete o impacto de taxas de juros elevadas. A incógnita reside no momento em que os efeitos da política monetária se farão sentir no mercado de trabalho. “A desaceleração da atividade vem primeiro, e só depois afeta o mercado de trabalho. Ainda vemos um mercado aquecido, com desemprego em níveis baixos e massa salarial elevada. Isso sustenta o consumo e reduz o risco de uma recessão mais profunda ou de uma freada brusca na economia”, elucidou Mesquita. Este panorama, combinado com o fortalecimento do Real, sugere, para os especialistas, que o Banco Central brasileiro pode ter margem para iniciar um ciclo de cortes na taxa de juros. Frasson, do BTG, complementa que o Banco Central aguarda leituras consistentes que apontem para um mercado de trabalho menos aquecido antes de considerar a flexibilização da política monetária, seja no final deste ano ou no início do próximo.
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A interação complexa entre política monetária global, disputas comerciais e a instabilidade política nos EUA, ao lado das questões fiscais e econômicas brasileiras, configuram um cenário de grande volatilidade. Permanecer informado sobre os desdobramentos desses fatores é crucial para compreender a direção dos investimentos e do crescimento. Continue acompanhando a seção de Economia de Hora de Começar para análises aprofundadas sobre esses temas.
Crédito da imagem: Reuters/Brendan McDermid
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