Um estudo científico aprofundado trouxe novas revelações sobre o colapso do gigantesco exército de Napoleão Bonaparte. Os achados indicam que **bactérias e Salmonella dizimaram exército de Napoleão** durante a catastrófica retirada da Rússia em 1812. Esta pesquisa detalhada aponta que doenças infecciosas, particularmente causadas por bactérias como a Salmonella enterica, foram um fator preponderante na perda de centenas de milhares de soldados, adicionando uma camada crucial ao entendimento histórico do desastre militar francês.
A investigação inovadora, publicada recentemente, examinou fragmentos de DNA patogênico em dentes de treze soldados do exército napoleônico, cujos restos foram encontrados em sepultamentos na Lituânia. Esses soldados pereceram durante a trágica retirada de dezembro de 1812. A equipe de pesquisadores do renomado Instituto Pasteur, em Paris, foi capaz de isolar não apenas o material genético da Salmonella, uma bactéria temida por sua associação a alimentos contaminados, mas também o do micróbio Borrelia recurrentis.
Bactérias e Salmonella Dizimaram Exército de Napoleão
A presença da Borrelia recurrentis é de particular interesse, visto que essa espécie bacteriana é reconhecida como a agente causadora da febre recorrente epidêmica, uma doença transmitida por piolhos. Notavelmente, os pesquisadores constataram que se tratava de um tipo específico de piolho, comumente abrigado nas vestimentas e no corpo das vítimas, ao invés do piolho capilar mais familiar. A detecção de restos desses insetos junto aos corpos dos militares corrobora a hipótese de sua disseminação massiva entre as tropas, refletindo as condições insalubres e a precariedade da higiene na época.
Os pormenores desta análise foram oficialmente divulgados na sexta-feira, 24, na revista especializada Current Biology, uma plataforma de alta autoridade científica. O projeto foi liderado por Rémi Barbieri, que atua na Unidade de Paleogenômica Microbiana do Instituto Pasteur. A pesquisa também contou com a colaboração valiosa de colegas do Reino Unido e da Estônia, configurando um esforço internacional significativo para desvendar mistérios históricos por meio de ciência de ponta.
A Valeta Comum de Vilnius e as Vítimas Napoleônicas
O foco principal da pesquisa recaiu sobre uma vala comum que data do período da invasão napoleônica, descoberta fortuitamente em 2001 na capital lituana, Vilnius. As sucessivas etapas de escavação conduzidas desde então permitiram uma estimativa impressionante: acredita-se que ao menos 3.269 indivíduos foram ali sepultados. Essa cifra colossal é um testemunho silencioso da dimensão da tragédia que se abateu sobre o exército francês.
Registros históricos já apontavam que aproximadamente 70 mil homens do exército imperial napoleônico haviam alcançado a região de Vilnius no início de dezembro de 1812, em um desespero evidente para fugir do território russo. As escavações na vala comum ofereceram um retrato visual contundente: soldados e, em muitas ocasiões, seus cavalos foram enterrados lado a lado, com os militares ainda ostentando seus uniformes, mas curiosamente, sem qualquer arma. A análise forense dos esqueletos revelou que quase 99% deles pertenciam ao sexo masculino, com uma faixa etária predominante de 20 a 50 anos, compreendendo cerca de 85% dos identificados.
Doenças Como Armas Invisíveis no Inverno Russo
Um aspecto crucial para a compreensão da extensão da mortandade foi a ausência de qualquer indício de morte violenta nos corpos escavados, seja por armas cortantes, perfurantes ou por projéteis de fogo. Esta constatação arqueológica harmoniza-se perfeitamente com os relatos históricos da época. Estes sugerem que a vasta maioria dos soldados napoleônicos não tombou em combate direto, mas sucumbiu às condições desoladoras do rigoroso inverno russo.
A fome, o frio extremo, a exaustão implacável e, inequivocamente, a profusão de diversas doenças – muitas delas intrinsecamente ligadas às condições sanitárias precárias dos acampamentos – foram os verdadeiros inimigos da “Grande Armée”. Esta força, comandada por Napoleão, iniciara a invasão da Rússia em junho de 1812, durante o verão do hemisfério Norte. Apesar de já acumular baixas significativas no avanço, as tropas conseguiram progredir até cerca de 110 quilômetros da capital Moscou, onde se confrontaram com as forças do Império Russo na Batalha de Borodino em setembro. Contudo, o combate resultou em um impasse estratégico, permitindo que forças russas substanciais escapassem.
Sem perspectivas de rendição ou de suprimentos, e com a cidade de Moscou abandonada e incendiada pelos russos, Napoleão foi compelido a ordenar a fatídica retirada. A partir de então, seus homens viriam a sofrer severamente com as intempéries climáticas e os ataques incessantes das guerrilhas inimigas, perecendo em uma escala ainda mais dramática do que durante a jornada de ida. O caminho de volta revelou-se um verdadeiro calvário, com doenças agindo como um agente silencioso e letal.

Imagem: www1.folha.uol.com.br
O Impacto da Salmonella Paratyphi C e Febre Recorrente
A equipe do Instituto Pasteur empregou técnicas de paleogenômica, examinando amostras dos dentes dos soldados para coletar fragmentos de DNA bacteriano. O estudo conseguiu confirmar que os fragmentos genéticos encontrados apresentavam tamanho e danos moleculares que eram compatíveis com material de origem antiga. Esta verificação foi crucial para assegurar que não se tratava de uma contaminação por micróbios contemporâneos, uma vez que as moléculas de DNA antigas sofrem alterações já bem conhecidas em pesquisas desse tipo, o que autentica sua proveniência.
Antes deste estudo, diversas hipóteses circulavam sobre quais doenças teriam devastado as tropas napoleônicas. Relatos de médicos que acompanharam a expedição colocavam o tifo, outra infecção bacteriana, no topo da lista das possíveis causas. No entanto, a nova análise trouxe conclusões mais específicas e adicionais: além da febre recorrente epidêmica, já mencionada, os pesquisadores demonstraram que a “Grande Armée” foi igualmente acometida pela febre paratifoide. Esta moléstia é especificamente causada por um subtipo da bactéria Salmonella, identificado como Paratyphi C.
A febre paratifoide é uma condição séria, tipicamente transmitida através da ingestão de comida ou água que tenha sido contaminada por fezes de indivíduos infectados. Os sintomas, embora possam não ser unicamente específicos desta doença, são debilitantes: incluem febre alta, dores de cabeça intensas, aparecimento de manchas na pele, fraqueza generalizada, perda de apetite significativa, diarreia e vômitos persistentes. Um registro médico do período oferece uma possível e perturbadora explicação para a alta incidência da doença em Vilnius.
Conforme o relato de um dos cirurgiões do exército, os soldados famintos, ao adentrar muitas casas na cidade, descobriram e rapidamente devoraram grandes barris de beterraba salgada em conserva. Além disso, muitos beberam o próprio líquido da conserva. Esse cenário, conjugado com a desorganização e a falta de higiene típicas de uma retirada militar desesperada, representa um vetor de transmissão ideal para a Salmonella Paratyphi C, perpetuando o ciclo da doença entre as tropas já enfraquecidas.
Os autores da pesquisa, com a cautela científica necessária, salientam que, embora o estudo forneça evidências robustas para a Salmonella e a Borrelia como causas principais, é provável que uma combinação de outras enfermidades também tenha contribuído significativamente para a escala impressionante da mortandade entre as forças de Napoleão. A história de como as bactérias e Salmonella dizimaram exército de Napoleão permanece como um lembrete vívido da fragilidade humana frente a ameaças biológicas em contextos de conflito e condições extremas.
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Esta análise aprofundada destaca o papel crucial das doenças infecciosas na remodelação de eventos históricos e a importância de novas metodologias científicas, como a paleogenômica, para reescrever e enriquecer nosso conhecimento do passado. Para continuar explorando fatos históricos e análises aprofundadas sobre eventos que moldaram o mundo, continue acompanhando nossas análises e outras notícias na editoria de Ciência e História do Hora de Começar.
Créditos da imagem: Barbieri et al., Current Biology e Michel Signoli, Aix-Marseille Université.



