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Gilcéria de Oliveira: Advogada Enfrentou Ditadura e Direitos Humanos

A advogada Gilcéria de Oliveira, figura destemida e emblemática na defesa dos direitos humanos durante o período da ditadura militar no Brasil, faleceu aos 93 anos de idade. Conhecida carinhosamente como Ceres, sua partida, ocorrida em 23 de agosto, encerra uma trajetória marcada por uma incansável dedicação à justiça e à igualdade, princípios que nortearam […]

A advogada Gilcéria de Oliveira, figura destemida e emblemática na defesa dos direitos humanos durante o período da ditadura militar no Brasil, faleceu aos 93 anos de idade. Conhecida carinhosamente como Ceres, sua partida, ocorrida em 23 de agosto, encerra uma trajetória marcada por uma incansável dedicação à justiça e à igualdade, princípios que nortearam sua vida pessoal e profissional até os seus últimos dias.

Mesmo na fase derradeira da vida, a paixão de Gilcéria pela advocacia permanecia intacta. Todas as manhãs, um ritual meticuloso se repetia: o perfume, a escuta atenta das notícias enquanto se aprontava e a ida diária para o escritório, um hábito que ela manteve até poucos meses antes de seu falecimento. Frequentemente, a advogada manifestava o desejo de se aposentar, mencionando ter apenas “alguns processos” pendentes. No entanto, sua intrínseca conexão com a profissão e seu profundo senso de responsabilidade a levavam a adiar continuamente essa decisão, demonstrando uma vitalidade e comprometimento raros.

Gilcéria de Oliveira: Advogada Enfrentou Ditadura e Direitos Humanos

Nascida em Ribeirópolis, uma cidade localizada no interior de Sergipe, Gilcéria viu sua família buscar novas oportunidades econômicas, migrando para o interior de São Paulo. Seu pai, um produtor de algodão, enxergava no Sudeste brasileiro a promessa de expandir seus negócios. Em uma decisão que divergia da expectativa paterna, sua irmã mais nova, determinada a ingressar na faculdade de Sociologia na capital, a convenceu a acompanhá-la. Foi então na vibrante metrópole paulistana que Gilcéria ingressou e se formou na renomada Faculdade de Direito do Largo São Francisco, pavimentando o caminho para sua ilustre carreira jurídica.

Seus princípios de justiça e igualdade eram a força motriz de todas as suas ações e convicções. Conforme recorda sua sobrinha-neta, Verônica Rosa, “Ela tinha um senso de justiça e igualdade que aparecia em tudo que ela falava. Esses valores sempre foram muito importantes para ela”. Tal senso aflorou de forma ainda mais veemente durante o obscuro período da ditadura militar no Brasil, quando Gilcéria utilizou sua formação jurídica para amparar aqueles que eram perseguidos e encarcerados pelo regime.

Com um destemor notável, a advogada Gilcéria de Oliveira prestou assistência jurídica essencial, arriscando-se para ajudar pessoas a se esconderem e a fugirem de perseguições. Entre as figuras que se beneficiaram de sua corajosa atuação, destaca-se o padre José Oscar Beozzo. Quando a prisão de Beozzo foi decretada, Ceres agiu com maestria e determinação. Ela garantiu que o religioso conseguisse viajar do Rio de Janeiro para São Paulo, de onde ele partiu em segurança para o exílio na Europa, salvaguardando sua liberdade e vida.

Após o falecimento de Gilcéria, o padre Beozzo expressou sua gratidão e admiração em palavras comoventes. Ele descreveu Ceres como alguém que “sabia ouvir quem precisasse de uma orientação e esclarecimento”, destacando sua sensibilidade e acuidade. Beozzo também relembrou o “constante socorro com raro destemor e valentia” que a advogada oferecia durante a ditadura militar, atribuindo sua coragem a uma fé inabalável “que se desdobrava em gestos de solidariedade e teimoso esperançar”, uma prova de sua humanidade e resiliência em tempos sombrios.

Com o fim da ditadura militar, o compromisso de Gilcéria com a causa dos direitos humanos não arrefeceu. Ela continuou a trabalhar de forma voluntária em diversas organizações que promoviam a justiça social e a defesa da dignidade humana. Sua atuação incluiu colaborações com instituições respeitadas como o Centro Oscar Romero e a Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, além de outras fundações dedicadas aos direitos humanos e, notavelmente, ao direito do negro, reforçando sua luta por uma sociedade mais equitativa.

Gilcéria de Oliveira: Advogada Enfrentou Ditadura e Direitos Humanos - Imagem do artigo original

Imagem: www1.folha.uol.com.br

Por aproximadamente dez anos, Gilcéria dedicou seu tempo e conhecimento a uma fundação com forte engajamento na luta antirracista. Como advogada voluntária, ela realizou importantes trabalhos, incluindo a elaboração de inventários de bens, como o do operário Santo Dias, que tragicamente foi assassinado durante o regime militar. Essa atuação demonstrou seu engajamento prático e sua dedicação em garantir justiça e reparação, mesmo para casos ocorridos sob o arbítrio.

Para além de sua vida profissional e militante, Ceres cultivava interesses pessoais ricos e variados. Era uma ávida leitora de biografias, absorvendo histórias de vida que, talvez, a inspirassem em sua própria jornada. Também apreciava as obras de autores latino-americanos, com especial gosto por Alejo Carpentier. Acompanhar as notícias era outro de seus hábitos diários, mantendo-se sempre informada sobre o cenário mundial. Sua vida foi enriquecida por viagens para diversos países na Europa, América Latina e Oriente Médio, muitas vezes combinando suas descobertas culturais com sua profunda fé católica, que também foi um pilar de sua força e resiliência.

O legado de Gilcéria de Oliveira, uma advogada que simbolizou a resistência e a busca por justiça, permanece vivo. Ela partiu deixando sua irmã Zelda, sobrinhos, sobrinhos-netos e um vasto círculo de amigos e colegas que foram tocados por sua inabalável atuação profissional e militante. Seu exemplo de dedicação aos valores humanitários serve como um lembrete perene da importância da luta por uma sociedade mais justa e igualitária, em contraste com a repressão vivenciada na ditadura militar no Brasil.

Confira também: artigo especial sobre leis e valortrabalhista

A história de Gilcéria de Oliveira é um testemunho da coragem e da convicção de uma mulher que não se curvou às adversidades, usando a lei como ferramenta para defender os oprimidos. Sua vida e obra ressoam como um chamado à vigilância e à constante defesa dos direitos e da liberdade. Continue explorando mais sobre as grandes figuras da política e sociedade brasileira em nossa editoria de Análises.

Crédito da imagem: Arquivo Pessoal

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