Bocaiúva do Sul perde moradores por limite territorial e gera protestos

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Bocaiúva do Sul perde moradores por limite territorial e gera protestos

A cidade de Bocaiúva do Sul perde moradores por limite territorial e gera protestos significativos na Região Metropolitana de Curitiba, Paraná. Aproximadamente 1.500 habitantes de Bocaiúva do Sul, que residem em suas casas habituais, correm o risco de serem oficialmente designados como residentes de Rio Branco do Sul, um município vizinho. Esta redefinição administrativa tem gerado intensa insatisfação e uma onda de manifestações entre a população diretamente afetada, que se vê à mercê de uma mudança que redefine não apenas mapas, mas também identidades e acesso a serviços.

O epicentro desta controvérsia cartográfica remonta aos anos de 2012 e 2013. Naquele período, as fronteiras entre os dois municípios foram submetidas a uma criteriosa reavaliação por especialistas do Instituto Água e Terra (IAT). Este órgão governamental paranaense detém a incumbência da gestão ambiental e territorial em todo o estado, e suas análises resultaram na proposta de alteração dos limites até então reconhecidos.

Bocaiúva do Sul perde moradores por limite territorial e gera protestos

A equipe técnica do IAT realizou uma profunda reinterpretação da Lei Estadual nº 790, promulgada em 1951, que discorre sobre as demarcações administrativas dos municípios do Paraná. Conforme a descrição legal, a divisa entre Rio Branco do Sul e Bocaiúva do Sul é delineada para “começar na foz do rio Morro Grande no rio Bacaetava, alcança em reta a lomba do Araçazeiro e pelo qual segue depois pela cumiada da Serra de Sant’Ana até defrontar a cabeceira do ribeirão Grande, afluente do rio Sant’Ana”. Amauri Pampuch, engenheiro florestal do IAT, elucidou que a metodologia empregada na revisão está em plena consonância com os marcos definidos pela legislação, utilizando para isso sistemas avançados de geolocalização por satélite e software especializado. Tal processo permite que os ajustes cartográficos sejam efetuados remotamente, na sede do órgão, sem a necessidade de deslocamentos físicos a campo.

Impacto Direto nas Comunidades e Serviços

Quatro distintas comunidades, anteriormente integralmente ligadas a Bocaiúva do Sul, encontram-se agora incluídas na área que passou a integrar Rio Branco do Sul. Dentre as inquietações mais prementes dos moradores, a situação de duas escolas na localidade se destaca. Ambas as instituições de ensino foram erguidas e são mantidas financeiramente pela prefeitura bocaiuvense, mas, perante a nova configuração territorial, passaram a ser, em teoria, de responsabilidade do município vizinho. Similarmente, o transporte escolar, serviço crucial para a educação local, é atualmente assegurado por Bocaiúva.

Laurina Guerrieri, residente de uma das comunidades atingidas, expressou a frustração coletiva, afirmando: “A gente nunca teve assistência de Rio Branco.” Segundo os habitantes da região, é Bocaiúva do Sul quem historicamente garante os serviços públicos essenciais, abrangendo desde a pavimentação das vias e o atendimento de saúde, até a coleta de resíduos e o já mencionado transporte escolar. “Vamos perder todas as benfeitorias que Bocaiúva sempre fez,” lamentou uma moradora. Patrícia Gusso, uma agricultora local, corroborou o sentimento de desamparo: “Rio Branco não sabe nem que a gente existe.”

A vasta maioria da população que se encontra na área contestada é formada por proprietários rurais, muitos deles com laços que se estendem por gerações. Patrícia Gusso enfatizou que as terras de sua família pertencem ao local desde o bisavô, reforçando o profundo elo histórico: “A gente sempre foi bocaiuvense.” Entre as dificuldades vislumbradas, Gusso apontou a complexidade do transporte escolar. Ela questiona a viabilidade para a prefeitura de Rio Branco do Sul organizar rotas para atender os estudantes de uma região que nunca foi sua responsabilidade. “Eles [prefeitura de Rio Branco] nunca vieram dar uma assistência, perguntar. Não sabem nem quem mora aqui,” salientou.

A questão da mudança territorial transcende os serviços e a logística, impactando profundamente a relação emocional e burocrática dos moradores com seu município de origem. Isolete Aparecida de Brito Xavier, aposentada, exemplificou essa crise de identidade: “Registro do terreno é Bocaiúva, registro de nascimento é Bocaiúva, meu casamento é Bocaiúva, registro dos meus filhos é Bocaiúva. Tudo aqui é Bocaiúva.”

Consequências Econômicas e Demográficas

O panorama populacional e econômico de Bocaiúva do Sul adquire um novo contorno frente a essa redefinição territorial. De acordo com o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Bocaiúva do Sul possui 13,2 mil habitantes, uma cifra significativamente menor do que os 37,5 mil moradores de Rio Branco do Sul. A economia bocaiuvense se sustenta predominantemente no turismo rural e de natureza, além da exploração de pedras e minerais. Em 2021, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita da cidade atingiu R$ 21 mil.

Bocaiúva do Sul perde moradores por limite territorial e gera protestos - Imagem do artigo original

Imagem: g1.globo.com

Informações recentes do IBGE indicaram que Bocaiúva do Sul foi o município paranaense que registrou a maior perda populacional em termos proporcionais entre 2024 e 2025, com uma diminuição de cerca de 600 pessoas, o que equivale a 2,9% de sua população. Este decréscimo populacional tem implicações diretas sobre o Fundo de Participação dos Municípios (FPM), uma dotação enviada pelo governo federal para auxiliar, especialmente, cidades de menor porte. Uma vez que o FPM é indexado ao contingente populacional, a diminuição de habitantes pode acarretar uma redução substancial nos recursos destinados ao município. A efetiva transição das comunidades afetadas, que abarcam aproximadamente 1.500 indivíduos, para Rio Branco do Sul intensificaria ainda mais este impacto negativo na receita de Bocaiúva do Sul.

Em Busca de uma Solução Consensual

Na tentativa de solucionar o impasse e atender às demandas dos moradores, as administrações municipais de Bocaiúva do Sul e Rio Branco do Sul iniciaram negociações. A pauta inclui uma nova proposta de limite que preserve as comunidades e escolas dentro de Bocaiúva, destinando a Rio Branco do Sul uma área territorial desabitada. Contudo, as conversações ainda não culminaram em um consenso definitivo.

João de Lima (PSD), prefeito de Bocaiúva do Sul, reiterou o argumento da ancestralidade e da identificação profunda dos habitantes com sua terra: “São famílias tradicionais, que estão lá há mais de cem anos.” O prefeito enfatizou que todas as documentações das propriedades e os registros dos eleitores indicam Bocaiúva, bem como os serviços vitais: “A saúde, nós mantemos. A agricultura, nós que mantemos,” afirmou. Lima mencionou que, com exceção da fatura de energia elétrica, que já é emitida por Rio Branco do Sul, a prefeitura vizinha “está dando uma mão, agora, nas estradas rurais. É a única coisa que ela fez até hoje.”

Por sua vez, a prefeitura de Rio Branco do Sul emitiu uma nota classificando a alteração sugerida pelo IAT como um “ajuste técnico de base cartográfica.” O comunicado esclarece que modificações de limites territoriais somente podem ser concretizadas mediante requerimento da Assembleia Legislativa, solicitando uma lei federal, além de exigirem a solicitação de, no mínimo, 20% dos eleitores das áreas envolvidas e a realização de uma consulta popular. A nota ainda destaca que “desde 2021, Rio Branco do Sul e Bocaiúva do Sul vêm mantendo tratativas” para endereçar a questão dos limites.

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A situação dos moradores na divisa entre Bocaiúva do Sul e Rio Branco do Sul continua em aberto, refletindo a complexidade de conciliar interpretações legais, identidades culturais e impactos econômicos. A espera por uma resolução justa e eficaz permanece. Para acompanhar os próximos capítulos desta e de outras notícias que impactam a vida nas cidades paranaenses e brasileiras, explore nossa editoria de Cidades e mantenha-se informado sobre os acontecimentos regionais.

Foto: Reprodução/RPC