As estratégias do PCC lava dinheiro vêm se tornando cada vez mais sofisticadas, atingindo desde pequenos comércios a grandes operações no mercado financeiro. A facção criminosa, que movimenta anualmente bilhões de reais com atividades ilícitas como o tráfico internacional de drogas e a exploração de setores como tabaco, ouro, combustíveis e bebidas, utiliza uma rede complexa de empresas aparentemente legais para branquear seus recursos, dificultando o rastreamento das autoridades.
Recentemente, investigações revelaram que padarias, motéis, fintechs e até mesmo lojas de brinquedos infantis servem como fachada para a lavagem desses montantes bilionários. Segundo um estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, cujos dados foram publicados pelo g1, apenas no ano de 2022, o crime organizado gerou cerca de R$ 146,8 bilhões por meio de produtos provenientes do comércio considerado legal.
PCC Lava Dinheiro: Operações Miram Diversos Setores Econômicos
Em uma operação conjunta deflagrada na quarta-feira, 22 de maio, envolvendo o Ministério Público, a Polícia Civil e a Secretaria da Fazenda estadual, foi exposto o uso de estabelecimentos de brinquedos infantis por membros do Primeiro Comando da Capital (PCC) para mascarar a origem de dinheiro ilícito. As lojas investigadas estão situadas em importantes centros de compras na capital paulista, como o Center Norte e o Mooca, além do Shopping Internacional, em Guarulhos, e uma unidade em Santo André, no ABC paulista. Os alvos da ação possuem conexão com Claudio Marcos de Almeida, conhecido pelo apelido “Django” dentro do PCC, e que é apontado como um dos principais articuladores do tráfico de grandes volumes de drogas e fornecedor de armamento pesado para o grupo criminoso. Promotores apuram ainda que a ex-mulher de “Django” e a irmã dela realizaram investimentos de grande vulto na fundação de quatro estabelecimentos de uma rede de franquias de brinquedos, sem que possuíssem, de fato, ocupações lícitas que justificassem tal movimentação financeira.
Ações da Operação Carbono Oculto e a Infiltração em Combustíveis
A “Operação Carbono Oculto”, considerada uma das maiores investidas contra o crime organizado no Brasil, já havia revelado, em agosto anterior, um elaborado esquema de bilhões comandado pelo PCC no segmento de combustíveis. Este abrangia toda a cadeia de produção e distribuição, desde o cultivo da matéria-prima até a presença no coração do mercado financeiro de São Paulo. De acordo com os elementos coletados nas investigações, a facção criou uma estrutura paralela de caráter empresarial e financeiro, com o controle de no mínimo 40 fundos de investimento que detinham um patrimônio estimado em mais de R$ 30 bilhões. Essa rede financiava usinas de produção de álcool, terminais portuários e uma extensa frota de 1.600 caminhões para o transporte de combustíveis.
Esquemas com Postos de Combustíveis
Os postos de combustíveis e as lojas de conveniência a eles vinculadas foram identificados como veículos primordiais para a lavagem de dinheiro do PCC. Estes locais recebiam valores em espécie ou via máquinas de cartão, encaminhando os lucros criminosos para a organização por meio de contas bancárias. Nos últimos quatro anos, a movimentação financeira através desses estabelecimentos superou a cifra de R$ 52 bilhões. Além de servirem como canais de lavagem, muitos desses postos comercializavam combustíveis adulterados e forneciam volume inferior ao indicado nas bombas.
Adicionalmente, as investigações apontaram que cerca de 140 postos, mesmo sem apresentar movimentação aparente durante o período analisado, foram receptores de mais de R2 bilhões em notas fiscais de combustíveis. A suspeita é de que essas compras fictícias tinham o propósito de encobrir a circulação de valores ilícitos depositados nas distribuidoras com ligações ao Primeiro Comando da Capital.
Fintechs na Faria Lima: A Nova Fronteira da Lavagem de Dinheiro
A “Operação Carbono Oculto” também desnudou a capacidade do crime organizado de se infiltrar em ambientes sofisticados como a Avenida Faria Lima, renomado centro financeiro da capital paulista. O estratagema bilionário fazia uso de ao menos 40 fundos de investimento e múltiplas fintechs — empresas que fornecem serviços financeiros digitais — com o objetivo de lavar recursos, ocultar transações e blindar um patrimônio do grupo que excedia R$ 30 bilhões. A intenção primária era dificultar sobremaneira o rastreamento dos valores ligados ao PCC.
As fintechs envolvidas, valendo-se de lacunas regulatórias, possibilitaram que o capital de origem criminosa gerado pelos postos de combustíveis fosse integrado ao sistema financeiro. A Receita Federal detectou que uma dessas instituições atuou como um “banco paralelo” para a facção, com movimentações superiores a R$ 46 bilhões entre os anos de 2020 e 2024. Os mesmos agentes controlavam ainda outras fintechs de menor porte, formando uma segunda camada estratégica para a ocultação dos ativos ilícitos. Dentre as companhias prioritariamente investigadas, destacam-se: o Grupo Aster/Copape, que controla usinas, formuladoras, distribuidoras e uma extensa rede de postos de combustíveis operados pelo grupo; o BK Bank, uma fintech brasileira que oferece soluções digitais e foi utilizada para gerir recursos por intermédio de “contas-bolsão”, que possuem difícil rastreamento; e a Reag, a primeira gestora de patrimônio listada na B3, atuante em segmentos como crédito, mercado imobiliário e disputas legais, cujos fundos foram empregados na aquisição de empresas e usinas e na blindagem patrimonial de indivíduos envolvidos no esquema. Para saber mais sobre como instituições financeiras e órgãos reguladores atuam para coibir práticas de lavagem de dinheiro, é possível consultar o site do Banco Central do Brasil, que oferece informações e normas sobre o tema.

Imagem: g1.globo.com
Rede de Padarias a Serviço do Crime
A organização criminosa também utilizava uma rede composta por pelo menos nove padarias e empreendimentos correlatos na cidade de São Paulo para a prática de lavagem de dinheiro e ocultação de bens. O Ministério Público identificou a empresa Dubai Administração de Bens Ltda. como a responsável pela gestão da rede de padarias pertencentes ao grupo criminoso, chegando a constar em um ranking das maiores cadeias do segmento em São Paulo. As investigações citam as seguintes padarias: NOVA SALAMANCA PAES E DOCES LTDA, NOVA IRACEMA PAES E DOCES LTDA, BELA SUIL PADARIA E CONFEITARIA LTDA, NOVA COPACABANA PADARIA E CONFEITARIA LTDA, BELLA PORTUGAL PADARIA E CONFEITARIA LTDA, SALAMANCA PAES E DOCES LTDA, IRACEMA DA ANGELICA PAES E DOCES LTDA, CONFEITARIA E ROTISSERIA IRACEMA LTDA e IRACEMA SERVIÇOS ADMINISTRATIVOS LTDA.
Motéis como Laranjas na Operação Spare
No bojo da “Operação Spare”, deflagrada na quinta-feira, 25 de maio, a Receita Federal e o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) desmantelaram um intrincado sistema que empregava uma rede com aproximadamente 60 motéis registrados em nome de “laranjas” para a lavagem de dinheiro do PCC. Tais estabelecimentos, durante o período de 2020 a 2024, registraram movimentações financeiras superiores a R$ 450 milhões. A ação foi especificamente direcionada aos esquemas ilícitos da facção nos setores de combustíveis e jogos de azar.
Conforme apurações da Receita Federal, os motéis foram cruciais para o incremento patrimonial dos sócios-parceiros do crime organizado, possibilitando a distribuição de R$ 45 milhões em lucros e dividendos. Em um dos casos, um motel distribuiu impressionantes 64% de sua receita bruta declarada. Restaurantes que funcionavam dentro desses motéis, com CNPJs distintos, também foram identificados como parte do esquema. Um deles, por exemplo, distribuiu R$ 1,7 milhão em lucros após reportar uma receita de R$ 6,8 milhões entre os anos de 2022 e 2023. Dentre os estabelecimentos identificados nas investigações estão: Maramores Empreendimentos Hoteleiros, Motel Uma Noite em Paris, Motel Chamour, Motel Casual, Sunny Empreendimentos Hoteleiros, Mille Motel, Marine Empreendimentos Hoteleiros, Ceesar Park Empreendimentos Hoteleiros e Motel Vison.
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As recentes operações demonstram a complexidade e a extensão da rede de lavagem de dinheiro do PCC, que se utiliza de uma vasta gama de negócios lícitos para branquear seus ganhos ilícitos. Entender esses mecanismos é crucial para as autoridades no combate ao crime organizado e na proteção da economia. Para se aprofundar em mais notícias sobre segurança pública e economia, continue acompanhando as análises em nosso portal: leia mais artigos aqui e mantenha-se informado.
Crédito da imagem: Amanda Perobelli/Reuters



