Os últimos corpos de pessoas assassinadas na Operação Contenção, conduzida pelo governo do Estado do Rio de Janeiro, começam a ser liberados do Instituto Médico Legal (IML), localizado no centro da capital fluminense. A operação, realizada no início desta semana, impactou diretamente os Complexos da Penha e do Alemão, situados na zona norte da cidade. Até a data de 31 de outubro, a Polícia Civil havia informado que apenas oito corpos ainda necessitavam de identificação final, o que sinaliza o encerramento gradual de uma dolorosa fase para diversas famílias.
Familiares das vítimas relatam um sentimento agridoce. Por um lado, há o alívio pelo término da angustiante jornada em busca de seus entes queridos – filhos, primos e netos –, um processo que por vezes se estendeu por dias de procura. Por outro lado, persiste a profunda indignação e o luto perante a tragédia humanitária desencadeada pela ação policial. O custo humano e social das operações de segurança no Rio de Janeiro é mais uma vez questionado pela comunidade afetada.
Operação Contenção: Últimos Corpos Deixam IML do Rio
Entre as histórias de sofrimento, destaca-se o caso de Karine Beatriz, de 26 anos, que, grávida de poucos meses, esteve no IML para reconhecer o corpo de seu esposo, Wagner Nunes Santana, pai de seu futuro filho. A busca por Wagner durou três dias e se deu na mata, onde ele foi finalmente localizado em um lago na Serra da Misericórdia, na Penha, na última sexta-feira. Em seu depoimento emocionado, Karine expressou que o verdadeiro alívio só virá com respostas às indagações sobre a letalidade das operações. Ela questionou a lógica de “pena de morte” em um cenário onde existe um sistema prisional, e apontou para o impacto psicológico na comunidade: “Temos crianças assustadas, uma comunidade abalada, é muita dor”, desabafou Karine, refletindo o desespero de muitos residentes.
A esposa de Wagner enfatizou o caráter familiar e trabalhador de seu companheiro. Karine defendeu que, apesar de quaisquer falhas que ele pudesse ter tido, Wagner era uma figura paterna dedicada, responsável pelo sustento da família e pelo cuidado dos entes próximos. “Independente dos erros dele, ele era trabalhador, era família”, relatou. Ela descreveu atos recentes de seu esposo, como ajudar a erguer uma casa na comunidade e fazer o “cabelo maluco” de sua filha de 9 anos, que não era filha biológica dele, além de levá-la para brincar. “São momentos que não vão voltar”, lamentou, evidenciando a interrupção abrupta da vida familiar e o vácuo deixado pela perda.
De acordo com Karine, o corpo de Wagner foi retirado do lago com um tiro na testa, contudo, a polícia não forneceu esclarecimentos detalhados sobre as circunstâncias de seu falecimento. Karine afirmou ter estado nas áreas de busca desde o início da operação e chegou a denunciar publicamente casos de execuções durante a ação policial. “Eles não vieram prender ninguém, eles foram para matar. É até mesmo quem se entregou, eles mataram. Eu procurei, desde o primeiro dia, eu procurei um por um. Não sei o que fizeram, mas enterro vai ter de ser caixão fechado”, relatou, transmitindo uma grave acusação sobre a conduta das forças de segurança.
Balanço e Justificativas da Operação
Um balanço atualizado da Operação Contenção, divulgado na última sexta-feira, apontou que 99 indivíduos já haviam sido identificados pelo IML até aquela data. Destes, 42 possuíam mandados de prisão pendentes, e um total de 78 tinha algum tipo de envolvimento criminal. As investigações revelaram também a origem de alguns dos mortos: 13 deles eram provenientes de outros estados, como Pará, Bahia, Amazonas, Ceará, Paraíba e Espírito Santo, indicando uma possível articulação interestadual no cenário do crime organizado.

Imagem: agenciabrasil.ebc.com.br
A justificativa apresentada pelo governo do Estado para a Operação Contenção era frear a expansão do Comando Vermelho, uma das principais facções criminosas que atuam no Rio de Janeiro. Segundo nota enviada à imprensa, as apurações indicavam que integrantes do grupo estavam recebendo instruções aprofundadas em manuseio de armamentos, técnicas de tiro, uso de explosivos e táticas de combate nas áreas visadas pela ação policial. Essas localidades, Complexo da Penha e Alemão, eram consideradas polos de abastecimento e distribuição de drogas e armas para outras comunidades sob o domínio da mesma organização criminosa. A movimentação financeira do tráfico nestas áreas era estimada em cerca de 10 toneladas de drogas por mês, sublinhando a escala da atividade ilícita.
Apesar da robustez da operação, foram levantados questionamentos sobre sua eficácia e o custo social e econômico para a cidade do Rio de Janeiro. A capital, por exemplo, ficou paralisada em parte durante a terça-feira de atuação. Além disso, a operação não conseguiu prender os principais chefes da facção criminosa e, segundo críticos, falhou em retomar o controle efetivo do território pelo Estado, enquanto a alta letalidade se tornou um ponto central de discórdia. Contudo, o governador Cláudio Castro defendeu firmemente a iniciativa. “Tendo em vista estes resultados, a gente vê que o trabalho de investigação e inteligência foi adequado, todos perigosos e com ficha criminal”, declarou o governador Castro em nota oficial na última quarta-feira. Ele também enfatizou a relevância da integração com outros estados devido à identificação de origens diversas dos indivíduos, que chamou de “narcoterroristas”, e prometeu a entrega de relatórios completos às autoridades competentes.
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A liberação dos últimos corpos marca um capítulo final para as famílias que buscavam por seus entes após a intensa Operação Contenção, revelando não apenas a extensão da ação policial, mas também as cicatrizes deixadas na comunidade carioca. A busca por justiça, aliada ao debate sobre a eficácia e humanidade das operações de segurança pública, permanece como um desafio constante. Para aprofundar a compreensão sobre os temas de segurança pública no estado e análises de operações similares, explore mais artigos em nossa seção de Política e Segurança Pública da Agência Brasil, uma fonte respeitada no jornalismo nacional.
Crédito da imagem: Joédson Alves/Agência Brasil

