Nesta quarta-feira, 24 de abril, a Câmara dos Deputados concedeu sua aprovação à Medida Provisória (MP) que estabelece o programa “Agora Tem Especialistas“. Essa iniciativa é considerada um pilar estratégico do governo Lula (PT) na área da saúde pública, buscando consolidar uma identidade robusta e eficaz para suas políticas de saúde. A MP, fundamental para os planos da gestão atual, propõe alterações legislativas que visam otimizar a relação entre o setor privado e o Sistema Único de Saúde (SUS), especialmente no que tange à resolução de pendências financeiras e à oferta de atendimento médico.
O cerne da alteração proposta por esta MP reside na permissão para que instituições de saúde privadas, incluindo hospitais, clínicas e até mesmo operadoras de planos de saúde, possam quitar suas dívidas com o governo federal. Em vez de pagamentos monetários diretos, essas entidades terão a opção de compensar seus débitos por meio da prestação de serviços e atendimentos direcionados ao SUS. Este modelo inovador busca, simultaneamente, aliviar o passivo financeiro dessas instituições e ampliar a capacidade de atendimento da rede pública. Além disso, a proposta contempla o incremento do atendimento móvel, por meio da utilização de carretas equipadas, uma estratégia que o Poder Executivo pretende fortalecer substancialmente com o direcionamento de emendas parlamentares.
Câmara Aprova MP: Dívida de Hospitais Trocará por Serviços ao SUS
A votação no plenário da Câmara revelou um amplo apoio à medida, registrando 403 votos favoráveis contra apenas 6 contrários, refletindo um consenso político significativo em torno de sua relevância e potencial impacto. Contudo, para que a MP se converta em lei, ainda é imperativo que o texto seja submetido e aprovado pelo Senado Federal. O prazo para esta apreciação é apertado, com a necessidade de aprovação até a próxima sexta-feira, 26 de abril, sob pena de a Medida Provisória perder sua validade e seus efeitos cessarem. A urgência na tramitação demonstra a prioridade atribuída pelo governo e parte do Legislativo a esta pauta de saúde pública.
A Medida Provisória em questão teve sua origem e assinatura em maio de 2024, representando uma reformulação profunda do programa “Mais Acesso a Especialistas”, que havia sido lançado anteriormente, também em 2024. A revisão do programa original se fez necessária, de acordo com informações, pois desagradou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A insatisfação de Lula com a versão inicial derivava do fato de que o “Mais Acesso a Especialistas” não parecia apresentar uma capacidade efetiva de atacar de maneira célere e abrangente as extensas filas de espera presentes na rede pública de saúde, que são uma preocupação central da atual administração.
Prioridades e Ambições do Programa Governamental
O plano estratégico delineado pelo governo com o “Agora Tem Especialistas” tem múltiplos focos. Uma das metas primordiais é a aceleração dos atendimentos e exames médicos necessários para que os pacientes do SUS possam obter seus diagnósticos com maior rapidez, diminuindo o período de incerteza e o agravamento de condições de saúde. Adicionalmente, o programa prevê a organização e a execução de mutirões de saúde. Esses mutirões, com caráter intensivo e focado, são planejados para impulsionar a redução das longas filas de espera por cirurgias eletivas, representando um alívio significativo para o sistema e para a população.
Do ponto de vista político, o Palácio do Planalto vislumbra na Medida Provisória e em seus desdobramentos uma importante “vitrine eleitoral” para o pleito de 2026. A execução bem-sucedida e a visibilidade das ações do programa são percebidas como potenciais ativos na campanha eleitoral. O próprio presidente Lula, juntamente com o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, tem participado ativamente de eventos de lançamento e inauguração das iniciativas ligadas ao programa, já tendo marcado presença em ações em localidades estratégicas como Recife, no estado de Pernambuco, e a capital federal, Brasília.
As áreas da medicina que receberão assistência especializada prioritária no âmbito do “Agora Tem Especialistas” foram criteriosamente selecionadas com base na demanda e no impacto na saúde da população. A lista inclui oncologia, que lida com o tratamento de câncer; ginecologia, focada na saúde da mulher; cardiologia, voltada para as doenças do coração; ortopedia, que trata do sistema musculoesquelético; oftalmologia, dedicada à visão; e otorrinolaringologia, que abrange ouvido, nariz e garganta. A concentração nesses segmentos visa abordar as patologias de maior prevalência e complexidade no SUS.
Ações Diretas do Ministério e Debate com Setores
Outro ponto de relevância na Medida Provisória é a autorização concedida ao Ministério da Saúde para atuar diretamente na prestação de serviços em estados e municípios. Tradicionalmente, o papel do ministério tem sido mais focado no repasse de recursos financeiros. A possibilidade de prestação direta de serviços, entretanto, suscita certas desconfianças entre gestores de saúde estaduais e municipais, bem como em setores da esquerda política. Esses grupos levantam questões sobre uma potencial ruptura com os pilares fundamentais do Sistema Único de Saúde, que preveem descentralização e a atuação autônoma dos entes federativos. Em junho de 2024, o ministro Alexandre Padilha, em declaração à Folha de S.Paulo, reforçou que o debate acerca da parceria com o setor privado, no seu entendimento, já havia sido superado e não representava uma novidade contestável.
A MP também promove um fortalecimento institucional da Agência Nacional de Saúde Suplementar (AgSUS). Originalmente criada em 2019 com a finalidade de gerir as seleções para contratação de médicos com carteira assinada, a AgSUS é agora posicionada como o principal braço operacional para as contratações que são essenciais ao programa. Isso inclui desde a aquisição e aluguel de carretas para atendimento móvel até a contratação de profissionais de saúde e diversos outros serviços especializados. Adicionalmente, o texto da Medida Provisória introduziu modificações na estrutura do Grupo Hospitalar Conceição (GHC), uma empresa pública federal de grande porte, atribuindo-lhe a responsabilidade de realizar contratações específicas para o “Agora Tem Especialistas” na região Sul do país.

Imagem: www1.folha.uol.com.br
Previsão Legal e Desdobramentos Orçamentários
A Medida Provisória inova ao incluir um novo dispositivo na própria lei de criação do SUS. Esse dispositivo estabelece a prerrogativa para a União, em situações de reconhecida “urgência em saúde pública” que sejam causadas por alta demanda na atenção especializada, de poder contratar e prestar serviços diretamente em quaisquer estados e municípios. Essa flexibilidade na atuação federal é justificada por um contexto específico: em junho, o Ministério da Saúde já havia emitido uma portaria declarando esta condição de urgência, fundamentada no “prolongado tempo de espera” que os cidadãos enfrentam para acessar consultas, exames e tratamentos de saúde especializados via SUS. Para mais informações sobre Medidas Provisórias e seu funcionamento no Brasil, um excelente recurso pode ser encontrado no site da Agência Brasil, detalhando o processo legislativo e os tipos de instrumentos normativos.
Em termos de mobilização de recursos financeiros, o ministro da Saúde informou que o total a ser movimentado na ação do “Agora Tem Especialistas” alcançará a marca de R$ 16 bilhões. Importante notar que a maior parcela deste montante já está integrada ao orçamento existente do Ministério da Saúde. Dentro desta cifra total, aproximadamente R$ 4,4 bilhões estão designados especificamente para a frente de troca de dívidas entre as empresas de saúde e o governo, em compensação pela prestação de serviços ao SUS, evidenciando o peso dessa modalidade na composição do programa.
A sistemática da troca de dívidas se desdobra em duas frentes principais, concebidas para maximizar o alcance e a efetividade do mecanismo. A primeira modalidade possibilita que as operadoras de planos de saúde, que possuem débitos por ressarcimento ao SUS – valores referentes a atendimentos que deveriam ter sido cobertos por seus planos, mas foram realizados pela rede pública –, possam abater esses valores. A segunda via, por sua vez, foca em hospitais privados e entidades filantrópicas. Para estas instituições, serão emitidos créditos. Esses créditos lhes permitirão descontar os valores dos serviços prestados ao SUS diretamente em seus débitos tributários pendentes ou nas futuras cobranças de impostos, proporcionando um incentivo fiscal para a colaboração.
Vale ressaltar a natureza temporal das Medidas Provisórias no ordenamento jurídico brasileiro. Uma MP, embora possua vigência imediata desde sua edição e publicação, tem um prazo limitado. Para que ela adquira caráter definitivo de lei, necessita da aprovação do Congresso Nacional em um período de até 120 dias. Caso não seja aprovada dentro desse interstício, ela perde sua validade, cessando todos os seus efeitos jurídicos. A urgência com que esta MP tem sido tratada pelo governo e a necessidade de sua conversão em lei demonstram a relevância que o programa “Agora Tem Especialistas” representa para a política de saúde atual.
Entretanto, nem todos os pareceres são de total concordância com os termos da MP. Em nota técnica emitida, a Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados expressou algumas preocupações e levantou questionamentos importantes. A consultoria aponta que a Medida Provisória introduz uma “significativa alteração no papel da União no SUS”, transformando o governo federal de um ente “indutor e financiador” em um “executor e contratante direto de serviços de saúde”. Essa mudança de perfil, argumenta a nota, pode potencialmente dificultar o controle eficaz sobre a qualidade e a transparência dos serviços que serão prestados. Uma das razões apresentadas para essa possível dificuldade de fiscalização é que as mesmas entidades privadas que venham a firmar contratos com o Ministério da Saúde para a troca de dívidas por serviços podem, simultaneamente, manter outros contratos com governos estaduais e municipais, gerando um cenário de múltiplas relações contratuais.
A nota técnica conclui com uma observação crítica acerca do mecanismo de renúncia fiscal implícito na troca de dívidas. Ela afirma que “Este mecanismo [de renúncia fiscal por serviço] produz efeitos semelhantes ao gasto público direto, mas à margem do controle orçamentário tradicional”. Isso sugere uma preocupação com a transparência e a accountability na gestão dos recursos públicos, uma vez que a conversão de dívidas em serviços, embora com impacto positivo na oferta de saúde, pode ser menos transparente em termos de acompanhamento financeiro do que o desembolso direto via orçamento.
Confira também: artigo especial sobre redatorprofissiona
Em suma, a aprovação da MP que institui o programa “Agora Tem Especialistas” na Câmara dos Deputados representa um marco relevante na agenda de saúde do governo. Ao permitir a troca de dívidas de instituições privadas por serviços prestados ao SUS, a medida busca tanto fortalecer a capacidade de atendimento da rede pública quanto desonerar financeiramente o setor privado. É um modelo com implicações orçamentárias e estruturais significativas para o SUS, conforme apontado por análises da consultoria legislativa. Continue explorando as notícias sobre política nacional e outros temas de interesse em nossa editoria de Política para ficar sempre informado.
Crédito da Imagem: Walterson Rosa – 5.jul.25/Divulgação/Ministério da Saúde
🔗 Links Úteis
Recursos externos recomendados