O Banco Central do Brasil está conduzindo um estudo para aprimorar a transparência sobre a remuneração de assessores financeiros e plataformas na comercialização de títulos bancários, como Certificados de Depósito Bancário (CDBs) e Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e do Agronegócio (LCA). Essa iniciativa visa mitigar potenciais conflitos de interesse, um ponto de preocupação que ganhou destaque após o recente caso envolvendo o Banco Master, instituição que, de pequeno porte, pode agora se tornar o centro da maior indenização de depósitos bancários já realizada pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC).
As discussões em curso no BC pretendem lançar luz sobre como os bancos remuneram os intermediários que vendem esses produtos. A meta é oferecer aos investidores informações claras e compreensíveis sobre os custos envolvidos e a estrutura de comissionamento. Tal medida busca fortalecer a capacidade do aplicador em comparar opções e tomar decisões mais informadas, priorizando a adequação do produto ao seu perfil de risco e não apenas os incentivos de venda dos assessores.
BC Propõe Transparência na Remuneração de Corretoras de CDBs
A situação do Banco Master, que em maio precisou de uma linha de liquidez de cerca de R$ 4 bilhões do FGC devido a dificuldades, serviu como catalisador para esta revisão. Quando plataformas de investimento e assessores financeiros comercializam CDBs, por exemplo, eles recebem uma comissão do banco emissor. Esse mecanismo gera um espaço para questionamentos críticos: a venda é motivada pela qualidade do produto para o portfólio do investidor, ou pelo benefício financeiro que o vendedor obterá? O aprofundamento das informações para o público visa, portanto, responder a essa questão e endereçar as possíveis lacunas regulatórias.
Transparência e Equidade: Lições da CVM
A inspiração para a postura do Banco Central não é aleatória; ela deriva diretamente das regulamentações que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) já implementou para o mercado de ações e outros títulos e valores mobiliários, que estão em pleno vigor há aproximadamente um ano. As regras da CVM focam em assegurar que o investidor compreenda de forma simplificada e integral os custos associados aos produtos financeiros e, crucialmente, como ocorre a remuneração dos agentes intermediários em sua distribuição. Ao espelhar essa lógica para o setor bancário, o BC busca criar um arcabouço regulatório que promove a equidade e a clareza.
O regulador financeiro está conduzindo seus estudos considerando diversos pilares fundamentais: o panorama regulatório atual, as características singulares dos produtos bancários, os variados modelos de distribuição existentes no mercado e, inegavelmente, o impacto regulatório que as novas diretrizes podem ter sobre instituições financeiras de portes distintos. A avaliação interna no Banco Central sublinha a necessidade imperativa de reforçar os instrumentos que permitem a comparabilidade das informações disponibilizadas aos clientes, um passo vital para a proteção e o empoderamento do investidor.
O Vultoso Caso Banco Master e as Questões Sistêmicas
A eventual liquidação ou intervenção no Banco Master projeta um cenário onde até um milhão de investidores podem ser elegíveis para indenização, conforme fontes familiarizadas com o assunto. Estima-se que cerca de R$ 50 bilhões em papéis do Master estariam elegíveis à garantia do FGC, o que, se concretizado, representaria o maior desembolso da história da entidade. Essa situação acende um alerta sobre os riscos sistêmicos, uma vez que o resgate do banco exigiria aportes adicionais dos maiores bancos do país ao Fundo Garantidor de Créditos.
As plataformas de investimento experimentaram um notável crescimento na última década, revolucionando o acesso dos investidores de varejo a uma vasta gama de produtos. Ao mesmo tempo, elas facilitaram o processo de captação de recursos para as instituições financeiras, reduzindo seus custos operacionais. No entanto, a atuação dessas plataformas no contexto do Banco Master gerou intensa análise e levantou questionamentos tanto de reguladores quanto de investidores e de outros participantes do sistema bancário. A transparência na **remuneração de corretoras de CDBs** tornou-se um debate central.
Para atrair investidores para os papéis do Master, os assessores financeiros utilizavam dois argumentos principais: a alta remuneração oferecida ao investidor e a segurança proporcionada pela garantia do FGC até o limite de R$ 250 mil por CPF em caso de quebra da instituição. Os títulos do Master chegavam a pagar uma taxa de 140% do CDI, enquanto a média do mercado para outros bancos de porte similar situava-se em cerca de 115% do CDI. Essa disparidade de rentabilidade era um forte atrativo.
Além disso, para otimizar os investimentos dentro dos limites de proteção do FGC, corretoras auxiliavam investidores no cálculo do valor máximo a ser aplicado, considerando os juros até o vencimento do título. As comissões pagas aos assessores na venda desses papéis também eram excepcionalmente altas. Em alguns casos, dada a natureza de longo prazo e a remuneração elevada dos CDBs do Master, essas comissões alcançavam mais de 4% do investimento total no vencimento. Essa percentagem contrasta com a média da indústria, que geralmente não ultrapassa 0,5% ao ano, especialmente em emissões de prazo mais curto e menor custo.

Imagem: Maria Isabel Oliveira via valor.globo.com
Concentração de Captação e Questionamentos do Mercado
A concentração da distribuição de títulos do Master é um ponto notável. A XP, por exemplo, possui cerca de R$ 30 bilhões em papéis do conglomerado Master distribuídos, enquanto o BTG soma R$ 6,6 bilhões. Juntos, esses dois players foram responsáveis por mais de 70% da captação do banco com garantia do FGC, segundo estimativas de mercado. Os expressivos incentivos financeiros recebidos pelas corretoras, combinados com a proeminência da garantia do FGC nas propagandas aos investidores, tem sido fonte de incômodo para alguns participantes do mercado. Há quem enxergue nessa estratégia um fator contribuinte para a oferta mais agressiva dos títulos do Banco Master por meio das plataformas.
Rafael Chaves, professor da Escola Brasileira de Economia e Finanças da Fundação Getúlio Vargas (FGV), analisou a situação, avaliando que as plataformas agiram dentro do arcabouço regulatório existente. Contudo, ele defende a necessidade de revisões nas regras para introduzir mecanismos que incentivem a análise de riscos de forma mais robusta. “Não é correto que um banco que está com muito risco tenha esse risco eliminado da operação. Isso é negativo para o sistema como um todo”, afirmou. Essa observação destaca a preocupação com a forma como um volume substancial de captação de um banco de risco elevado teve seu risco aparentemente neutralizado pela garantia do FGC, sem a devida reflexão sobre as implicações sistêmicas.
Se o Banco Master for de fato liquidado, a maior parte do ônus recairá sobre os grandes emissores de depósitos no país — Itaú Unibanco, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Bradesco e Santander Brasil — por serem os maiores contribuintes do FGC. Contudo, a XP e o BTG, por também emitirem CDBs, arcarão proporcionalmente com as perdas, embora em menor grau. O significativo peso que as plataformas adquiriram na captação de recursos para bancos de menor porte é outro ponto que tem sido analisado de perto pelos reguladores. A relevância delas para o Banco Master, conforme apontado por diversos participantes do mercado, assemelha-se à importância de grandes operações de atacado.
Caso as plataformas decidam alterar suas recomendações ou descontinuar a distribuição de papéis de um determinado banco, a instituição pode ser confrontada com severos desafios de liquidez. Alexandre Albuquerque, analista sênior da Moody’s Ratings, observa que, embora as plataformas tenham contribuído para a redução de custos e a diversificação do funding para bancos de médio porte, a captação através de terceiros é inerentemente menos estável do que a realizada diretamente pelo próprio banco, devido à possibilidade de a plataforma interromper a distribuição dos produtos a qualquer momento.
O Banco Central já havia tomado uma medida em agosto passado, quando decidiu dobrar a alíquota de contribuição ao FGC paga por bancos que captam volumes significativos de recursos utilizando a garantia do fundo como atrativo principal. Essa medida, contudo, só entrará em vigor em 1º de junho de 2026 e foi considerada “tímida” pelo mercado em sua reação inicial. A busca por maior proteção e clareza é uma prioridade constante para reguladores financeiros globais, a fim de salvaguardar a estabilidade do sistema e os interesses dos investidores. Para mais informações sobre a regulação do mercado financeiro e a proteção ao investidor, o Banco Central disponibiliza em seu site oficial, seção de proteção ao investidor, detalhes sobre seus mecanismos de supervisão.
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A reformulação da abordagem em relação à remuneração de corretoras de CDBs e outros títulos bancários reflete a intenção do Banco Central em garantir um mercado financeiro mais transparente e justo. O objetivo final é equilibrar a inovação e o crescimento das plataformas de investimento com a proteção necessária aos investidores, evitando que o desejo por rentabilidades elevadas mas de alto risco leve a perdas significativas. Para se manter atualizado sobre as últimas decisões e análises no cenário econômico e financeiro, continue acompanhando nossa editoria de Economia.
