Nesta terça-feira, 2 de setembro de 2025, enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF) dava início a um histórico julgamento envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros indivíduos, um evento paralelo no Senado Federal ganhou significativa projeção nas plataformas digitais ligadas a apoiadores do antigo mandatário. A sessão da Comissão de Segurança Pública, que contou com a participação do perito Eduardo Tagliaferro, tornou-se um ponto de contenda e discussão, gerando uma onda de comentários e movimentações nas redes sociais bolsonaristas.
Tagliaferro, que anteriormente atuou como chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), compareceu à sessão via videoconferência. Sua presença foi articulada por uma convocação do senador Flávio Bolsonaro, que preside a comissão e é filho do ex-presidente, marcando o cenário para declarações que reverberariam politicamente. O testemunho de Tagliaferro reiterou acusações significativas, reacendendo debates sobre a atuação de autoridades no período eleitoral de 2022.
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Durante sua exposição, o ex-assessor reiterou a alegação de que a assessoria do TSE, período em que colaborou diretamente com o ministro Alexandre de Moraes, exercia um “poder de polícia”. Conforme relatado por Tagliaferro, o magistrado teria dado ordens diretas à Polícia Federal para recolher imagens de câmeras que pudessem ter registrado crimes, e, pessoalmente, o instruiu a coordenar pesquisas em bancos de dados do TSE para identificar e rastrear informações sobre pessoas detidas. Estas declarações ofereceram um pano de fundo para a estratégia digital adotada por aliados políticos do ex-presidente, buscando desviar a atenção do que acontecia no STF.
Estratégia Bolsonarista nas Redes Sociais
Em uma ação coordenada e amplamente visível nas redes sociais, grupos bolsonaristas instrumentalizaram a sessão com Eduardo Tagliaferro no Senado como um elemento estratégico. O objetivo primordial era construir uma narrativa alternativa e de confronto direto com o julgamento de Jair Bolsonaro e outros sete réus, todos acusados de envolvimento em uma alegada tentativa de golpe de Estado, que teria ocorrido após a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022. A estratégia ganhou tração rapidamente, com o nome de Tagliaferro alcançando os temas mais comentados na plataforma X.
Declarações de Parlamentares Aliados
A repercussão das alegações de Tagliaferro foi amplificada por importantes figuras políticas aliadas ao ex-presidente. O senador Flávio Bolsonaro, figura central na convocação de Tagliaferro, manifestou publicamente a gravidade das acusações. Em sua postagem, ele afirmou que as denúncias feitas pelo perito eram “gravíssimas”, destacando revelações que, segundo ele, apontariam para a forma como o ministro teria agido para “beneficiar um lado e para prejudicar e perseguir Bolsonaro de maneira ilegal”.
Outro parlamentar que se pronunciou foi o senador Esperidião Amin (Progressistas-SC). Ele expressou a percepção de que estaria ocorrendo “abusos autoritários” por parte do ministro Moraes. Amin também declarou possuir as 27 assinaturas necessárias para a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dedicada a investigar a produção de provas pelo STF em eventos como o 8 de janeiro. A proposta adicionou outra camada de polarização ao cenário político, buscando aprofundar a contestação sobre a lisura dos processos judiciais.
A ex-ministra Damares Alves (Republicanos-DF) foi ainda mais incisiva, sugerindo a interrupção do julgamento em curso no STF. Ela argumentou que o processo estaria comprometido por supostas violações de direitos humanos. Damares usou as acusações de Tagliaferro como base para suas alegações de parcialidade. Em suas palavras, o cenário indicaria uma “grande violação de direitos humanos”, onde “Pessoas foram acusadas e presas, buscas e apreensões foram feitas com provas forjadas por um magistrado”. A ex-ministra chegou a clamar por ações diretas contra o magistrado envolvido e a interrupção do julgamento pelo ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF.
Reação do Bloco Governista
Em contraste direto com a intensa mobilização bolsonarista, os parlamentares da base governista optaram por uma postura de desconsideração à sessão que ouviu Eduardo Tagliaferro na Comissão de Segurança Pública do Senado. Nenhum dos senadores da base do governo, fossem membros titulares ou suplentes da comissão, registrou presença oficial na audiência. Os únicos senadores filiados ao Partido dos Trabalhadores (PT) que marcaram presença na sessão, Augusta Brito e Paulo Paim, não integram formalmente o colegiado, indicando uma distância deliberada do debate proposto.
Quem é Eduardo Tagliaferro?
Eduardo Tagliaferro emergiu como uma figura central no cenário político-judicial, sendo considerado um “ícone” pelo senador Flávio Bolsonaro. Ele é percebido por este grupo como alguém capaz de apresentar evidências de alegadas arbitrariedades cometidas pelo ministro Alexandre de Moraes. Tagliaferro é conhecido, principalmente, por ser apontado como o responsável pelo vazamento de informações sigilosas do gabinete da presidência do TSE para a imprensa durante o período em que Moraes presidiu a corte, entre 2022 e 2024. Este episódio ficou notório como o caso “Vaza Toga”.
O Caso “Vaza Toga” e as Alegações Centrais
Em agosto de 2024, uma reportagem publicada pelo jornal Folha de S.Paulo trouxe à tona as primeiras conversas supostamente extraídas do telefone celular de Tagliaferro, evidenciando comunicações com servidores do STF e do próprio TSE. A reportagem revelou que o ministro Alexandre de Moraes teria solicitado, de forma informal, ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a produção de relatórios informativos sobre indivíduos que estavam sob investigação nos inquéritos referentes a *fake news* e milícias digitais.
As mensagens que formam o cerne do caso “Vaza Toga” teriam sido trocadas entre agosto de 2022 e maio de 2023. Este período é particularmente sensível, pois engloba o tempo de campanha eleitoral que culminou na vitória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e na derrota do então presidente Jair Bolsonaro (PL), e se estende por alguns meses após o pleito. A existência desses diálogos levantou questionamentos sobre os métodos de coleta de informações e a observância dos trâmites legais durante processos investigativos de alta repercussão política.
A Resposta de Alexandre de Moraes
Em resposta às acusações e às revelações da imprensa, o gabinete do ministro Alexandre de Moraes divulgou uma nota defendendo a legalidade das ações. O comunicado esclareceu que a solicitação de informações a outros órgãos, incluindo o TSE, é uma prática usual e que a Corte Eleitoral detém o que se chama de “poder de polícia”. A nota do gabinete especificava que “Todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com integral participação da Procuradoria-Geral da República”.
Adicionalmente, o próprio ministro Moraes teceu comentários públicos sobre o caso. Ele explicou que, na qualidade de presidente do TSE — função que exerceu entre agosto de 2022 e maio de 2024 —, detinha autoridade para requerer relatórios e que, neste contexto, não seria necessário oficializar pedidos para si mesmo. Moraes argumentou que seria uma ação “esquizofrênica” o presidente do TSE se “auto-oficiar”. O ministro reforçou sua prerrogativa: “Como presidente, tenho poder de polícia e posso, pela lei, determinar a feitura dos relatórios”, afirmou, enfatizando que todas as requisições estavam devidamente registradas e que os indivíduos alvos dos relatórios já se encontravam sob investigação prévia.
Implicações Legais e o Pedido de Extradição
Após o início das investigações relacionadas ao vazamento das conversas que deram origem ao “Vaza Toga”, Eduardo Tagliaferro foi exonerado de suas funções no TSE em maio de 2023. Pouco tempo depois, o ex-assessor deixou o Brasil e fixou residência na Itália, onde permanece atualmente. Além das controvérsias envolvendo os vazamentos, Tagliaferro enfrentou outros problemas legais antes mesmo da denúncia mais recente. Ele foi detido e acusado por violência doméstica contra a esposa.
Na semana anterior à sessão do Senado, a Procuradoria-Geral da República (PGR) formalizou uma denúncia contra Tagliaferro, acusando-o dos crimes de violação de sigilo funcional e obstrução da justiça. Paralelamente, o Ministério das Relações Exteriores solicitou formalmente ao governo italiano a extradição de Tagliaferro para o Brasil, para que ele possa responder às acusações perante a justiça brasileira.
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As acusações da PGR não se limitam apenas à violação de sigilo e obstrução. Tagliaferro também foi denunciado por tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, coação no curso do processo e obstrução de investigação que envolvia organização criminosa. A soma das penas previstas para estes crimes pode alcançar até 22 anos de reclusão. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, reiterou na denúncia que o ex-assessor atuou de forma deliberada contra a legitimidade do processo eleitoral brasileiro e teve como objetivo prejudicar as investigações referentes a atos antidemocráticos. Conforme a denúncia de Gonet, Tagliaferro, agindo de “maneira livre, consciente e voluntária”, teria procurado atender a “interesses ilícitos de organização criminosa responsável por disseminar notícias fictícias contra a higidez do sistema eletrônico de votação e a atuação do STF e TSE, bem como pela tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito”. A série de acusações e o pedido de extradição colocam Tagliaferro em uma posição jurídica delicada e no centro de um intenso debate político-judicial no país.
Com informações de G1

Imagem: Facebook via g1.globo.com
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