A Crise Ônibus Fortaleza: Desconforto e Demoras Marcam Transporte na capital cearense, uma realidade que se acentuou nesta segunda-feira (29) com a suspensão inesperada de 25 linhas, afetando diretamente aproximadamente 9 mil usuários. Esse evento dramático pôs em evidência as fragilidades do sistema de transporte público, considerado pilar fundamental para a mobilidade em qualquer metrópole, mas que em Fortaleza enfrenta problemas estruturais há anos.
Desde 2015, o cenário para o setor na capital tem se deteriorado visivelmente. Os dados da Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza (Etufor) revelam uma perda alarmante de mais da metade dos passageiros, uma redução de 51%. No mesmo período, a frota de ônibus em circulação diminuiu de cerca de 1.800 para apenas 1.282 veículos. Além da perda de usuários e da redução da frota, o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Ceará (Sindiônibus) aponta um déficit mensal de aproximadamente R$ 9 milhões para a manutenção das operações, levando empresas a encerrarem suas atividades e comprometendo ainda mais o serviço.
A experiência do passageiro reflete a gravidade dessa crise, que impacta o cotidiano de milhares de pessoas na escolha de como se deslocar pela cidade. A falta de comodidades essenciais, a agilidade dos percursos e até mesmo a disponibilidade de informações claras para o planejamento das viagens são fatores críticos que afastam os usuários e que, paradoxalmente, são essenciais para resgatar a confiança e o uso do transporte público.
Crise Ônibus Fortaleza: Desconforto e Demoras Marcam Transporte
Diante desse panorama desafiador, a busca por soluções torna-se imperativa, englobando desde melhorias na frota até mudanças no modelo de financiamento do setor. A Prefeitura de Fortaleza estabeleceu a meta de garantir 100% da frota com ar-condicionado, sendo que atualmente apenas 72% dos veículos possuem esse recurso, demonstrando o longo caminho a ser percorrido na busca por mais conforto.
A recente suspensão das 25 linhas foi defendida pelo Sindiônibus como uma medida inadiável, atribuindo-a à crise financeira aguda. Em contraste, a Prefeitura de Fortaleza contestou a decisão, alegando falta de autorização ou qualquer tipo de aviso prévio. Uma apuração realizada pelo g1 confirmou que o sindicato foi notificado extrajudicialmente para assegurar o retorno imediato das linhas, com negociações futuras sendo condicionadas a essa reversão. Conforme informações da Etufor, todas as linhas afetadas retomaram a circulação integralmente na quarta-feira (1º).
Os Desafios Cruciais para Recuperar Passageiros
Para o professor Mário Azevedo, do Departamento de Engenharia de Transportes da Universidade Federal do Ceará (UFC), características fundamentais como preço acessível, conforto e conveniência são inegociáveis para atrair e reter passageiros. Ele enfatiza que o transporte coletivo é indispensável para quem percorre longas distâncias, seja a trabalho, estudo ou lazer. Segundo Azevedo, um sistema de transporte público eficiente é o motor da cidade, pois movimenta grande número de pessoas com menos veículos, reduzindo recursos e poluição, ao contrário dos carros particulares ou motocicletas que, na prática, transportam poucas pessoas. O serviço deve ser tão atrativo que consiga persuadir até mesmo aqueles que têm alternativas de deslocamento, impedindo que longas esperas e falta de conforto os levem a priorizar veículos próprios ou aplicativos de transporte.
A falta de renovação da frota agrava a situação, impactando a qualidade e a pontualidade do serviço. Mário Azevedo observa que, após a pandemia de Covid-19, a queda no número de passageiros e as dificuldades financeiras limitaram os investimentos, como a modernização dos veículos. Ele explica que a idade avançada da frota, que atualmente tem uma média de 7,9 anos (comparada a 4 anos há uma década), acarreta mais problemas de manutenção e panes, resultando em demoras ainda maiores nos trajetos e na espera. As melhorias na renovação da frota estão ligadas diretamente à sustentabilidade econômica do sistema.
Segurança e Agilidade como Diferenciais Essenciais
Narcisio Santos, integrante do Movimento Organizado de Busólogos do Ceará (MOB Ceará), um grupo de entusiastas de ônibus, acompanha o setor em Fortaleza há 14 anos, mantendo contato com usuários, trabalhadores e empresários. Ele destaca a segurança e a rapidez como pilares cruciais na decisão do usuário pelo transporte público. Segundo Santos, a popularização de aplicativos de transporte na última década levou passageiros a optarem por essas plataformas em busca de maior segurança e comodidade, mesmo que por um custo mais elevado. Ele aponta que o medo da violência urbana, incluindo assaltos dentro ou nas proximidades dos pontos de ônibus, pesa mais que o conforto oferecido por veículos climatizados, um fator que afugenta grande parte dos usuários. O professor Mário Azevedo reitera a segurança como um componente do conforto, ressaltando a necessidade de infraestrutura adequada, como pontos de ônibus bem iluminados.
A demora nos deslocamentos e nos intervalos entre os ônibus também é um fator crítico, conforme Narcisio. Ele explica que a fuga de passageiros resultou na diminuição da quantidade de veículos em operação por linha, numa tentativa das empresas de evitar o prejuízo de ônibus circulando com capacidade ociosa. A consequência direta é o aumento exponencial do tempo de espera, transformando intervalos de oito minutos em esperas de até 40 minutos, o que, por sua vez, afasta ainda mais usuários. Esse processo gera um ciclo vicioso: menos passageiros resultam em menos recursos para as empresas, dificultando investimentos em melhorias e na atração de novos usuários, já que a tarifa é calculada com base no volume de usuários. Os custos operacionais também dispararam desde a pandemia, com o preço de veículos e insumos praticamente dobrando.
A Etufor observa que a mudança nos hábitos de mobilidade urbana ao longo da última década, impulsionada pela expansão das plataformas digitais como Uber e 99, o aumento no uso de motocicletas e bicicletas, e a popularização do home office após a pandemia, também contribuíram para a queda no número de passageiros. Em 2015, a média diária era de 1,07 milhão de usuários; em 2025, esse número caiu para cerca de 520 mil.

Imagem: g1.globo.com
Desafios na Integração do Transporte
Fortaleza avançou significativamente na integração do transporte com a criação dos terminais de integração em 1992, permitindo a troca de ônibus sem tarifa adicional e conectando diversas regiões. Atualmente, o sistema conta com integração temporal, que permite o transbordo sem custo extra em até duas horas, otimizando roteiros. Contudo, Mário Azevedo destaca que a integração com modais como metrô e VLT, de responsabilidade do governo estadual, ainda não foi plenamente concretizada devido à complexidade de custos e tecnologias distintas. Uma parceria entre município, estado e governo federal seria a chave para a gestão e integração eficiente desses recursos.
Ramon Castro, também busólogo e usuário de transporte, prefere o metrô para agilizar seus deslocamentos, relatando que muitos moradores de bairros como Mondubim e Conjunto Esperança fizeram a mesma opção diante da piora dos serviços de ônibus. Ele aponta que, apesar dos atrasos e da superlotação do metrô, o sistema serve como uma “válvula de escape”, pois oferece mais agilidade e segurança contra assaltos em comparação aos ônibus. No entanto, Ramon frisa que a integração no Terminal da Parangaba, próximo às estações de metrô e VLT, é falha e só se tornaria efetiva com maiores investimentos e melhorias constantes na qualidade de ambos os sistemas. A busca por agilidade leva usuários como Ramon a reduzir o tempo de viagem de mais de duas horas para 30 a 40 minutos utilizando o metrô.
Caminhos para a Melhoria e Reversão da Crise
Superar o desequilíbrio econômico é uma prioridade, pois os governos têm a responsabilidade constitucional de garantir o direito ao transporte público, conforme ressalta Mário Azevedo. Ele defende investimentos em políticas que priorizem o transporte coletivo, citando a criação de corredores e faixas exclusivas para ônibus como exemplos de sucesso. O professor também enfatiza o papel dos usuários, que podem colaborar sinalizando queixas e sugestões para orientar o planejamento, atuando como “fiscais” do sistema. É fundamental que se invista em iniciativas contínuas de conscientização e aprimoramento, conforme já estabelecido nas diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, acessíveis em sites oficiais como o do Ministério das Cidades.
Narcisio Santos sugere que as melhorias passam pela ampliação de corredores exclusivos e pela renovação da frota com veículos novos e climatizados. Ele também propõe campanhas de conscientização sobre as opções de integração, como o Bilhete Único, para que mais passageiros aproveitem os benefícios existentes. A Etufor reforça a meta de climatizar 100% da frota (atualmente em 72%) e menciona melhorias recentes como a implantação do Bilhete Único, construção de terminais e do programa Parada Segura. Os desafios atuais incluem reduzir os intervalos, ampliar a frota e expandir os corredores exclusivos, enquanto as prioridades futuras abrangem a renovação da frota, a climatização total dos ônibus e a ampliação da infraestrutura para assegurar uma tarifa acessível.
O busólogo Ramon Castro compartilha a visão de que a renovação da frota e a segurança são cruciais, acrescentando que uma reformulação tarifária poderia levar a um serviço de maior qualidade, mesmo que a um custo mais elevado. Todos os especialistas e órgãos convergem para a necessidade de um sistema mais moderno, seguro e eficiente para que o transporte público em Fortaleza recupere a confiança e a adesão de seus passageiros, garantindo assim a mobilidade e o desenvolvimento da cidade.
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Crédito da imagem: Ismael Soares/SVM
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