A Paraíba marcou um avanço significativo na proteção de menores com a sanção da denominada ‘Lei Felca’, uma nova legislação voltada para o rigoroso combate à adultização de crianças e adolescentes. Assinada pelo governador João Azevêdo (PSB), a Lei nº 13.861 foi oficialmente publicada no Diário Oficial do Estado (DOE) na quarta-feira, 3 de setembro de 2025, e já está em plena vigência, visando estabelecer um novo padrão de segurança para o público infantil.
A nomeação da lei faz referência direta ao popular youtuber e humorista Felipe Bressanim Pereira, amplamente conhecido como Felca. A inspiração para a criação dessa legislação surgiu a partir de um vídeo de grande repercussão que o influenciador publicou. Nele, Felca denunciava de forma veemente a exposição sexualizada de menores de idade nas redes sociais, praticada por determinados influenciadores, incluindo o paraibano Hytalo Santos. O impacto do conteúdo viralizou, chamando a atenção para a urgência da regulamentação.
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**A Definição de Adultização e Seus Marcos Legais**
A Lei nº 13.861 é bastante clara em sua definição de adultização de crianças, caracterizando-a como qualquer modalidade de estímulo ou exposição que induza crianças com idade limite de doze anos a assumir atitudes, vocabulários, aspectos físicos ou encargos habitualmente associados à vida adulta. O texto legislativo detalha uma série de exemplos concretos que configuram essa prática prejudicial:
* **Uso inadequado de vestuário e adornos:** Isso abrange a utilização de roupas, acessórios, maquiagens ou outros adereços que carreguem uma conotação sexualmente sugestiva, inadequada para a fase infantil.
* **Participação em conteúdos com caráter sexual:** A inclusão de crianças em materiais midiáticos, acontecimentos públicos, representações artísticas ou campanhas promocionais que exibam elementos eróticos, sexuais ou violentos.
* **Exposição a linguagens e encenações impróprias:** Inclui a familiaridade com músicas, sequências de dança, padrões de comunicação e interpretações teatrais ou performáticas que não se adequam à respectiva faixa etária dos pequenos.
* **Estímulo a padrões de consumo e estéticos:** A promoção ou incentivo de hábitos de compra ou ideais de beleza que são comumente atribuídos aos adultos.
* **Relações afetivo-sexuais fora de contexto:** Qualquer forma de encorajamento ou estímulo a vínculos afetivo-sexuais que estejam descontextualizados e sejam incompatíveis com o adequado desenvolvimento da infância.
Esses pontos demonstram a abrangência da lei em proteger as crianças contra a perda de sua infância por meio de pressões sociais ou digitais que as forçam a se comportar como adultos.
**Responsabilidades Estatais e Proibições Impostas pela Lei**
Com a nova legislação, o Estado da Paraíba assume a incumbência de instaurar políticas públicas de longa duração, desenvolver campanhas educativas abrangentes e estruturar programas contínuos direcionados ao combate da adultização. Além disso, a lei fortalece a fiscalização sobre eventos e quaisquer tipos de conteúdos que sejam destinados ao público infantil, assegurando que estejam em conformidade com as diretrizes de proteção. Um componente crucial da lei é a criação e manutenção de canais de denúncia acessíveis e eficientes, garantindo que cidadãos possam reportar irregularidades.
A lei também impõe uma proibição expressa quanto à exploração da imagem infantil em campanhas publicitárias, produções televisivas, materiais digitais ou criações culturais que resultem em situações de adultização. O objetivo é coibir a veiculação de quaisquer elementos que configurem essa exposição precoce e inadequada.
É importante ressaltar que houve um veto por parte do governador a um artigo específico da lei. Este artigo previa a obrigatoriedade de regulamentação da legislação por parte do Poder Executivo. O chefe do executivo estadual justificou a decisão afirmando que não seria cabível que uma iniciativa de origem parlamentar impusesse tal atribuição ao governo. Contudo, mesmo com o veto, a legislação entrou em vigor imediatamente após sua divulgação.
**Debates Sobre a Extensão da Proteção**
Durante o processo de discussão e aprovação da proposta no âmbito legislativo, o foco principal recaiu sobre a proteção das crianças até os doze anos. No entanto, o debate sobre a exploração sexual de adolescentes na faixa etária entre 13 e 17 anos não foi abordado de forma aprofundada. Quando questionado pela imprensa, o deputado Sargento Neto, um dos articuladores do projeto, manifestou a possibilidade de que uma emenda futura venha a incluir esse grupo no escopo da lei. Ele salientou, contudo, que a prioridade inicial da lei é resguardar a primeira infância, que, em suas palavras, “é o público mais atingindo quando tratamos de adultização”.
**O Caso Felca e Hytalo Santos: O Catalisador da Lei**
A cronologia de eventos que impulsionou a criação da ‘Lei Felca’ tem seu marco inicial na publicação do vídeo intitulado ‘Adultização’ por Felca, em 6 de agosto de 2025. O conteúdo do youtuber, que não foi monetizado, consistiu em uma séria denúncia sobre a exploração de crianças e adolescentes por criadores de conteúdo adultos. Um dos casos de maior destaque, amplamente detalhado por Felca, envolvia o influenciador paraibano Hytalo Santos. Felca revelou que, desde 2020, Hytalo Santos utilizava seu canal para exibir menores que ele denominava de “filhos” ou “turma do Hytalo” em vídeos de danças sensuais e outras situações consideradas constrangedoras. Para elaborar a denúncia, Felca seguiu os perfis citados a partir de sua conta pública para conduzir uma investigação detalhada.
A repercussão do vídeo de Felca foi extraordinária:
* **7 de agosto (quinta-feira):** A gravação de Felca alcança a impressionante marca de aproximadamente 20 milhões de visualizações em apenas dois dias, viralizando rapidamente pela internet.
* **8 de agosto (sexta-feira):** As consequências para Hytalo Santos começam a surgir. Sua conta no Instagram é desativada. O Ministério Público informa que, embora não tenha sido o responsável direto pela suspensão, solicitou que a medida fosse mantida e expandida para outras plataformas digitais. No mesmo dia, Felca protocolou um pedido de quebra de sigilo de 233 perfis na rede social X (anteriormente Twitter), alegando difamação, visto que fora acusado de consumir e apoiar conteúdo sexual infantil. O youtuber reiterou que suas ações se davam exclusivamente para fins de investigação e produção do vídeo. Também ocorreu a desativação da conta de Kamyla Santos, conhecida como Kamylinha, uma menor de idade ligada a Hytalo, por ordem do Ministério da Fazenda, devido à promoção de apostas ilegais.
* **9 de agosto (sábado):** O termo “adultização” alcança seu patamar mais elevado de buscas no Google, evidenciando o quão proeminente o tema se tornou no debate público.
* **10 de agosto (domingo):** Hugo Motta, presidente da Câmara dos Deputados, compromete-se a dar prioridade à pauta de projetos de lei relacionados à proteção de crianças na internet. A questão da adultização transcende o universo digital e passa a ser um tópico central na discussão política nacional.
A ação judicial e as investigações contra Hytalo Santos se intensificaram após a denúncia:
* **11 de agosto (segunda-feira):** O Ministério Público da Paraíba (MPPB), o Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Polícia Civil emitem uma recomendação para que a Loteria do Estado da Paraíba (Lotep) suspenda a atuação da empresa de rifas que mantinha vínculos com Hytalo. O motivo era o uso impróprio de imagens de menores de idade, as quais possuíam conotação sexual. Adicionalmente, o MPPB ajuíza uma ação civil pública, pleiteando a suspensão definitiva dos perfis de Hytalo em redes sociais, a desmonetização de todos os seus conteúdos e a interdição de qualquer contato dele com os adolescentes mencionados nos casos. Nesse ínterim, o advogado de Felca divulga que, após receber centenas de ameaças, o youtuber precisou adotar medidas de segurança, como o uso de carro blindado e de seguranças. Uma reportagem do G1 detalha que, desde 2020, Hytalo produzia e veiculava vídeos de menores de idade encenando “namoro” e danças de teor sexual, com uma contagem superior a 1,5 bilhão de visualizações em suas diferentes plataformas.
* **12 de agosto (terça-feira):** A Justiça concede liminarmente os pedidos feitos pelo Ministério Público contra Hytalo. As medidas incluem o bloqueio de suas redes sociais, a desmonetização dos conteúdos já publicados e a expressa proibição de estabelecer contato com os adolescentes envolvidos. Paralelamente, o MPT apresenta os pormenores de uma investigação meticulosa sobre a exploração de trabalho infantil, embasada na análise de mais de 50 vídeos e no testemunho de 15 pessoas. A repercussão dos eventos reacende na Câmara a urgência em debater e aprovar projetos de lei que assegurem a proteção online de crianças e adolescentes. A diretora do Instituto Alana, organização não governamental focada nos direitos infantis, em entrevista ao G1, defende o Projeto de Lei 2628/2022, que propõe um conjunto de medidas para resguardar os menores no ambiente digital. O presidente da Câmara, Hugo Motta, anuncia que o tema será debatido em plenário e que um grupo de trabalho será constituído para consolidar um texto final em até 30 dias. A Justiça também concede liminar a Felca para a quebra de sigilo dos 233 perfis no X, estipulando um prazo de cinco dias para a entrega dos dados. Em um dia de intensas revelações, uma reportagem do Jornal Nacional informa que as denúncias de exploração sexual infantil no Brasil duplicaram após a publicação do vídeo de Felca. O Disque 100 registra mais de mil ocorrências desde o dia 6, e a SaferNet aponta um aumento alarmante de 114% nas denúncias de pornografia infantil nas redes sociais.
* **13 de agosto (quarta-feira):** Um mandado de busca e apreensão é cumprido na suntuosa residência de Hytalo, em João Pessoa. O imóvel é encontrado vazio, embora uma máquina de lavar roupas estivesse em funcionamento. No mesmo dia em que os advogados que o representavam anunciam a renúncia ao caso, o vídeo de Felca no YouTube atinge a marca de quase 34 milhões de visualizações, mantendo a atenção do público e das autoridades.
* **14 de agosto (quinta-feira):** A Justiça da Paraíba autoriza novas operações de busca em endereços vinculados a Hytalo Santos. São apreendidos um computador e diversos celulares, aprofundando as investigações. Israel Nata Vicente, conhecido como Euro e marido de Hytalo, também passa a figurar como alvo das apurações, tendo sido incluído nas ações de busca.
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**As Prisões e a Conclusão Legal Inicial**
Em 15 de agosto de 2025, Hytalo Santos e seu marido, Israel Nata Vicente (Euro), foram presos em uma residência localizada em Carapicuíba, na Grande São Paulo. A Justiça da Paraíba fundamentou as prisões ao apontar veementes indícios de crimes graves, incluindo tráfico de pessoas, exploração sexual e a prática de trabalho infantil artístico de forma irregular. Esse desfecho marcou um ponto crucial na resposta jurídica e social ao fenômeno da adultização infantil, reiterando a seriedade com que as autoridades e a sociedade civil encaram a proteção das crianças e adolescentes no ambiente digital e fora dele, com a nova legislação da Paraíba consolidando o compromisso de prevenção e combate a tais violações.
Com informações de G1 Paraíba

Imagem: g1.globo.com
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