No centro do Rio de Janeiro, o Instituto Médico-Legal (IML) tornou-se palco de angústia e esperança para dezenas de famílias que buscam o reconhecimento de corpos de entes queridos. Nesta quarta-feira (29), um dia após a trágica Operação Contenção, ocorrida na terça-feira (28), os familiares se aglomeram para dar início ao demorado processo de identificação.
O procedimento crucial para as famílias se desenrola no Departamento Estadual de Trânsito (Detran-RJ), adjacente ao IML, onde um rigoroso cadastramento está em curso. Esta etapa é fundamental para organizar e formalizar o acesso das famílias às informações e, consequentemente, aos corpos, em meio ao cenário de dor e incerteza que envolve a situação.
Famílias Buscam Reconhecimento de Corpos no IML Rio
A situação é agravada pelo volume expressivo de mortes relacionadas à operação policial. O balanço oficial estadual, divulgado anteriormente, indicava 64 óbitos. Contudo, na madrugada que seguiu a operação, ao menos 70 novos corpos foram resgatados em áreas de mata localizadas no Complexo da Penha, uma das principais regiões de confronto entre as forças policiais e a facção criminosa Comando Vermelho. Este acréscimo significativo de vítimas amplia a urgência e a complexidade do trabalho de reconhecimento no IML do Rio.
Os relatos sobre as condições em que os corpos foram encontrados são perturbadores. De acordo com informações iniciais, muitas das vítimas apresentavam sinais claros de execução, com menções a ferimentos de tiros na testa e até decapitações. Estes achados intensificaram o clamor por justiça e a dor dos familiares. Após serem localizados na Praça São Lucas, no Complexo da Penha, desde as primeiras horas da manhã, os corpos foram sucessivamente encaminhados ao Instituto Médico-Legal para as devidas perícias.
A espera pela liberação dos corpos prolonga o sofrimento das famílias. Nesta quarta-feira (29), ainda não havia previsão para a conclusão do processo e a consequente entrega das vítimas aos seus parentes. Enquanto aguardam pacientemente no local, muitos compartilham suas dores e indignação.
Em depoimento à Agência Brasil, um familiar de uma das pessoas mortas, que optou por não ter seu nome divulgado, expressou sua revolta com a forma como os corpos foram abandonados. “Eles largaram o corpo lá, pelado. Nem animal se trata assim, não importa o que a pessoa fez”, declarou o parente, em tom de desabafo. A pessoa prosseguiu criticando a desorganização: “Fizeram a bagunça que fizeram e largaram lá de qualquer jeito”. Esta declaração sublinha a falta de dignidade no tratamento dado aos corpos e a sensação de descaso percebida pelos que perderam seus entes queridos. Para saber mais sobre os impactos das operações policiais, consulte dados sobre a letalidade policial no estado. A Defensoria Pública do Rio, por exemplo, criticou em 2023 o aumento da letalidade policial no estado, conforme noticiado pela Agência Brasil.
A profunda tristeza foi ecoada por outro familiar, vindo de Cabo Frio, na Região dos Lagos, para realizar o reconhecimento. “É muito difícil encontrar a pessoa que a gente ama desse jeito”, lamentou, revelando a jornada física e emocional que muitos precisam enfrentar para confirmar o destino de seus entes.

Imagem: Tomaz Silva via agenciabrasil.ebc.com.br
Outro comovente testemunho veio de Carol Malícia, uma jovem de 24 anos, residente de Arraial do Cabo, também na Região dos Lagos do Rio. Carol veio ao IML na busca por seu companheiro, identificado apenas como Vitor, pai de sua filha de apenas 1 ano e 3 meses. Ela narrou os últimos momentos de contato com Vitor, que ocorreram até a terça-feira, dia da operação.
Em seu último contato, Vitor teria enviado uma mensagem dramática, relatando estar encurralado e expressando incerteza sobre sua sobrevivência. Ele também mencionou a presença de muitas pessoas atingidas por balas ao seu lado, embora sem especificar o local exato onde se encontrava. Após essa comunicação angustiante, Carol perdeu o contato com Vitor. Subsequentemente, seu corpo foi encontrado com ferimentos de bala na perna e no pé, confirmando o temor da jovem mãe.
Este trágico episódio, desencadeado pela Operação Contenção, expõe a dolorosa realidade enfrentada por muitas famílias em comunidades do Rio de Janeiro. A busca por respostas e o reconhecimento de corpos no IML representam mais do que um procedimento burocrático; é a tentativa de fechar um ciclo de perda e incerteza, e a afirmação de dignidade para aqueles que foram tragicamente vitimados.
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Crédito da imagem: Tomaz Silva/Agência Brasil


