A súbita retirada do ministro Luiz Fux do plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), ocorrida na última quarta-feira (15), durante um momento de fortes críticas do ministro Gilmar Mendes à Operação Lava Jato, configurou o clímax visível de uma série de tensões acumuladas entre os dois magistrados. O episódio evidenciou o acirramento das relações internas da Corte, cujo clima de apreensão se estendeu até a quinta-feira (16).
A sessão plenária tinha como pauta central o julgamento de um processo referente à destinação de valores oriundos de condenações em ações públicas da Justiça do Trabalho. A legislação vigente prevê que esses recursos não devem ser direcionados para fundos específicos. Foi neste cenário que o ministro Gilmar Mendes aproveitou a ocasião para reacender suas severas recriminações à Operação Lava Jato, lendo mensagens trocadas entre procuradores e classificando suas condutas como “cretinas”.
Fux Abandona Plenário do STF Durante Críticas de Gilmar
Momentos depois de um debate intenso nos bastidores, o ministro Fux levantou-se de sua cadeira e deixou o plenário sem retornar, enquanto Mendes prosseguia com seu discurso. Gilmar Mendes, a certa altura referenciado no artigo como “o decano do Supremo”, traçou um elo entre a temática do processo em julgamento e a controvérsia sobre a criação de um fundo bilionário pela força-tarefa da Lava Jato, alimentado com recursos recuperados da Petrobras e destinado a patrocinar projetos de cidadania e anticorrupção. Mendes categorizou essa ação como o “principal exemplo de desvio flagrantemente ilegal de recursos que deveria servir à recomposição de danos de atos ilícitos”.
Durante sua explanação, o ministro Gilmar Mendes reiterou: “O Brasil produziu, presidente, nesse período de Lava Jato e quejandos e é uma singularidade brasileira, uma jabuticaba um tipo de combatente, ministro Zanin, de corrupção que gosta muito de dinheiro. É uma singularidade”. Ao conectar a temática do uso indevido de verbas que deveriam ser direcionadas a um fundo público com os atos da Lava Jato, Mendes avançou para tópicos diversos ao processo principal. Ele denunciou a suposta tentativa de procuradores de estabelecer um esquema internacional de compartilhamento ilegal de provas, citou a “entrega de provas em saco de supermercado” e desqualificou a gestão do ex-chefe da Procuradoria-Geral da República (PGR), Rodrigo Janot, como de “triste memória”. O voto de Gilmar estendeu-se por um período pouco inferior a 50 minutos antes de ser concluído.
A tensão observada no plenário era precedida por um confronto direto ocorrido cerca de uma hora antes da sessão. Em uma das salas anexas ao plenário do STF, durante o intervalo do julgamento, por volta das 16h, os ministros Gilmar Mendes e Luiz Fux protagonizaram um duro intercâmbio verbal. Gilmar ironizou Fux sobre a suspensão de um julgamento de recurso no qual o ex-ministro Sergio Moro tentava anular uma decisão que o tornara réu por calúnia contra o próprio Gilmar. O placar da Primeira Turma, à época, registrava 4 a 0 contra Moro, e Fux havia solicitado mais tempo para analisar o processo, gerando o descontentamento do colega.
Relatos da discussão apontam que Gilmar Mendes instou Fux: “Vê se consegue fazer um tratamento de terapia para se livrar da Lava Jato”. Adicionalmente, ele aconselhou o ministro a “enterrar” o assunto “do Salvador”, referindo-se a José Nicolao Salvador, ex-funcionário do gabinete de Fux que fora implicado em uma proposta de delação premiada na década anterior e que havia sido demitido pelo magistrado em 2016. A referência trouxe à tona questões sensíveis, evidenciando o aprofundamento do atrito pessoal entre os membros da corte superior.
Ainda segundo os relatos, Fux reagiu prontamente, defendendo que seu pedido de vista no caso de Moro tinha como objetivo um exame mais cuidadoso. O ministro Fux também expressou sua contrariedade com Gilmar, alegando que o colega “falava mal” dele em diversas instâncias. Gilmar Mendes confirmou as acusações, porém afirmou que suas críticas eram proferidas publicamente, e não “pelas costas”, pois considerava Fux uma “figura lamentável”. A acidez do diálogo expôs as fragilidades das relações interjudiciais em um período de grande escrutínio público do Supremo Tribunal Federal.
Gilmar Mendes, na mesma discussão, exemplificou suas críticas ao colega mencionando o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pela suposta trama golpista. Segundo ele, Fux teria “imposto aos colegas [da Primeira Turma] um voto de 12 horas que não fazia o menor sentido”, que resultou na absolvição de Bolsonaro, mas na condenação do tenente-coronel Mauro Cid – irônica e simbolicamente denominado por Gilmar como “o mordomo”. Tal decisão, conforme Mendes, teria provocado a “chateação” de todos os demais colegas da Primeira Turma. Fux, por sua vez, defendeu seu posicionamento, afirmando que seu voto era a medida apropriada diante do que ele considerava um “massacre” sofrido pelos réus da trama golpista. O término da fala do ministro Gilmar Mendes marcou o fim da sessão plenária, que foi encerrada pelo presidente da corte, ministro Edson Fachin, após breves intervenções.
Um ministro da Corte, que preferiu manter o anonimato em depoimento à Folha, interpretou a retirada de Fux do plenário como um explícito ato de repúdio às críticas de Gilmar Mendes. Embora procurados para comentar os acontecimentos daquela semana, tanto Gilmar Mendes quanto Luiz Fux não se manifestaram publicamente. O incidente reforça a percepção de um ambiente tenso na mais alta corte judiciária do país, evidenciando as complexidades das relações pessoais e institucionais que permeiam o judiciário.
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A intensa discussão entre os ministros do Supremo Tribunal Federal, culminando na retirada de Fux do plenário, ressalta a importância de acompanhar de perto as dinâmicas do nosso sistema judicial. Para se manter atualizado sobre estes e outros acontecimentos que moldam o cenário político brasileiro, convidamos você a continuar navegando pela nossa editoria de Política, onde análises aprofundadas e notícias exclusivas são publicadas regularmente.
Crédito da imagem: Gabriela Biló – 10.set.25/Folhapress



