Uma sessão plenária da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) foi abruptamente interrompida na terça-feira (2 de setembro de 2025) após um intenso embate verbal envolvendo o deputado estadual Lucas Bove (PL) e diversas parlamentares mulheres. O episódio ganhou notoriedade e reacendeu debates sobre o decoro e a condução dos trabalhos legislativos, especialmente à luz de um recente pedido de cassação contra o parlamentar por suposta violência doméstica, que fora arquivado dias antes, em 26 de agosto.
A discussão ocorreu durante uma sessão que tinha como pauta principal a avaliação e o referendo para a indicação de Wagner Rosário ao cargo de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE). A situação escalou rapidamente de um diálogo para um confronto ríspido, capturado por registros em vídeo da própria sessão, colocando o comportamento do deputado Bove em evidência.
👉 Leia também: Guia completo de Noticia
O Intenso Conflito em Plenário
De acordo com os relatos e vídeos, o deputado Lucas Bove foi observado em pé, engajado em uma conversa acalorada com a deputada Professora Bebel (PT), que estava sentada. O contexto da troca de palavras era inicialmente entre os dois parlamentares, enquanto a líder da minoria, deputada Thainara Faria (PT), procedia à nomeação da deputada Mônica Seixas (PSOL) para que esta pudesse falar em nome da bancada de seu partido.
Ao se virar para dialogar com Bove e Professora Bebel, Mônica Seixas tornou-se o foco das gesticulações do deputado. Ela prontamente dirigiu-se ao microfone para narrar a situação aos colegas presentes. “Eu interpelei o deputado Lucas porque ele estava insistentemente falando com a Professora Bebel com o dedo em riste. Eu pedi para ele se afastar, e ele começou a gritar comigo”, relatou a parlamentar do PSOL, descrevendo o comportamento agressivo que, segundo ela, antecedeu a interrupção de sua fala.
Lucas Bove interrompeu Mônica Seixas durante seu depoimento, alegando ter um diálogo privado e respeitoso com a deputada Professora Bebel. Ele afirmou: “Eu estou tendo uma conversa com a Professora Bebel, que é adulta, que é dona do seu mandato, que tem voto, que tem voz”. O clima na casa legislativa, já tenso, tornou-se ainda mais carregado. A sequência dos acontecimentos revelou o aumento do tom de Bove, que visivelmente alterado, dirigiu-se à deputada Mônica Seixas com as palavras: “Não vem encher o meu saco. Vai trabalhar!” Este último comentário marcou um ponto crítico, culminando na suspensão da sessão pelos encarregados dos trabalhos.
A Continuação do Desentendimento Durante a Pausa
Mesmo após a interrupção formal dos trabalhos, a tensão permaneceu e as discussões não cessaram. Registros feitos por assessores da bancada minoritária na Alesp evidenciaram que o confronto verbal continuou pelos corredores e adjacências do plenário. Em um desses momentos, Lucas Bove foi ouvido gritando: “Vocês pegam causa séria e transformam em proselitismo político”. A veemência do deputado do PL em suas afirmações e o ambiente de confrontação foram notáveis, mantendo a atmosfera carregada dentro da casa legislativa mesmo durante a pausa.
Denúncias de Intimidação e Violência Política de Gênero
A deputada Mônica Seixas descreveu os eventos vivenciados como uma “cena de intimidação no plenário”, reiterando sua perspectiva ao ser procurada para comentar o ocorrido. Ela detalhou o comportamento do deputado Bove antes de sua intervenção: “Eu só ouvi a Bebel repetir muitas vezes que ‘não queria’. E aí, no que eu virei, vi o Lucas debruçado sobre a mesa dela com o dedo em riste, perto do nariz dela, falando para ela fazer, para ela falar, para ela convocar, e ela falando: ‘Não, eu não quero'”. A deputada do PSOL relatou ter agido de forma cautelosa. “Muito calmamente, olhei para a colega e falei: ‘Deputada, a senhora está bem?’ Ele bateu na mesa e começou a gritar comigo”, detalhou Seixas.
A interpretação de Mônica Seixas sobre o incidente é categórica. Segundo ela, “Tentar impor a uma mulher o medo no exercício da sua atividade é violência política de gênero”. Essa classificação eleva a gravidade do incidente, deslocando-o de uma simples discussão parlamentar para uma questão mais profunda que toca na esfera dos direitos e do respeito à atuação das mulheres na política. Como consequência direta, a deputada anunciou sua intenção de formalizar uma representação contra Lucas Bove no Comitê de Ética da Alesp. Adicionalmente, ela planeja acionar o Ministério Público Eleitoral, buscando uma responsabilização mais ampla para o ocorrido.
O Histórico da Deputada e Precedentes de Condenação
Não é a primeira vez que a deputada Mônica Seixas se envolve em questões relacionadas à violência política de gênero. Sua atuação anterior demonstra um firme posicionamento contra esse tipo de comportamento no ambiente político. Em 2024, Mônica já havia obtido uma condenação contra um colega parlamentar. O então ex-deputado Wellington Moura (Republicanos) foi sentenciado a pagar uma indenização de R$ 44 mil por danos morais e, notavelmente, a participar de um curso de letramento de gênero. A condenação foi resultado de comentários proferidos dois anos antes, nos quais Moura havia afirmado que colocaria um “cabresto na boca” da deputada, caracterizando uma evidente expressão de violência e misoginia política. Este histórico confere peso às novas acusações feitas por Mônica Seixas.
Em um gesto de solidariedade e protesto, as deputadas Thainara Faria (PT) e Paula da Bancada Feminista (PSOL) manifestaram apoio a Mônica Seixas após o embate no plenário. As parlamentares, visando resguardar a integridade dos trabalhos legislativos e denunciar o ambiente tenso gerado, solicitaram o adiamento da votação que envolvia a indicação do novo conselheiro do TCE. Este pedido evidenciou a seriedade com que as parlamentares enxergaram a continuidade da sessão diante dos acontecimentos.
Por sua vez, ao se pronunciar para a TV Globo, o deputado Lucas Bove optou por reiterar as justificativas que já havia expressado em plenário. Ele novamente alegou que a deputada estaria utilizando “causas sérias” para fins de “proselitismo político”. Além disso, o parlamentar contra-atacou, acusando Mônica Seixas de disseminar “fake news” em relação ao ocorrido. Essa resposta por parte de Bove apenas reforçou a polarização da discussão e a complexidade do cenário político.

Imagem: g1.globo.com
O Arquivamento do Pedido de Cassação: Entenda o Contexto Precedente
O episódio de atrito na sessão da Alesp não pode ser completamente compreendido sem a contextualização de um evento recente: o arquivamento, ocorrido em 26 de agosto, da denúncia contra o próprio Lucas Bove. O Conselho de Ética da Assembleia Legislativa de São Paulo havia tomado a decisão de não dar prosseguimento a uma representação que pedia a cassação do mandato do deputado. A acusação central contra Bove era de quebra de decoro parlamentar, ligada a denúncias de que ele teria agredido sua ex-esposa, a influenciadora digital Cintia Chagas.
As Alegações da Ex-Esposa e a Denúncia Original
Cintia Chagas é uma figura conhecida nas redes sociais, contando com uma base de mais de seis milhões de seguidores. No ano anterior, a influenciadora havia formalizado uma queixa contra o deputado. Seus relatos detalhavam uma série de abusos, que incluíam violência física e psicológica, ocorridos durante o período de mais de dois anos em que ela e Lucas Bove mantiveram um relacionamento. É importante notar que Lucas Bove nega veementemente todas as acusações de agressão, defendendo sua inocência. A denúncia de violência doméstica, que originou o pedido de cassação, chegou à Alesp por iniciativa da própria deputada Mônica Seixas, que protocolou o requerimento exigindo a abertura de um processo para a cassação do mandato de Bove.
A Votação no Conselho de Ética e as Reações
A análise do pedido de cassação pelo Conselho de Ética mobilizou os deputados estaduais membros do colegiado. Após discussões e ponderações sobre a representação apresentada, a decisão final foi pelo arquivamento da denúncia. A votação resultou em seis votos contrários ao prosseguimento da representação contra Lucas Bove e apenas um voto favorável. A única parlamentar a se manifestar a favor da cassação do mandato de Bove foi a deputada Ediane Maria, também filiada ao PSOL, alinhando-se à postura de Mônica Seixas.
Os parlamentares que votaram contra o prosseguimento da denúncia na Alesp foram: Oseias de Madureira (PSD), Carlos Cezar (PL), Dirceu Dalben (Cidadania), Eduardo Nóbrega (Podemos), Rafael Saraiva (União Brasil) e Delegado Olim (PP). Essa configuração de votos gerou significativa controvérsia e forte reação por parte de alguns segmentos, especialmente de grupos defensores dos direitos das mulheres.
Após a decisão do conselho, Cintia Chagas expressou seu descontentamento e profunda frustração com o resultado. Em sua declaração, ela criticou a decisão, afirmando: “Trata-se de um desserviço de membros da Alesp. Preocupados apenas com o corporativismo, com a autodefesa, homens públicos mostram indiferença às mulheres.” As palavras da influenciadora revelam uma crítica severa à forma como a denúncia foi tratada no âmbito legislativo. Ela também reiterou um de seus medos passados e um dos motivos pelos quais temia pela sua segurança: a convicção do próprio Lucas Bove de que ele seria intocável. “Não é à toa que eu temia pela minha vida ao lado dele, o qual sempre afirmou que, por ser ‘branco, com cara de rico e deputado, era imbatível’. Ele sempre disse que nada aconteceria com ele na Alesp”, acrescentou Cintia Chagas, ressaltando a sensação de impunidade que ela alegava que o deputado nutria.
Em nota oficial, a defesa do deputado Lucas Bove manteve uma postura concisa e direta diante das acusações e dos desdobramentos. A assessoria jurídica do parlamentar se limitou a afirmar a “mais absoluta inocência do Sr. Lucas Bove”, e garantiu que a prova dessa inocência “brevemente será devidamente comprovada nos autos” dos processos judiciais e administrativos cabíveis. Este posicionamento reiterou a posição de negação às denúncias por parte do deputado e sua equipe jurídica.
A sequência dos acontecimentos, do arquivamento do pedido de cassação ao acalorado debate em plenário e as novas acusações de violência política de gênero, delineia um cenário complexo e tenso no ambiente da Assembleia Legislativa de São Paulo. Os olhos da opinião pública permanecem voltados para as próximas etapas deste caso, que continua a gerar amplas discussões sobre ética, comportamento parlamentar e a representatividade feminina na política brasileira.
📌 Confira também: artigo especial sobre redatorprofissiona
As futuras representações contra Lucas Bove no Comitê de Ética da Alesp e junto ao Ministério Público Eleitoral deverão adicionar novos capítulos a esta história, que coloca em questão não apenas o decoro individual, mas também a integridade das instituições democráticas diante de denúncias de assédio e violência no âmbito político.
Com informações de G1
🔗 Links Úteis
Recursos externos recomendados