A recente imposição da Taxa Trump para Visto H-1B, um montante de US$ 100 mil (equivalente a cerca de R$ 532 mil) para novos solicitantes, tem provocado reações díspares e intensos debates no vibrante setor tecnológico dos Estados Unidos. Assinada por decreto na sexta-feira (19) pelo ex-presidente Donald Trump, esta medida visa trabalhadores estrangeiros qualificados, e suas consequências financeiras se desenham de forma notavelmente diferente para as empresas, delineando uma linha clara entre os gigantes consolidados da tecnologia e as inovadoras, mas financeiramente vulneráveis, startups.
A repercussão dessa política foi sentida imediatamente em diversos segmentos. Selin Kocalar, de 21 anos, diretora de operações da Delve, uma promissora startup de inteligência artificial baseada em São Francisco, exemplifica a apreensão. Kocalar soube da novidade através de um novo colaborador que acabara de ter seu visto H-1B aprovado. Sua preocupação gira em torno de como a taxa impactará a capacidade da empresa de contratar talentos vitais para suas operações, especialmente considerando que a Delve, com 23 funcionários e US$ 35 milhões em financiamento, opera com um orçamento restrito.
Taxa Trump para Visto H-1B Afecta Startups de Tecnologia
“Como startup, você está sempre com o caixa apertado. Então você não pode simplesmente sair e gastar muito dinheiro ou ter o tipo de luxo que você veria em uma empresa maior”, explicou Kocalar, ressaltando o desafio enfrentado pelas companhias emergentes diante da elevada taxa imposta por esta política de imigração de talentos. Essa perspectiva contrasta veementemente com a tranquilidade demonstrada por Reed Hastings, presidente e cofundador da Netflix, que elogiou a iniciativa de Trump em suas redes sociais no domingo.
Hastings classificou o “imposto de US$ 100 mil por ano de Trump” como “uma ótima solução”, defendendo que ele garantirá que o visto H-1B será utilizado apenas para “empregos de altíssimo valor”. Para a Netflix, uma corporação com aproximadamente 14 mil colaboradores, receitas superiores a US$ 11 bilhões e um lucro líquido de US$ 3,1 bilhões no trimestre mais recente, absorver esse custo adicional representa um impacto mínimo em suas robustas finanças. Essa dualidade expõe o caráter divisor da medida no ambiente de tecnologia.
O setor de tecnologia dos EUA emprega milhares de engenheiros de software, especialistas em IA e outros profissionais estrangeiros através dos vistos H-1B, e a nova regulamentação cria uma hierarquia notável. As megacorporações dispõem dos recursos necessários para custear a taxa, mantendo sua vantagem na aquisição de talentos globais. Em contrapartida, as startups, frequentemente limitadas por orçamentos de financiamento e sob pressão constante para otimizar cada gasto, veem sua capacidade de atrair e reter especialistas altamente qualificados severamente comprometida. A balança pende perigosamente para os gigantes bilionários.
Essa mudança política ameaça o ecossistema tecnológico norte-americano em seu cerne. O Vale do Silício, em particular, depende intrinsecamente do contínuo surgimento de startups para catalisar novas ideias e desenvolver tecnologias disruptivas, que eventualmente podem evoluir para empresas de grande porte. A acessibilidade a talentos globais é um pilar desse crescimento, e sua restrição impõe um freio significativo à inovação. Como afirma Aizada Marat, CEO da Alma, uma startup de serviços jurídicos de imigração localizada em Palo Alto, Califórnia: “Isso será um golpe desproporcional para empresas menores porque não podemos competir com OpenAI e Meta.”
A Alma, que levantou US$ 5,5 milhões em financiamento e é igualmente dependente de mão de obra estrangeira qualificada, está na linha de frente dessas preocupações. Marat é enfática ao prever que, caso a taxa se mantenha, sua empresa estará impossibilitada de contratar via programa de visto H-1B. Esse cenário de estrangulamento da base de talentos para novas empresas pode, em última análise, enfraquecer a liderança tecnológica dos EUA em um momento crítico, especialmente com a crescente disputa em inteligência artificial com a China. Os custos administrativos e legais de um visto H-1B, estimados em cerca de US$ 10 mil antes da nova taxa, já eram um obstáculo para muitas pequenas empresas.
Jihan Merlin, chefe de estratégia de imigração da Alma, pondera que, embora os efeitos diretos não sejam instantâneos, “mudanças políticas como esta fazem as pessoas pensarem duas vezes antes de trazerem suas empresas para os EUA”. Ele adiciona: “E com o tempo isso vai mudar nossa competitividade como país”. Historicamente, líderes de tecnologia e políticos já reconheciam a necessidade de reformar o sistema H-1B, que operava por loteria e limitava a concessão a 85 mil vistos anuais, visando atrair e reter talentos.
Em junho de 2024, Trump, durante sua campanha presidencial, havia sinalizado um entendimento das complexidades ao propor que graduados de universidades ou faculdades americanas recebessem um green card para viver e trabalhar no país. Embora essa ideia tenha encontrado resistência entre alguns de seus apoiadores, a declaração de Trump no podcast “The All-In Podcast” – “Você precisa de um grupo de pessoas para trabalhar para suas empresas. Você tem ótimas empresas, e elas precisam de pessoas inteligentes” – destacava a importância de talentos para o desenvolvimento empresarial. Essa abordagem contrastou com a política recém-implementada, focada em onerar a contratação.
Trevor Traina, empresário de São Francisco e ex-embaixador durante a primeira presidência de Trump, caracterizou as recentes modificações no H-1B como uma “proposta inicial” para instigar uma reavaliação mais ampla da política de imigração. Ele expressou a esperança de que o setor tecnológico, beneficiário de mais vistos para trabalhadores qualificados estrangeiros, veja a medida como um catalisador para uma “boa solução de longo prazo”. Contudo, nem todos compartilham esse otimismo. A mudança política tem sido vista por alguns especialistas como um disruptor crítico ao fluxo de talentos tecnológicos de ponta que alimentam a inovação nos EUA, potencialmente comprometendo sua vantagem na acirrada corrida global pela IA. Para entender mais sobre a política de imigração americana e os programas de vistos, pode-se consultar diretamente o Serviços de Cidadania e Imigração dos EUA (USCIS).
Bilal Zuberi, de 49 anos, sócio-gerente da Red Glass Ventures, é um dos que veem a situação com ceticismo. Ele estima que entre 30 a 40 das empresas de seu portfólio de investimentos, representando quase metade, serão diretamente afetadas por essas novas diretrizes. Zuberi adverte que “interromper isso é realmente dar um tiro no próprio pé”, sugerindo que as startups, ao invés de simplesmente contratarem exclusivamente americanos, buscarão soluções alternativas, como a utilização do programa de visto O-1, destinado a talentos extraordinários, ou a expansão de escritórios para países como o Canadá, permitindo a contratação de funcionários remotos, um método já adotado em muitos mercados globais de tecnologia.
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Em suma, a nova taxa de US$ 100 mil imposta pela administração Trump para o visto H-1B para cientistas e engenheiros qualificados criou uma polarização sem precedentes no setor de tecnologia dos EUA. Enquanto gigantes como a Netflix podem absorver facilmente o custo, startups vitais para a inovação enfrentam um desafio existencial para atrair talentos, potencialmente comprometendo a competitividade tecnológica do país. Continue explorando as complexidades das políticas econômicas e seus impactos no cenário empresarial e político nacional, visitando nossa editoria de Economia.
Crédito da imagem: Carolyn Fong – 25.jul.25/NYT
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