Nesta sexta-feira, 17 de dezembro, o coronel do Exército de Madagascar, Michaël Randrianirina, foi empossado como presidente do país. A cerimônia oficial aconteceu na Alta Corte Constitucional, localizada em Antananarivo, capital malgaxe. A posse de Randrianirina surge em um contexto de intensa instabilidade política, dias após as Forças Armadas do país assumirem o poder em meio a uma série de protestos populares e ao impeachment do ex-presidente Andry Rajoelina, que se encontra foragido no exterior.
A nomeação do coronel Michaël Randrianirina para o cargo de chefia do Estado é um desdobramento direto da crise política que se intensificou em Madagascar. Os acontecimentos recentes culminaram com a destituição de Rajoelina, que havia enfrentado semanas de manifestações e rebeliões de unidades militares. A notícia da posse foi inicialmente divulgada pela Agence France-Presse (AFP), ressaltando a rapidez com que a transição de poder foi oficializada.
Coronel Michaël Randrianirina Empossado Presidente em Madagascar
A crise que levou à posse de Randrianirina teve seu ponto de inflexão quando o ex-presidente Andry Rajoelina foi alvo de um processo de impeachment por parte dos parlamentares malgaxes, pouco após ter deixado o território nacional no último fim de semana. Rajoelina condenou publicamente a intervenção militar e expressou sua recusa em renunciar ao cargo, posicionamento que intensificou o impasse político. A ação militar em Madagascar também foi objeto de forte condenação internacional, com a União Africana e o Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, pronunciando-se contra o que classificaram como um golpe. Os eventos se seguiram a uma onda de manifestações lideradas, em grande parte, pela Geração Z.
Michaël Randrianirina, antes de sua ascensão à presidência, liderava o Corpo de Pessoal e Serviços Administrativos e Técnicos do Exército (CAPSAT), uma unidade militar que teve um papel crucial nos eventos recentes. O CAPSAT notavelmente rebelou-se contra o governo anterior e aliou-se aos manifestantes antigovernamentais no último fim de semana. É importante ressaltar que essa unidade militar já havia participado do golpe de 2009, que levou Rajoelina ao poder em seu primeiro mandato. Contudo, desentendimentos recentes surgiram, e na semana anterior à posse, a CAPSAT instruiu seus soldados a não abrirem fogo contra os manifestantes que clamavam pela renúncia do presidente.
Durante a cerimônia de posse na capital de Madagascar, Antananarivo, o Coronel Randrianirina leu o juramento presidencial. “Cumprirei plena, completa e justamente as altas responsabilidades do meu cargo como Presidente da República de Madagascar”, declarou, conforme reportado pela agência de notícias Reuters. Ele também enfatizou seu compromisso em exercer o poder que lhe foi concedido, dedicando “toda minha força para defender e fortalecer a unidade nacional e os direitos humanos”, buscando apaziguar as tensões e sinalizar uma direção para a nova administração.
A tomada de poder pelos militares rebeldes, que se uniram aos protestos da Geração Z em Madagascar, foi formalmente anunciada na terça-feira (14). Este anúncio estratégico ocorreu apenas minutos depois que o Parlamento do país, ignorando um decreto emitido por Rajoelina para sua dissolução, votou e aprovou o impeachment do então presidente. A decisão parlamentar consolidou o cenário de mudança drástica, especialmente diante da fuga de Rajoelina do país, impulsionada pela rebelião militar e pela crescente pressão dos manifestantes que exigiam sua imediata renúncia.
Os militares rebeldes, ao tomarem o controle, afirmaram ter dissolvido todas as instituições governamentais, mantendo uma única exceção: o Poder Legislativo. O ex-presidente Andry Rajoelina deixou o país na segunda-feira (13), justamente quando as forças rebeldes assumiram o comando das Forças Armadas e se alinharam aos chamados protestos da Geração Z. Em pronunciamento pela rádio nacional malgaxe, o Coronel Michael Randrianirina, líder do movimento rebelde militar, confirmou a tomada de controle governamental, afirmando explicitamente: “Tomamos o poder.” Em seu discurso na rádio, ele reiterou que os militares dissolveram todas as instituições, exceto o Parlamento.
Contrariando a intensa pressão popular e militar, o então presidente Rajoelina emitiu um decreto, também na terça-feira, que visava dissolver o Parlamento. No entanto, os deputados desconsideraram o decreto, reuniram-se e prosseguiram com a votação, aprovando o impeachment de Rajoelina. Na noite de segunda-feira (13), em um discurso gravado e divulgado de um local não identificado fora do país, o presidente malgaxe havia declarado que não abandonaria o governo, um posicionamento que intensificou o desafio aos protestos crescentes. Ele justificou a dissolução do Parlamento como uma medida “necessária para restaurar a ordem no país”, ao mesmo tempo em que prometeu a realização de novas eleições a partir de dezembro. Rajoelina, buscando apoio, disse ainda que “o povo precisa ser ouvido novamente. É hora da juventude.” A decisão de Rajoelina foi rapidamente contestada por Siteny Randrianasoloniaiko, líder da oposição na Assembleia Nacional, que afirmou: “Este decreto não é juridicamente válido… o presidente da Assembleia Nacional afirma que não foi consultado.” A instabilidade foi ampliada com a decisão da polícia do país de romper com o então presidente e se unir abertamente aos manifestantes antigovernamentais.

Imagem: g1.globo.com
A fuga do ex-presidente Rajoelina foi confirmada pelo líder da oposição parlamentar, Siteny Randrianasoloniaiko, em entrevista à agência Reuters. Ele informou que Rajoelina deixou Madagascar após várias unidades do exército desertarem e se juntarem aos manifestantes da Geração Z, que estavam organizando protestos massivos desde 25 de setembro. “Ligamos para a equipe da presidência e eles confirmaram que ele deixou o país”, disse Randrianasoloniaiko, acrescentando que o paradeiro exato do ex-presidente era desconhecido naquele momento. Uma fonte militar, também citada pela Reuters, indicou que Rajoelina partiu do país em um avião militar francês, e a rádio francesa RFI mencionou um acordo entre ele e o presidente Emmanuel Macron, sublinhando a dimensão internacional da crise.
A Geração Z, que impulsionou grande parte dos recentes protestos em Madagascar, refere-se ao grupo de pessoas nascidas entre 1995 e 2009. Caracterizados como os primeiros nativos digitais, cresceram imersos na internet e tendem a ser mais críticos e engajados em discussões sobre diversidade, sustentabilidade e, evidentemente, política. Este grupo tem se destacado globalmente, liderando manifestações em diversos países nos últimos meses, como Quênia, Indonésia, Nepal, Filipinas, Peru e Marrocos. No Nepal, esses protestos resultaram na destituição do primeiro-ministro, enquanto no Peru, foram um fator chave para a queda da então presidente Dina Boluarte. Nas ruas de Antananarivo, a capital malgaxe, milhares de jovens da Geração Z uniram-se em celebração após as notícias da fuga do presidente, entoando cânticos como “O presidente deve renunciar agora”.
Com a saída de Andry Rajoelina do país, a responsabilidade de assumir temporariamente suas funções recairia sobre o presidente do Senado até que novas eleições pudessem ser realizadas. Contudo, o então presidente do Senado, uma figura já marcada pela indignação pública durante os protestos, foi destituído de suas funções na segunda-feira. Um novo nome foi rapidamente indicado para preencher seu lugar temporariamente, conforme comunicado pela casa: Jean André Ndremanjary.
O anúncio da assunção do comando das Forças Armadas pelo Exército de Madagascar ocorreu logo depois de Andry Rajoelina ter denunciado uma “tentativa ilegal de tomada do poder”. Em um vídeo divulgado, os militares declararam que todas as futuras ordens do exército malgaxe — terrestres, aéreas e marítimas — emanariam exclusivamente do quartel-general do CAPSAT, o contingente de oficiais administrativos e técnicos liderado pelo Coronel Randrianirina. Já no sábado (11), o grupo militar havia se juntado a manifestantes antigovernamentais em Antananarivo, marcando um dos maiores protestos desde o início das manifestações na ilha. Em um comunicado publicado em suas redes oficiais, o governo do então presidente Rajoelina qualificou os acontecimentos como uma “tentativa ilegal e violenta de tomada do poder” e afirmou que o presidente defendia o diálogo como a única solução para a crise. Conforme relatado por veículos internacionais, a tensão se manteve elevada até a efetiva posse.
As raízes dos protestos em Madagascar, iniciados principalmente pela Geração Z, transcendiam os problemas políticos imediatos. Inicialmente impulsionados por recorrentes cortes de água e eletricidade, o movimento rapidamente se ampliou para abranger críticas contundentes à corrupção sistêmica, à má gestão dos líderes políticos e à aguda falta de oportunidades no país. Segundo dados da ONU, pelo menos 22 pessoas morreram em confrontos entre manifestantes e forças de segurança desde 25 de setembro, evidenciando a gravidade da situação. Madagascar, uma das nações mais pobres do mundo, possui um histórico marcado por frequentes levantes populares desde que obteve independência da França, em 1960. Entre os exemplos notáveis estão os protestos de 2009, que levaram o então presidente Marc Ravalomanana a deixar o cargo e pavimentaram o caminho para o primeiro mandato de Andry Rajoelina. O agora deposto presidente foi reeleito em 2018 e novamente em 2023, em pleitos que foram repetidamente contestados e boicotados pela oposição, sinalizando um longo histórico de instabilidade democrática e social que culminou na posse do Coronel Michaël Randrianirina.
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O coronel Michaël Randrianirina assume a presidência de Madagascar em um momento de incerteza, herança de semanas de protestos e uma profunda crise política. A comunidade internacional segue atenta aos desdobramentos neste país africano. Para acompanhar outras notícias e análises sobre os acontecimentos na esfera política global, incluindo matérias sobre a tomada de poder e processos democráticos, visite nossa editoria de Política.
Crédito da imagem: Siphiwe Sibeko/Reuters



