Operação Spare: Ligações PCC e Franqueado Boticário Investigadas
A **Operação Spare**, deflagrada na última quinta-feira (25 de setembro de 2025), veio a reforçar uma constatação preocupante: a infiltração do crime organizado na economia formal e suas variadas ramificações em diferentes setores. A ação policial complementa a Operação Carbono Oculto, de 28 de agosto, que tinha como foco a cadeia de combustíveis, mas expande a investigação para segmentos como o de perfumaria e cosméticos, construção civil e redes de motéis, todos alvos de atividades suspeitas de lavagem de dinheiro.
No bojo das investigações, autoridades identificaram elos entre Maurício Soares de Oliveira, que atua como franqueado de O Boticário e seria proprietário de cerca de cem unidades da marca, e Flávio Silvério Siqueira. Este último é apontado como um dos principais operadores do Primeiro Comando da Capital (PCC) no esquema de lavagem de dinheiro, sendo um dos alvos centrais de busca e apreensão durante a recente operação. A equipe jurídica de Siqueira não pôde ser contatada para comentar as acusações.
Operação Spare: Ligações PCC e Franqueado Boticário Investigadas
É crucial destacar que não existem indícios que liguem diretamente a empresa dona de O Boticário a quaisquer facções criminosas. As operações suspeitas foram identificadas especificamente nas lojas administradas por Maurício Soares de Oliveira. Investigadores notaram a proximidade entre Oliveira e familiares de Silvério, um modus operandi frequente do crime organizado que utiliza empresas, familiares e amigos como interpostas pessoas para camuflar suas atividades ilícitas. Em um comunicado à Folha de S.Paulo, a assessoria de imprensa do Grupo Boticário assegurou que a rede implementa políticas rigorosas de prevenção à lavagem de dinheiro e anticorrupção, além de possuir um código de conduta que exige o total cumprimento da legalidade. A nota ainda frisou que “O Grupo Boticário não tinha conhecimento e tampouco tem responsabilidade sobre as ações ilícitas denunciadas na Operação Spare, que incluem as acusações referentes a Maurício Soares de Oliveira, sócio de uma empresa terceira que possui participação em lojas franqueadas.” A rede franqueadora, conforme explicado, não detém controle sobre as operações detalhadas de cada loja franqueada ou sobre o destino dos resultados financeiros. O contato com Maurício de Oliveira não foi estabelecido pela reportagem.
Lavagem de Dinheiro via Franquias e Movimentações Financeiras
A linha de investigação do Ministério Público de São Paulo e da Receita Federal sugere que o franqueado estaria utilizando suas diversas unidades de O Boticário para a lavagem de capitais ilícitos. Análises de histórico de transações revelaram um elevado número de operações envolvendo dinheiro em espécie nos estabelecimentos de Oliveira, persistindo até mesmo no período crítico da pandemia, quando a circulação de pessoas estava severamente restringida.
Tais movimentações não passaram despercebidas pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), um órgão de inteligência vinculado ao Banco Central. O conselho apontou mais de R$ 4 milhões em depósitos feitos em espécie e um crescimento notável da receita bruta das lojas, que também apresentavam montantes elevados de lucros acumulados, mesmo diante do cenário econômico desafiador imposto pela crise sanitária. Esse padrão de transações levantou fortes suspeitas de que os estabelecimentos eram usados como fachadas para introduzir recursos de origem duvidosa no sistema financeiro legal.
As autoridades conseguiram rastrear laços pessoais estreitos entre Maurício de Oliveira, Flávio Silvério e seus respectivos familiares. Um exemplo flagrante envolve Eduardo Silvério, irmão de Flávio, que teria declarado um empréstimo de R$ 1,5 milhão junto a Oliveira para justificar um aumento considerável de seu patrimônio. Outro indicativo foi a compra de um helicóptero por Oliveira em fevereiro de 2020. Na mesma data de emissão da nota fiscal, a empresa da irmã de Silvério, Adriana, efetuou a aquisição de combustível de aviação, sugerindo que o helicóptero poderia ter sido adquirido por Oliveira em nome de Silvério. Adicionalmente, comprovantes mostraram que familiares de ambos os envolvidos adquiriram passagens aéreas em conjunto, consolidando os indícios de um vínculo comportamental e operacional entre os dois empresários.
Reações e Detalhes da Investigação
Apesar da consistência dos indícios levantados, ao analisar os pedidos de busca e apreensão, a Justiça inicialmente considerou que a inclusão de Maurício de Oliveira na operação seria uma “extensão prematura da investigação”. O entendimento judicial, “ao menos por ora”, avaliou o vínculo entre os dois empresários como “raso”. Contudo, o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) manteve sua argumentação, defendendo que a medida era essencial para a salvaguarda de possíveis provas que estivessem em poder de Oliveira, reiterando que os elementos anexados ao processo eram suficientes para justificar a ação. Por fim, não foram realizadas buscas e apreensões nas dependências de Maurício Soares de Oliveira.
Setor Imobiliário e Sociedades em Conta de Participação
Além das franquias de perfumaria, a Operação Spare também lançou luz sobre o envolvimento do braço criminoso no setor da construção civil, com evidências de erguimento de prédios, especialmente na região da Baixada Santista. O esquema replicava um modelo já conhecido de facções no setor imobiliário: a utilização de Sociedades em Conta de Participação (SCP).

Imagem: www1.folha.uol.com.br
Este arranjo societário, previsto no Código Civil, funciona como um meio de captar recursos para empreendimentos imobiliários. A SCP é composta por um sócio ostensivo — tipicamente uma construtora — e os verdadeiros sócios investidores, que permanecem ocultos. Nos casos sob investigação, esses investidores ocultos tinham ligações diretas com o crime organizado. Apesar disso, as investigações não conseguiram apurar se as construtoras participantes tinham ciência da origem ilícita dos recursos, razão pela qual seus nomes foram mantidos em sigilo.
Motéis como Ferramenta de Lavagem Bilionária
O fluxo de capitais ilícitos no setor imobiliário também conduziu a Operação Spare a uma complexa rede de motéis. Alguns desses estabelecimentos despertaram atenção das autoridades ao serem identificados adquirindo terrenos para a construção de novas unidades. A apuração revelou que mais de 60 motéis na Grande São Paulo e na Baixada Santista eram sistematicamente usados para lavar bilhões de reais no âmbito do esquema criminoso. Para os investigadores, o setor foi escolhido estrategicamente pela sua tradicional movimentação de grandes volumes de dinheiro em espécie.
O modus operandi consistia em empregar esses motéis como “portas de entrada” para introduzir valores de origem ilegal na economia formal. As movimentações financeiras registradas nas contas bancárias dos estabelecimentos superavam consideravelmente os valores declarados por eles como receita. Assim, o dinheiro proveniente de atividades criminosas era habilmente disfarçado como faturamento legítimo, mesmo que a disparidade entre os depósitos bancários e a receita declarada ao Fisco fosse flagrante.
A estrutura delituosa assegurava que os vultosos lucros ilegais fossem posteriormente reinvestidos na aquisição de bens de luxo. Os motéis, cuja receita principal deveria ser exclusivamente a hospedagem, foram flagrados comprando bens que eram alheios à sua atividade hoteleira, incluindo imóveis, terrenos, lanchas e helicópteros. A investigação detalhou o emprego de “laranjas” e obteve comprovantes irrefutáveis que demonstraram que os reais beneficiários desses pagamentos eram Flávio Silvério Siqueira e Eduardo Silvério. Os terrenos onde se localizam os motéis são avaliados em mais de R$ 20 milhões, com destaque para duas aquisições recentes de imóveis de alto padrão: um no valor de R$ 1,8 milhão, comprado em 2021, e outro de R$ 5 milhões, adquirido em 2023. Tentativas de contato com os administradores desses motéis pela reportagem não obtiveram sucesso.
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Em suma, a Operação Spare evidenciou a sofisticação da atuação do crime organizado na capilaridade de diferentes segmentos da economia, revelando desde o uso de franqueados de grandes marcas até complexos esquemas em setores como construção e motéis para a lavagem de dinheiro em larga escala. A complexidade da atuação do crime organizado no país, demonstrada neste caso, reforça a necessidade de vigilância constante das autoridades para proteger a integridade do sistema econômico. Para aprofundar-se em investigações e análises sobre o cenário de segurança pública no país, explore mais conteúdos em nossa seção de Política, ou se preferir, acesse a página sobre o Primeiro Comando da Capital na Wikipédia para mais detalhes sobre a organização criminosa.
Crédito da Imagem: Divulgação/Receita Federal
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