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Defesa Utiliza Referências Literárias em Julgamento da Tentativa de Golpe de Estado no STF

Facebook Twitter Pinterest LinkedIn**Advogados de defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete réus incorporaram uma estratégia pouco convencional durante o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a acusação de uma tentativa de golpe de Estado em 2022. Ao longo dos debates que se estenderam por “ontem e esta quarta-feira (3)”, os defensores recorreram … Ler mais

**Advogados de defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete réus incorporaram uma estratégia pouco convencional durante o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a acusação de uma tentativa de golpe de Estado em 2022. Ao longo dos debates que se estenderam por “ontem e esta quarta-feira (3)”, os defensores recorreram a figuras proeminentes da literatura brasileira e internacional, como Fernando Pessoa, Gonçalves Dias e Émile Zola, buscando embasar seus argumentos diante da primeira turma do STF.**

O julgamento, que busca esclarecer a alegada conspiração golpista, tem se desenrolado com intervenções que mesclam o direito com a arte e a história. As citações não apenas surpreenderam pela inusitada abordagem, mas também geraram comentários entre os ministros da corte, adicionando uma camada cultural ao processo judicial. A defesa procura, por meio dessas analogias, reformular a narrativa dos fatos e contestar a natureza das acusações imputadas a seus clientes.

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**O Caso Dreyfus e o “J’accuse!” na Defesa de Bolsonaro**

O advogado Paulo Cunha Bueno, responsável pela defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro, trouxe à tona uma das referências mais emblemáticas ao comparar o atual julgamento a uma versão brasileira do célebre Caso Dreyfus. Encerrando sua fala com essa analogia, Bueno argumentou que o processo em questão possuiria um caráter político.

**Contexto Histórico do Caso Dreyfus**
O escândalo francês, ocorrido no final do século XIX, girou em torno da condenação injusta do capitão Alfred Dreyfus, um oficial judeu, sob acusação de traição, por supostamente ter repassado informações secretas para a Alemanha. Posteriormente, descobriu-se que o verdadeiro culpado era outro militar. Após anos de luta pela sua inocência, Dreyfus foi exonerado das acusações e reintegrado ao Exército. Essa história é mundialmente conhecida pela intervenção do escritor Émile Zola, que publicou a famosa carta aberta “J’accuse!” (Eu Acuso!) em um jornal francês.

**A Intervenção de Émile Zola**
Apesar de a defesa não ter citado uma obra específica de Zola, o ministro Flávio Dino, ao comentar o excesso de citações literárias no segundo dia de julgamento, mencionou o autor, fazendo uma ligação direta com o Caso Dreyfus. Zola, em seu influente manifesto, denunciou veementemente a tentativa de oficiais em acobertar a verdade sobre o caso, evidenciando a existência de responsáveis por um erro judicial que culminou no processo e na subsequente condenação de Dreyfus. A utilização dessa comparação por Paulo Cunha Bueno parece buscar semelhanças entre o suposto caráter injusto ou politizado do caso Dreyfus e o julgamento atual dos acusados na trama do golpe. A estratégia da defesa de Bolsonaro, ao evocar o histórico de injustiça e manipulação de informações associado ao Caso Dreyfus, visa lançar dúvidas sobre a imparcialidade do processo e a validade das acusações, sugerindo um viés que poderia distorcer a justiça, de maneira similar ao que ocorreu na França do século XIX.

**O Canto Guerreiro de I-Juca Pirama para um General**

Outra citação que marcou os debates foi a do poema épico-dramático “I-Juca Pirama”, de Gonçalves Dias. O advogado Andrew Fernandes Farias, defensor do general Paulo Sérgio Nogueira, recorreu aos versos clássicos da literatura brasileira para enaltecer a figura de seu cliente.

**”Sou bravo, sou forte…” – A Adaptação no Julgamento**
Durante sua explanação, Fernandes Farias recitou: “Sou bravo, sou forte, Sou filho do Norte; Meu canto de morte; Guerreiros, ouvi.” Com essas palavras, o advogado buscou descrever o general Nogueira como um guerreiro nascido no Nordeste, evocando uma imagem de força e bravura.

**A Jornada de Redenção em I-Juca Pirama**
A obra original, “I-Juca Pirama”, narra a complexa jornada de um protagonista que precisa provar seu valor e recuperar a honra de guerreiro perante seu pai cego e sua tribo, os Timbiras. No poema, I-Juca Pirama, um tupi prisioneiro, demonstra compaixão e fidelidade ao poupar seu pai da dor de perdê-lo em batalha, contrariando as expectativas tribais. Ele é visto como fraco inicialmente, mas sua atitude é, no final, compreendida como um ato de verdadeira honra e coragem. Ao traçar esse paralelo, a defesa de Nogueira buscou associar seu cliente às qualidades heroicas e à resiliência do personagem de Gonçalves Dias, sugerindo que, como I-Juca Pirama, o general poderia estar passando por um momento de desafio em que sua honra precisa ser reafirmada e sua verdadeira índole de guerreiro compreendida. A recitação dos versos procurou sublinhar a origem e a fortitude do general, alinhando sua defesa a uma figura histórica de luta e provação, que, apesar das adversidades, demonstra grande caráter.

**Fernando Pessoa e a Crítica à Hipocrisia Social**

O advogado Andrew Fernandes Farias, que defende o general Paulo Sérgio Nogueira, também citou Fernando Pessoa, mais especificamente trechos do “Poema em Linha Reta”. Contudo, ao recitar no plenário, o advogado admitiu ter misturado estrofes e inventado alguns versos para adaptar à sua argumentação.

**A Reinterpretação no Julgamento**
A fala do advogado incluía os seguintes versos adaptados: “Nunca vi quem tivesse falado uma bobagem, todos os meus amigos são príncipes e semideuses, todo mundo é sempre elegante”. Ele utilizou esse trecho para qualificar uma afirmação do réu de que a ‘Comissão de Transparência das Eleições (CTE) é para inglês ver’ como um momento de “delicadeza”.

**”Poema em Linha Reta” e a Honestidade sobre os Defeitos**
De acordo com análises literárias, o “Poema em Linha Reta” de Fernando Pessoa é uma crítica pungente à hipocrisia social e à fachada de perfeição alardeada por aqueles que cercam o eu lírico. Na obra, Pessoa expõe a vaidade humana e o temor de mostrar fragilidades, defendendo abertamente a honestidade e a aceitação dos próprios defeitos e limitações. O eu lírico desafia a tendência de esconder imperfeições e de projetar uma imagem imaculada para a sociedade. A intenção original de Pessoa era desconstruir essa idealização superficial e promover uma autoanálise sincera.

Ao citar, ainda que de forma alterada, os versos de Fernando Pessoa, o advogado Fernandes Farias pareceu inverter o sentido original da crítica à hipocrisia, usando-os para, paradoxalmente, justificar uma observação considerada por ele como “delicada” por parte do general. A defesa tentou criar uma distinção, sugerindo que a fala do general sobre a “Comissão de Transparência das Eleições ser para inglês ver” não seria uma “bobagem”, mas sim uma expressão peculiar que mereceria uma interpretação menos literal e mais compreensiva. Essa estratégia visou proteger a imagem do general, usando a alusão literária, mesmo que modificada, para contextualizar uma declaração que poderia ser vista como controversa, enquadrando-a sob uma ótica de nuance e sensibilidade. A alusão buscou destacar que a verdade sobre as percepções do réu, embora possam soar atípicas, merecem consideração.

**Reações e Comentários do Ministro Flávio Dino**

A peculiaridade de ver advogados incorporando vastas referências literárias e históricas no tribunal não passou despercebida. O ministro Flávio Dino expressou sua curiosidade durante a fala do advogado Andrew Fernandes Farias, especialmente após as seguidas citações. Em um momento descontraído, enquanto o advogado falava sobre sua sogra, Dino interveio: “Estou curioso… seu predecessor citou Dreyfus e Émile Zola, depois Gonçalves. Agora, sua sogra”, ilustrando o tom diferenciado que a defesa empregou nos últimos dias do julgamento.

Essas incursões na literatura, desde a crítica social e filosófica de Fernando Pessoa até a épica nacional de Gonçalves Dias e o impactante protesto de Émile Zola, marcam uma abordagem estratégica da defesa, buscando transcender o mero juridiquês para tocar em elementos humanos, históricos e morais.

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As intervenções dos advogados destacaram como a cultura e o conhecimento acumulado ao longo dos séculos podem ser convocados em contextos contemporâneos e complexos, mesmo em um julgamento de grande repercussão, onde os fatos são colocados sob a luz da justiça e da interpretação de elementos simbólicos para influenciar a percepção do caso. A tentativa de traçar paralelos entre o passado literário e a situação presente visa a humanizar os acusados e questionar as acusações sob uma ótica mais ampla e historicamente fundamentada.


FONTE: G1 Pop & Arte

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