A capital mineira, Belo Horizonte, passará a celebrar anualmente o Dia Municipal da Fidelidade Conjugal e do Casamento Monogâmico Cristão. A nova data comemorativa, definida para 18 de maio, foi oficialmente instituída por meio de uma lei sancionada pelo prefeito Álvaro Damião e publicada no Diário Oficial de Belo Horizonte neste sábado, 25 de outubro de 2025, conforme registros da administração municipal. A medida já provoca debates acalorados sobre seus fundamentos e implicações sociais e jurídicas.
A proposição que resultou na nova legislação surgiu de um projeto de lei aprovado pela Câmara Municipal, de autoria do vereador Neném da Farmácia, representante do partido Mobiliza. O parlamentar justificou a escolha da data comemorativa em um esforço para enaltecer o que ele considera “valores fundamentais” que formam a base de inúmeras famílias na cidade. Para o vereador, a fidelidade nos laços matrimoniais e a monogamia constituem pilares que sustentam a maior parte da população em uma convivência familiar estável, estruturada e duradoura.
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Na fundamentação do texto legislativo, o vereador Neném da Farmácia enfatiza que o principal propósito ao instituir esta data é fomentar a reflexão acerca da função essencial da união estável estabelecida entre um homem e uma mulher. A lei busca, desse modo, sublinhar os benefícios percebidos dessa modalidade de relacionamento para a comunidade belo-horizontina em seu conjunto, valorizando-a como um modelo familiar.
Contudo, a iniciativa não está livre de contestações. A advogada Bianca Figueira Santos, especializada em direitos da população LGBTQIA+ e em direito das famílias, levanta preocupações significativas. Segundo ela, a recém-aprovada lei municipal pode estar em conflito com os preceitos da Constituição Federal e, consequentemente, é passível de ser questionada legalmente na esfera judicial.
Santos argumenta que, embora a lei possa parecer, à primeira vista, uma homenagem inócua a valores familiares, ela efetivamente compromete pilares constitucionais cruciais. Entre eles, destacam-se a laicidade do Estado — que preconiza a imparcialidade estatal diante de credos religiosos — e o princípio da igualdade entre todos os cidadãos, independentemente de suas crenças ou orientações. Ao selecionar e celebrar exclusivamente o casamento cristão, monogâmico e heterossexual em uma data oficial, o poder público, na visão da advogada, inadvertidamente marginaliza e desconsidera outras formas de arranjos familiares, manifestações de amor e diferentes expressões de fé que são legalmente reconhecidas e presentes na sociedade brasileira.

Imagem: agenciabrasil.ebc.com.br
Para a advogada, as repercussões simbólicas dessa nova data são vastas e intrinsecamente negativas. Ela enfatiza que, há mais de uma década, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconhece a constitucionalidade das uniões estáveis homoafetivas como legítimas entidades familiares, decisão que culminou na garantia do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo como uma realidade jurídica consolidada em todo o território nacional.
Ao se concentrar institucionalmente apenas na celebração do casamento entre um homem e uma mulher, a legislação municipal transmite uma mensagem implícita de exclusão. Tal posicionamento desdenha e nega o reconhecimento público às famílias formadas por casais homoafetivos, contrariando o princípio da igualdade e nutrindo uma perspectiva que categoriza certos tipos de família como “corretos” e outros como “ilegítimos”, aponta Santos. Essa dicotomia reforça a discriminação e o preconceito, contrariando a pluralidade de modelos familiares reconhecidos pela justiça brasileira.
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A instituição do Dia do Casamento Monogâmico Cristão em Belo Horizonte levanta um debate essencial sobre a interseção entre valores sociais, fé e direitos fundamentais em um Estado laico. A discussão agora reside na ponderação entre a celebração de um segmento e a garantia de não discriminação e de reconhecimento para todas as configurações familiares. Continue acompanhando a nossa editoria de Cidades para mais análises e desenvolvimentos sobre a legislação e a sociedade de Belo Horizonte. Explore outros conteúdos da editoria Cidades.
Crédito da imagem: Marcello Casal JrAgência Brasil


