PT gasta R$ 8,2 milhões com empresas de ex-dirigente

O Partido dos Trabalhadores (PT) realizou pagamentos superiores a R$ 8,2 milhões para empresas vinculadas a um dirigente partidário que, formalmente, permaneceu em sua função por quase quatro anos após solicitar o desligamento. Os montantes foram direcionados para as companhias de George Barcelos, especificamente a Log Produções & Filmes e a Dindue, entre agosto de 2021 – mês do pedido de substituição no diretório estadual do Distrito Federal – e abril de 2025, cobrindo serviços de audiovisual, tecnologia da informação e comunicação.

Do total desembolsado, uma expressiva parcela de R$ 7,6 milhões foi gasta enquanto Barcelos ainda constava como membro do diretório do PT-DF, apesar de seu pedido para deixar o cargo. As contratações das empresas continuaram mesmo depois que o processo de sua remoção foi finalmente formalizado junto ao Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal (TRE-DF).

PT gasta R$ 8,2 milhões com empresas de ex-dirigente

A investigação conduzida pela Folha revelou que os valores, já corrigidos pela inflação, referem-se exclusivamente a contratos diretos firmados entre o PT nacional e as duas empresas mencionadas. Adicionalmente, durante o período analisado, a Log Produções também recebeu R$ 194 mil da Urissanê, companhia do marqueteiro Otávio Antunes, para prestar serviços que beneficiavam o Partido dos Trabalhadores, configurando uma triangulação inicial em parte das operações.

Ambos George Barcelos e o PT refutaram a existência de conflito de interesses nas contratações realizadas. O PT-DF esclareceu, em nota, que Barcelos foi desvinculado do cargo em agosto de 2021, mas justificou a demora de quatro anos para notificar o TRE-DF alegando “desorganização burocrática” e problemas administrativos do diretório regional. A Urissanê, por sua vez, optou por não se manifestar sobre os questionamentos feitos pela reportagem.

Natureza dos Serviços Contratados

Desde 2021, a Log Produções estabeleceu mais de 200 contratos com o PT para uma variedade de serviços, incluindo direção, produção, captação e transmissão ao vivo de eventos do partido. Estes serviços englobaram recursos de acessibilidade como intérpretes de libras e legendas para vídeos, além do aluguel de equipamentos especializados. Dentre as contratações de destaque, a empresa foi responsável pela transmissão da cerimônia de posse do Presidente Lula em janeiro de 2023, nos canais oficiais do PT, um contrato que totalizou R$ 51 mil.

Em 2025, apenas no intervalo entre janeiro e setembro, a Log Produções já havia recebido R$ 1,4 milhão do partido, distribuídos em 29 diferentes contratos. Os mais volumosos, cada um no valor de R$ 120 mil, corresponderam a serviços técnicos fornecidos nos meses de maio, junho e julho do mesmo ano. A diversidade e continuidade desses serviços ressaltam a dependência do partido por estas operações, principalmente no setor de comunicação.

A outra empresa de George Barcelos, a Dindue, assinou 15 contratos com o partido em 2024 e 2025, focados em soluções de tecnologia. No ano anterior, a Dindue foi contratada por R$ 37 mil para o desenvolvimento do site da federação Brasil Esperança, composta pelo PT, PC do B e PV. A empresa também assumiu a criação de aplicativos, uma plataforma de rádio online e uma loja virtual oficial do partido, expandindo sua atuação no ecossistema digital da sigla.

Trajetória de George Barcelos no Partido dos Trabalhadores

George Barcelos integra o diretório do PT-DF desde abril de 2015 e já exerceu importantes funções internas, como secretário de finanças e secretário de comunicação. Sua filiação ao partido data da adolescência, e ele revelou ter sido criado entre o Rio Grande do Sul e Brasília, ambientes que moldaram sua trajetória política.

A aproximação com figuras proeminentes do PT ocorreu durante sua militância no movimento estudantil, período em que estabeleceu contato com o atual deputado federal Paulo Pimenta (RS), ex-ministro da Secretaria de Comunicação do governo Lula. Antes disso, Barcelos atuou como conselheiro tutelar e posteriormente como secretário adjunto da Secretaria da Criança e do Adolescente na administração de Agnelo Queiroz (2011-2014) no Distrito Federal.

Imagem: www1.folha.uol.com.br

O primeiro acordo da Log Produções com o PT foi mediado pela Urissanê em maio de 2021, no contexto da pandemia, visando a implantação do projeto Elas por Elas, iniciativa voltada à participação feminina na política, através de palestras em vídeo, criação de website e produção de conteúdo. A partir do mês seguinte, a empresa de Barcelos passou a ser contratada diretamente pelo partido para serviços semelhantes em outras esferas.

Alegação de Não Conflito de Interesses e Justificativa

Barcelos explicou a mudança para contratação direta pelo PT ao relatar que, inicialmente, a intermediação pela Urissanê gerava uma dupla tributação (imposto da empresa e seu próprio) para um serviço que, em sua essência, era destinado ao PT. Dessa forma, ele sugeriu a contratação direta para otimizar o processo, evitando essa sobrecarga fiscal.

Segundo o ex-dirigente, sua expertise em informática o levou a ser convocado para oferecer suporte técnico em um período em que o partido intensificou a realização de eventos em vídeo, impulsionados pela pandemia de Covid-19. Um exemplo foi o auxílio da Log na transmissão do evento de 42 anos do partido, em fevereiro de 2022, que envolveu a participação remota de diversos líderes partidários de suas residências.

À época desses eventos, Barcelos acreditava que já não era mais integrante do quadro de dirigentes do PT-DF. Embora não enxergasse qualquer impedimento legal para suas contratações, dado que sua atuação no diretório não era remunerada, ele optou por pedir formalmente seu desligamento da direção regional alguns meses após iniciar os serviços para o partido, justamente para evitar potenciais constrangimentos.

Evidências apresentadas à Folha, incluindo trocas de mensagens e e-mails por WhatsApp, confirmam o pedido de Barcelos para ser removido de sua função em agosto de 2021. Ele relatou que foi excluído de grupos de WhatsApp e deixou de participar de reuniões. A falta de formalização no TRE-DF só foi notada por Barcelos quando ele verificou sua filiação para votar nas eleições internas do partido em 2025. Após questionar a morosidade, foi informado que o processo era burocrático e que a equipe havia “se esquecido” de efetivar a mudança junto ao órgão eleitoral, o que demonstra a complexidade de processos burocráticos internos de grandes partidos, como o Partido dos Trabalhadores, na comunicação com órgãos externos como o Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal.

O PT-DF, em sua declaração oficial, corroborou o pedido de desligamento de Barcelos da direção estadual em 2021, explicando que, além da pandemia, o diretório passava por uma reorganização interna com restrições financeiras. Esses fatores, segundo a nota, “ocasionaram à época, o rompimento do contrato de toda equipe e, consequentemente, uma desorganização burocrática”, reiterando que a notificação ao TRE-DF demorou por “problemas administrativos do Diretório Regional”. Por sua vez, o PT nacional, em comunicado, afirmou não haver “qualquer indício de conflito de interesses ou favorecimento indevido” nas contratações envolvendo Barcelos, assegurando que os pagamentos são “devidamente comprovadas e vinculadas às atividades partidárias”, e que a posição anterior do sócio em instância partidária diferente da nacional “não incluía qualquer participação em decisões administrativas ou contratuais da direção do partido”.

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Este levantamento detalhado sobre as despesas do PT com empresas ligadas a um de seus ex-dirigentes ressalta a importância da transparência nos gastos partidários e nos processos burocráticos. Continue acompanhando nossa editoria de Política para se manter informado sobre as últimas movimentações e análises do cenário político brasileiro.

Crédito da imagem: Diego Padgurschi – 1.abr.16/Folhapress