As majestosas imagens de raios e tempestades capturadas pelo fotógrafo Marcel Sachetti, em Presidente Prudente (SP), revelam uma beleza pouco explorada da força da natureza. Após a passagem de uma frente fria que trouxe ventos fortes e intensas descargas elétricas para o oeste paulista no fim de semana, o trabalho de Sachetti destaca uma perspectiva artística única sobre os fenômenos meteorológicos que, para muitos, são apenas motivo de preocupação.
A jornada de Marcel neste universo começou em 2014, motivada por uma paixão inabalável pela natureza e suas manifestações mais poderosas. Em entrevista ao g1, ele relata que sua fascinação pelas descargas elétricas e tempestades se aprofundou ao longo de 11 anos, período em que o fotógrafo se dedicou a transformar a intensidade dos elementos em obras visuais impressionantes. A região de Presidente Prudente, em particular, proporciona um cenário propício para esse tipo de registro.
Fotógrafo Registra Raios e Tempestades no Interior de SP
A “fúria” incontrolável das tempestades foi se manifestando naturalmente em seu caminho artístico, segundo Sachetti, a partir de outras fotografias de natureza que já realizava. A prática constante em campo levou a um encantamento progressivo pelos processos dinâmicos e imprevisíveis da atmosfera. O profissional destaca que aprecio a “desordem inerente à potência desses fenômenos” e a sensação da pequenez humana perante tal força. Simultaneamente, Marcel encontra uma ressonância pessoal, descrevendo a manifestação da tempestade como se fosse uma expressão sua, interiorizada, um sentimento que ele atribui à sua “hipersensibilidade nesta forma de arte”.
Imprevisibilidade, Técnica e Sensibilidade na Captura
Embora a beleza dos raios risque o céu de forma veloz e efêmera, a fotografia dessas descargas elétricas demanda uma combinação singular de paciência e perseverança. O fotógrafo detalha que o processo se inicia com a observação meticulosa. Apesar da existência de inúmeras ferramentas de auxílio na “caça aos raios”, como aplicativos com uma vasta gama de gráficos, dados e previsões, Marcel enfatiza que o elemento humano é o verdadeiro guia neste empreendimento, especialmente seu “olhar acostumado à observação real do céu”. As tecnologias complementam seu trabalho, mas o instinto permanece essencial.
Uma vez identificada a potencialidade de uma tempestade, Sachetti se dirige a locais estrategicamente elevados, que permitam uma melhor visualização da trajetória do fenômeno e da frequência dos raios. Durante todo o processo, a cautela necessária para uma prática intrinsecamente perigosa é sempre prioritária. Ao encontrar o ponto ideal, ele descreve entrar em uma espécie de estado meditativo enquanto prepara o equipamento, escolhe o enquadramento e aguarda o momento decisivo.
Diferente da percepção comum, Marcel não tem como prever o instante exato em que um raio irá cair. Por isso, a câmera opera em um modo configurado para capturar fotografias sequenciais durante intervalos específicos, quase como se estivesse filmando. Isso permite que, caso múltiplos raios ocorram em um curto espaço de tempo, todos sejam registrados na mesma imagem. Embora a previsibilidade não garanta o clique no exato segundo, a persistência e a técnica apurada frequentemente resultam em registros surpreendentes.
Para suas captações, Marcel utiliza o mesmo equipamento profissional que emprega em outros tipos de trabalho. No entanto, as configurações da câmera são ajustadas para fotografias de “baixa velocidade”, além de adaptações específicas que levam em conta as características do ambiente, como a luminosidade e a altitude. Cada cenário exige uma configuração única, e a capacidade de realizar esses ajustes rapidamente é fundamental para resultados satisfatórios nesse gênero de fotografia.
Além da proficiência técnica, a sensibilidade artística é, para Marcel, o que verdadeiramente enriquece seus registros. Ele afirma que “a fotografia de raios não funciona sem técnica e o conhecimento mínimo da tríade fotográfica (abertura, velocidade do obturador e ISO, a sensibilidade do sensor)”. Contudo, ele defende que nenhuma máquina pode substituir o olhar humano, e que a sensibilidade artística é o “tempero de todos os fotógrafos”, transcendendo o simples “apertar o botão”.
Segurança Essencial na Fotografia de Raios
Junto à técnica e à sensibilidade, um fator inquestionável na fotografia de raios é a segurança, dado que as descargas elétricas são poderosas e podem causar danos fatais. Sachetti prioriza este aspecto e enfatiza que a maior proteção reside na distância. Ele reitera que nem sempre é necessário estar próximo do “olho do furacão” para obter imagens perfeitas, e a vasta maioria de seus trabalhos foi realizada a distâncias consideradas absolutamente seguras.
Apesar de todas as precauções, o fotógrafo já experienciou situações de risco, onde a proximidade foi maior do que o desejável ou os aplicativos de previsão falharam na precisão das distâncias seguras, gerando momentos de grande susto. “É essencial tomar os cuidados devidos para este tipo de fotografia, que infelizmente causa perdas de vida no mundo todo. Com a força da natureza, não se brinca”, conclui Marcel, reiterando a seriedade e o perigo envolvidos na sua paixão.
Transformação Pessoal e a Dualidade da Natureza
Marcel relata uma profunda transformação pessoal através de sua interação com a fotografia de natureza, seja explorando detalhes em macro de estruturas minúsculas, seja evidenciando a complexidade e a beleza de insetos e plantas, ou a própria grandiosidade dos fenômenos naturais. “A fotografia me permitiu, primeiramente, compreender a estrutura da vida de forma holística, percebendo que somos parte de uma mesma matéria em um mesmo planeta, formados pelos mesmos componentes”, explica. Essa percepção o levou a uma postura mais humilde perante a existência, o que ele descreve como a essência do “clicar: humanidade”.
O fotógrafo pondera que, talvez, as tempestades reflitam seus próprios “estados de espírito”, representando o equilíbrio intrínseco entre a calmaria e a fúria em seu interior. Para ele, tudo isso se funde em uma força bruta e incontrolável, que se revela igualmente bela quando observada “mais de perto”, ou ainda, para além delas, onde residiria algo que transcende nossa compreensão: o Divino. Marcel finaliza com a mensagem de que “nada é uma coisa só”, enfatizando a dualidade presente na natureza, nas pessoas e nas circunstâncias. A beleza, ele afirma, pode ser extraída de qualquer lugar, pois não se trata do objeto em si, mas do olhar do observador que escolhe o que clicar. Sua escolha é a de “olhar com menos julgamento, mais empatia e mais sensibilidade”. A palavra que ele selecionaria para sua mensagem seria o amor, “porque é disso tudo que se trata”.
Entendendo os Raios: Perspectiva Científica
Para elucidar a ciência por trás dos raios, o doutor em físico-climatologista, Vagner Camarini, detalha que essas descargas elétricas se originam de áreas de instabilidade atmosférica. Essas áreas propiciam movimentos de convecção do ar atmosférico. Quanto mais intensos são esses movimentos, maior é o atrito entre as partículas de ar, o que, por sua vez, resulta na eletrização dessas massas de ar. Esse processo cria uma significativa diferença de potencial elétrico entre diferentes partes de uma mesma nuvem, entre nuvens distintas ou entre as nuvens e o solo.
Ao contrário da previsão climática geral, Camarini ressalta que não é possível determinar com precisão a localização exata e a intensidade dos raios. Os especialistas conseguem apenas inferir que a atmosfera está eletrizada, indicando a possibilidade da ocorrência de raios devido à presença de áreas de instabilidade.
Questionado sobre o famoso ditado popular, o doutor Camarini afirma que, sim, “o raio pode cair no mesmo lugar duas vezes”, contradizendo a crença popular. A razão para isso reside na variabilidade espacial das descargas elétricas. Contudo, ele enfatiza que é raro que raios atinjam o mesmo ponto em um curto intervalo de tempo. A duração média de uma descarga elétrica é de cerca de 0,2 segundos, e sua intensidade varia de 25 kiloamperes (KA) a 200 KA, com unidades de medida em Volt (V) e Ampere (A).
O especialista também esclarece as distinções entre raio, trovão e relâmpago, frequentemente utilizados de forma intercambiável, mas que, na verdade, representam aspectos diferentes do mesmo fenômeno.
- Raio: É a própria descarga elétrica de alta intensidade que ocorre na atmosfera, conectando dois pontos com campos elétricos distintos.
- Trovão: Trata-se do som produzido durante a descarga elétrica. Ele resulta do aquecimento rápido e intenso do ar em torno do trajeto do raio, que se expande violentamente e gera uma onda sonora.
- Relâmpago: É a manifestação visual do raio, a luz intensa liberada no momento da passagem da descarga elétrica.
A variação das cores observadas no relâmpago é influenciada pela intensidade da descarga elétrica, que altera a temperatura do ar, e também pela composição atmosférica local no instante do fenômeno.
Para aprofundar-se no estudo de fenômenos atmosféricos e dados científicos, uma fonte confiável é o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que realiza pesquisas e monitoramentos cruciais para o entendimento do clima e do espaço em nosso país.
Confira também: crédito imobiliário
A percepção única de Marcel Sachetti ao registrar raios e tempestades oferece não apenas imagens espetaculares, mas também uma profunda reflexão sobre a conexão humana com a natureza. Seu trabalho em Presidente Prudente é um testemunho da beleza encontrada mesmo nos eventos mais intensos e aparentemente destrutivos. Para mais reportagens sobre o cotidiano e as peculiaridades das diferentes localidades brasileiras, incluindo o interior de São Paulo, visite a editoria de Cidades do nosso portal e explore outros artigos que transformam a maneira como vemos o mundo.
Crédito da imagem: Foto: Marcel Sachetti/Cedida


