Brasil: A China das Soluções Baseadas na Natureza?

Economia

O cenário global de discussões sobre mudanças climáticas se volta cada vez mais para o papel que o Brasil e as soluções baseadas na natureza podem desempenhar. Com a iminência da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP30, o país emerge não apenas como um anfitrião crucial, mas como um potencial líder na articulação e implementação de estratégias climáticas eficazes. Nesse contexto, Tony Lent, uma figura experiente no investimento em energias renováveis e iniciativas climáticas, e cofundador da Capital For Climate – uma plataforma dedicada a auxiliar grandes investidores na identificação de oportunidades impactantes para a meta de zero líquido – expressa uma visão ambiciosa.

De acordo com Lent, o Brasil possui a capacidade de replicar, no campo das soluções baseadas na natureza, o que a China conseguiu com as tecnologias de transição energética. Isso significa que o país sul-americano poderia se estabelecer como um modelo exemplar para outras nações, simultaneamente se transformando em um polo magnético para investidores de todas as partes do mundo interessados em estratégias climáticas. Essa perspectiva sublinha a possibilidade de o Brasil não apenas contribuir, mas liderar a agenda global de descarbonização por meio de suas vastas riquezas naturais e infraestrutura agrária.

Brasil: A China das Soluções Baseadas na Natureza?

As soluções baseadas na natureza representam uma categoria essencial de abordagens que alavancam a resiliência e a capacidade dos ecossistemas naturais. Estas estratégias incluem a restauração e conservação de ecossistemas, o uso sustentável da biodiversidade e a otimização de funções ecossistêmicas para capturar carbono, proteger a biodiversidade e impulsionar o desenvolvimento sustentável. Em suma, são um pilar fundamental para a transição ecológica mundial, e Tony Lent projeta que o conhecimento e a experiência brasileira em sua implementação seriam buscados por todo o planeta. Para mais informações sobre o conceito, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) oferece uma descrição detalhada das soluções baseadas na natureza e seu papel crucial para um futuro mais sustentável, conforme pode ser verificado em sua página oficial sobre o tema. Lent também reconhece que, apesar das incertezas geradas por políticas como as do governo Trump na esfera climática global, a progressão das indústrias de transição energética permanece notável, com taxas de crescimento impressionantes em diversos setores.

O investidor pontua que, apesar da incerteza política, o desenvolvimento do setor solar, por exemplo, manteve um crescimento robusto, mesmo diante de uma desaceleração momentânea nos Estados Unidos. A China, ele observa, demonstra uma liderança inquestionável no campo das tecnologias de transição, destacando-se em veículos elétricos, armazenamento e transmissão de energia. Esse desempenho chinês serve de paralelo para a aspiração brasileira, ilustrando como um país pode dominar e escalar inovações essenciais para a sustentabilidade global.

Corroborando a visão de Lent, Marina Cançado, fundadora da Converge Capital e cofundadora da ATO, enfatiza a resiliência dos investimentos em iniciativas voltadas à crise climática, mesmo em face de instabilidades políticas internacionais. Marina sublinha a crescente importância do setor privado, que se consolidou como uma força motriz nos financiamentos climáticos. Cerca de dois terços do capital atualmente direcionado à transição para uma economia de baixo carbono são provenientes de investidores privados, o que representa uma mudança paradigmática em relação ao modelo anterior, dominado por recursos públicos. Esta dinâmica ressalta a capacidade e a vontade do capital privado de atuar como agente de transformação.

Marina também menciona o Climate Implementation Summit, um evento agendado para o sábado (8) que, em sua percepção, sinaliza o começo de uma “década de implementação” na agenda climática mundial. Este encontro, que reúne líderes políticos, empresariais e da sociedade civil, tem como propósito forjar estratégias concretas e ações práticas que acelerem a transição para uma economia genuinamente sustentável. Para Cançado, a crescente participação do setor privado não só infunde um novo vigor na agenda climática, mas também a equipa com pragmatismo, uma base sólida e, fundamentalmente, capacidade de implementação e escalabilidade. Ela resume a necessidade da nova década com o clamor para que “as coisas aconteçam”, e que, com a implementação, vêm desafios que o setor privado está singularmente posicionado para enfrentar.

Um ponto central destacado por Marina é a evolução na narrativa global sobre a pauta climática. Houve um afastamento de um discurso centrado em sacrifícios e restrições para uma abordagem que enfoca prosperidade, inovação e a melhoria da qualidade de vida. Essa nova ótica posiciona a transição ecológica não como um fardo, mas como uma oportunidade estratégica para o desenvolvimento socioeconômico e ambiental. Em consonância com essa mudança de perspectiva, Tony Lent alerta que países que deliberadamente escolhem não aderir à transição energética estão, essencialmente, agindo contra seus próprios interesses econômicos e de segurança. Ele descreve a ação desses países como “atirando em si mesmos”, reforçando a urgência da adesão a essas novas diretrizes.

Lent ilustra esse ponto com o exemplo da Etiópia, que tomou a decisão estratégica de banir a importação de motores de combustão interna, investindo maciçamente em veículos elétricos. Essa iniciativa visa reduzir a dependência do petróleo, diminuindo a vulnerabilidade a choques externos e redefinindo sua matriz energética. Para o investidor, a transição energética está intrinsecamente ligada à geopolítica e à segurança nacional, concedendo aos países maior autonomia sobre seus recursos energéticos e, consequentemente, fortalecendo sua posição estratégica no cenário global.

Ao aprofundar a discussão sobre as soluções baseadas na natureza, Lent traça um paralelo com as tecnologias de energia renovável. Ele explica que a restauração de pastagens degradadas, o desenvolvimento de agroflorestas em larga escala, a reconstrução de florestas e a promoção da agricultura regenerativa são inovações de impacto equivalente às que foram vistas no desenvolvimento da energia eólica e solar. O Brasil, segundo Lent, detém um potencial ímpar para se tornar um líder mundial em todas essas soluções baseadas na natureza, e o mais crucial, para colaborar na redução da curva de custos associada a essas tecnologias e metodologias, tornando-as mais acessíveis e escaláveis globalmente.

Um dos diferenciais mais significativos do Brasil reside na sua capacidade incomparável de gerenciar projetos agrícolas em uma escala de milhares de hectares, uma façanha que nenhum outro país consegue replicar com a mesma eficiência e extensão. Tony Lent identifica essa infraestrutura consolidada e a mentalidade de grande escala como vantagens competitivas decisivas. Nos últimos quatro anos, o Brasil tem cultivado um ambiente político e regulatório altamente favorável à bioeconomia e à transição ecológica, o que inclui a implementação do Plano de Transição Ecológica, a estruturação de uma regulação nacional para o carbono e o desenvolvimento de veículos financeiros inovadores, como o programa EcoInvest.

Ao conjunto dessas iniciativas, adiciona-se o notável talento empreendedor atraído para o setor, junto com o crescente número de plataformas de desenvolvimento. Isso resulta em uma população de desenvolvedores que já gerencia mais de um milhão de hectares e projeta expandir essa operação para muitos milhões de hectares até 2030. Lent ressalta que nenhum outro mercado no mundo exibe um potencial tão robusto e uma capacidade tão rápida de escalar as soluções baseadas na natureza como o Brasil. Este dinamismo é vital para o cumprimento de metas ambiciosas de sustentabilidade.

O complexo dilema da dependência do petróleo para o financiamento da transição energética também é abordado por Tony Lent, que reconhece a inerente dificuldade para um país abrir mão de uma fonte significativa de receita para atingir seus objetivos estratégicos. Ele cita o exemplo do Texas, que conseguiu se posicionar simultaneamente como o maior produtor de energia renovável e de petróleo nos Estados Unidos. Durante o período de transição, coexistem duas narrativas aparentemente contraditórias: a maximização da renda obtida do petróleo e o avanço acelerado dos ativos de baixo carbono. Contudo, Lent acredita que, com a proliferação dos veículos elétricos e a eletrificação da matriz energética brasileira, a demanda por petróleo fatalmente diminuirá, tornando a transição energética um caminho inevitável, mesmo diante de interesses divergentes no curto prazo.

Para a COP30, Tony Lent tem grandes expectativas em relação à contribuição do Brasil, antevendo que o país apresentará um inventário sólido de mecanismos financeiros e de projetos escaláveis, especialmente no que diz respeito às soluções baseadas na natureza. Ele revela que há planos para anunciar que o Brasil já opera soluções desse tipo em mais de um milhão de hectares, experimentando um crescimento de dois dígitos e uma atração crescente de capital institucional. O programa “Capital Mobilization for NBS no Brasil” já reúne 26 gestores de ativos e instituições financeiras que se comprometeram a investir múltiplos bilhões de dólares até 2027. Lent interpreta esse movimento como um claro indicativo da profissionalização e do amadurecimento do setor, com empreendimentos que atingem valores médios entre 30 e 40 milhões de dólares, mostrando a robustez do mercado.

O investidor frisa que a elevação do nível de profissionalismo dos empreendedores e a qualidade intrínseca dos projetos são fatores preponderantes para o notável aumento dos investimentos. A capacidade de demonstrar a rentabilidade desses projetos é o que realmente atrai o capital, pois “as pessoas sempre chegam atrasadas às coisas que fazem muito dinheiro”. Além disso, Lent salienta a convergência das agendas de clima e biodiversidade desde a conferência de Glasgow, um fator que impulsionou a criação de fundos especializados em soluções baseadas na natureza e tem canalizado um volume significativo de capital global para o Brasil. Em suas estimativas, as soluções baseadas na natureza têm o potencial de gerar cerca de 35% das reduções de emissões necessárias até o ano de 2050, a um custo consideravelmente inferior a outras alternativas, tornando esse tipo de investimento cinco vezes mais eficiente.

Para concluir, Tony Lent estabelece uma comparação histórica com a energia solar, que em 2004 era considerada a fonte de energia mais dispendiosa globalmente. No entanto, hoje ela responde por dois terços dos investimentos no setor energético, um feito atribuído à inovação contínua e à escala de implementação. Lent expressa a esperança de que um cenário semelhante se desenvolva para as soluções baseadas na natureza, mas de maneira “muito mais rápida”, dada a urgência climática e a evolução tecnológica e financeira que pavimentam o caminho. Esta é a visão de um futuro em que o Brasil, com sua riqueza natural e capacidade inovadora, pode redefinir o paradigma da sustentabilidade global.

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A percepção de que o Brasil tem potencial para se tornar a “China” das soluções baseadas na natureza reforça a posição do país como um player essencial na luta global contra as mudanças climáticas. Com um ambiente propício para a bioeconomia e um crescente interesse do setor privado, a próxima década promete ser de intensa implementação. Continue acompanhando nossas análises aprofundadas sobre economia, política e sustentabilidade em nosso blog de Economia para não perder nenhuma atualização sobre a transição energética e o desenvolvimento sustentável.

Crédito da imagem: Divulgação

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